Henry Louis Mencken escreveu uma das mais irônicas frases já produzidas pela humanidade: “todo problema envolvendo o ser humano tem uma solução simples, clara e… equivocada”. Veste feito luva a questão do sistema penitenciário brasileiro: soluções que ao longo do tempo pareciam claras e simples revelam-se agora completamente desastradas. Há cerca de quatro anos o signatário escreveu que passaríamos a Rússia em número de pessoas presas se teimássemos na metodologia que divorcia a cadeia da sociedade e separa a política penitenciária da política de segurança pública. Mais: a condenação vem funcionando como vingança e ignora-se a necessidade de tratamento psicológico e muitas vezes psiquiátrico da maioria dos trancafiados. Vergonhosamente ultrapassamos a Rússia e já somos o terceiro país com maior número de encarcerados (atrás da China e dos EUA).

O Brasil tem hoje 726,7 mil prisioneiros, o dobro em relação a uma década atrás. A população carcerária feminina aumentou oito vezes em 17 anos e engloba 40 mil mulheres. Mais grave: 40% do total dos institucionalizados são presos provisórios, detentos que ainda nem foram julgados. Eis o equívoco de não se unir a política de segurança à política penitenciária. Esses 40% se tornam facilmente soldados das facções criminosas, culpados ou inocentes que sejam, porque precisam ceder ao crime organizado para sobreviverem nas cadeias. Vamos imaginar que 20% recebam absolvição. Ao saírem da audiência, iniciarão a carreira na marginalidade porque já estão cooptados pelas facções. É um absurdo um país manter cerca de 290 mil presos provisórios. Isso responde a perplexidade de Benjamin Lessing, quando ele escreve: “me surpreende no Brasil a facilidade com que as facções controlam a criminalidade nas ruas a partir da prisão. Isso ocorre porque existe encarceramento em massa”.

Vamos, agora, ao tratamento psicológico e psiquiátrico. Não estou, em hipótese alguma, criminalizando enfermidades mentais – pelo contrário, o enfermo mental é geralmente vítima da violência e não o seu promotor. Ocorre, porém, que a grande maioria dos presidiários apresentam desordens psíquicas que carecem de tratamento — haja vista a compulsão da dependência química. Equivocadamente, nosso sistema só considera que alguém precisa de tratamento quando o indivíduo não é capaz de entender o seu ato criminoso. É um erro. Muitos presos, que sabem o que fazem, também portam transtornos. O ministro do STF Alexandre de Moraes resume com exatidão: “no Brasil prende-se muito mas prende-se mal”. Vindo a crítica de um dos mais conceituados constitucionalistas do País, parece óbvio que tal sitação tem de ser revertida. Imediatamente. Não quero daqui a quatro anos estar escrevendo que ultrapassamos a China. Mas acho que estarei.


Siga a IstoÉ no Google News e receba alertas sobre as principais notícias