Uma recomendação da Defensoria Pública de São Paulo para que a prefeitura da capital paulista suspenda o uso do Smart Sampa, tecnologia empregada para reconhecimento facial, em blocos de Carnaval desencadeou uma reação que explicita a relevância política do programa.
Em uma semana, as reações adversas ao ofício foram relevantes. A prefeitura classificou como “inadmissível que um órgão público cogite impedir, no Carnaval, o funcionamento de um sistema que há meses tem levado à prisão milhares de bandidos” e pediu explicações à Defensoria.
O procurador-geral de Justiça do estado, Paulo Sérgio de Oliveira e Costa, defendeu o uso da tecnologia, enquanto o chefe do Ministério Público considerou que o programa tem potencial para aumentar a segurança e afugentar criminosos que se misturam na multidão para praticar roubos e furtos no feriado.
Já um grupo de deputados estaduais aliados do prefeito Ricardo Nunes (MDB, principal beneficiário político do mecanismo), capitaneados por Tenente Coimbra (PL-SP), pediram a suspensão das três defensoras públicas responsáveis pelo ofício que recomendou a suspensão.
Na sexta-feira, 28, Luciana Jordão, a defensora pública-geral do estado, se reuniu com o emedebista e, após o encontro, o órgão divulgou uma nota afirmando não ser contrário ao uso da tecnologia, mas garantindo que continuará acompanhando o programa para garantir “transparência, equilíbrio e respeito aos direitos fundamentais”.
+ Documentário questiona a vigilância constante devido ao reconhecimento facial
Desde o início de sua operação, o sistema de reconhecimento do Smart Sampa viabilizou as prisões de 512 foragidos da Justiça na capital. Mas a defesa do programa divide espaço com questionamentos pertinentes ao seu modus operandi.
À IstoÉ, Pedro Henrique Ramos, professor e diretor-executivo do centro de pesquisa Reglab, afirmou que o processo de reconhecimento “envolve a captura de imagens e comparação com um banco de dados previamente estabelecido”.
Embora tenha efetividade na identificação de foragidos e desaparecidos, a tecnologia “lida com dados sensíveis que, além de afetar o direito à privacidade, podem gerar prejuízos significativos às pessoas caso essas bases de dados sejam utilizadas de forma indevida“, afirmou Ramos.
Para o especialista, as taxas de erros e vieses do sistema “ainda são muito altas” e, no contexto da segurança pública, “podem gerar situações graves de abusos, afetando desproporcionalmente grupos minoritários”.
Segundo o procurador Paulo Sérgio, nenhuma ocorrência relacionada ao Smart Sampa foi registrada pelo Ministério Público e o risco de perfilamento racial é “muito pequeno”. “O reconhecimento não se faz por meio da cor da pele e sim através de dados biométricos”, afirmou.
O diretor-executivo do Reglab, por sua vez, considerou posição da Defensoria Pública procedente por levantar questões legítimas sobre os potenciais riscos e impactos do uso de reconhecimento facial em eventos públicos. “É necessário assegurar que a implementação não viole direitos fundamentais e seja utilizada de forma justa e equilibrada”, concluiu.