Há cerca de dez dias, o porto de Derna abrigava barcos de pesca e mercantes, mas as inundações que devastaram essa cidade do leste da Líbia fizeram dessa infraestrutura um depósito de escombros e cadáveres.

No porto, não há mais trabalhadores, pescadores, nem curiosos, e poucos barcos atracam. Lá agora estão apenas equipes de busca e resgate locais e internacionais se esforçando para recuperar o que jaz no fundo da bacia portuária.

O rebocador “Irasa” se encontrava nas águas do porto na noite de 10 de setembro, quando a tempestade Daniel provocou o rompimento de duas represas, provocando inundações que arrastaram bairros inteiros para as águas do Mediterrâneo.

Segundo um balanço oficial provisório comunicado pelas autoridades do leste desse país assolado por divisões políticas, estas inundações deixaram mais de 3.300 mortos e milhares de desaparecidos.

O capitão do rebocador, Ali Al Mismari, de 60 anos, pretendia tirar o navio do porto para evitar os destroços e proteger sua tripulação, segundo contou à AFP. Mas não conseguiu encontrar a saída, devido ao aumento do nível do mar.

Ao amanhecer, deu-se conta da catástrofe, ao ver “caminhões, pneus, casas, palmeiras (…) geladeiras e cadáveres”.

O chefe do comitê de crise da autoridade portuária, capitão Mohamed Chalibta, afirma que as buscas continuam por “objetos encalhados no porto” e, provavelmente, pessoas “dentro de seus veículos que afundaram”.

“Cada área do porto é atribuída a uma equipe específica”, acrescenta.

– Sem visibilidade –

Uma equipe dos Emirados Árabes Unidos é responsável por um dos setores. Chegou com seus barcos e jet skis e iniciou as inspeções por imersão e palpação, já que “não há visibilidade” na água lamacenta, observam os mergulhadores.

Quatro mergulhadores dos Emirados com cilindros de ar comprimido descem em duplas de sua embarcação amarela, presos por cordas. Pouco depois, um deles aparece para anunciar ter “amarrado a corda a um carro”. Um segundo mergulhador descobre outro veículo. Um guindaste é mobilizado para retirar um dos carros.

Uma equipe líbia especializada no cuidado de cadáveres, vestida de trajes brancos, aproxima-se para inspecionar seu conteúdo e declara, finalmente, que não há corpos.

O trabalho de recuperação dos objetos que repousam no fundo da bacia portuária se anuncia trabalhoso.

Também continuam os esforços de resgate no mar, ao longo da costa da cidade atingida, onde vários corpos foram arrastados pelas correntes mais a leste.

“É mais fácil lidar com um cadáver no mar do que em terra, porque o nível de salinidade funciona como um isolante na pele”, explica o chefe da equipe líbia, Hafez Obaid, referindo-se aos riscos para a segurança dos mergulhadores.

Al Mismari relata que pescadores em “barcos de pesca privados foram os primeiros” a ajudar os sobreviventes.

Informado da passagem da tempestade, ele viu seu rebocador “tremer de uma maneira incomum e inédita”.

Taufik Akruch, técnico de 61 anos, afirma que “o nível da água subiu mais de um metro e meio acima do cais com a chegada de um grande número de artefatos”.

A inclinação repentina do navio, atingido pelas volumosas águas, obrigou sua tripulação a ligar os motores e a cortar as cordas para se afastar do cais.

Ao amanhecer, a tripulação foi alertada por pedidos de socorro. Era uma senhora nua, abrigada em uma geladeira flutuando na superfície.

“Onde está minha irmã?”, implorava esta mulher que sobreviveu milagrosamente, segundo o relato de dois marinheiros.

Mais tarde, a tripulação resgatou um egípcio que disse ter “parado aqui depois de ir dormir”, ou talvez ter “perdido a consciência”, disse o capitão.

am/hme/mab/pc/tt/mvv