As empresas brasileiras importaram 104 mil toneladas de lixo entre janeiro e junho de 2024, de acordo com dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços.

A informação pode parecer surpreendente, mas reflete um cenário conhecido pelo setor industrial brasileiro e estudiosos de novos modelos de descarte de resíduos.

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Por que há importação de lixo?

“Resíduos de plástico, papelão e vidro são importados pelas indústrias para abastecer a fabricação desses mesmos materiais. Uma parte da matéria-prima deles é originada do próprio resíduo — o papelão novo tem um percentual de papelão velho, por exemplo. Faz parte do processo industrial”, disse ao site IstoÉ Marcus Vinicius Silveira, diretor executivo do Instituto Atmos (Atmosfera de Estudos e Pesquisas Ambientais).

Entre as importações registradas no semestre, 13,7 mil toneladas foram de papel e papelão para reutilização e outras 8,9 mil, cacos de vidro.

Um facilitador para a comercialização é a baixa tributação: não há alíquota de importação para o vidro incolor e os resíduos de papel, enquanto o lixo plástico tem uma alíquota de 11,2%.

Quais são os impactos?

O Brasil produz cerca de 80 milhões de toneladas de resíduos anualmente, de acordo com o Selurb (Sindicato Nacional das Empresas de Limpzea Urbana), mas os índices de reciclagem desse montante estão em 4% ao ano — 3,2 milhões de toneladas.

O percentual de reutilização contrasta com os números de nações como Alemanha (cerca de 60%), Coreia do Sul (59%) e Áustria (58%), que ainda exportam parte de seu lixo para países menos desenvolvidos, como o Brasil.

Para Silveira, a baixa tributação é um “incentivo” para o baixo investimento na reciclagem e gera efeitos de curto prazo para as empresas, mas produz consequências ambientais e sociais significativas para o país.

“Do ponto de vista ambiental, para onde vão os 96% de resíduos que não reciclamos? São descartados de forma irregular, no mar, em rios e lixões. E, socialmente, há aproximadamente um milhão de brasileiros que têm a coleta de lixo como fonte de renda, e perdem oportunidades para a importação”, afirmou.

Como a situação pode ser solucionada?

O diretor executivo do instituto Atmos disse que o primeiro passo é levar a discussão ao debate público: “Nossa esfera pública não discute nenhum desses impactos, mesmo que seja para chegar à conclusão de que as empresas continuarão a investir na importação”.

A mobilização, neste momento, parte de instituições dedicadas à reciclagem. Em 22 de julho, a Unicatadores (União Nacional das Organizações dos Catadores e Catadoras de Materiais Recicláveis do Brasil) divulgou uma nota oficial defendendo a proibição da importação de cacos de vidro.