Por que Motta e Alcolumbre estão no radar de Trump e como isso pode beneficiar Lula

Ricardo Stuckert / PR
Presidente do Senado, Davi Alcolumbre, e o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta, ao lado do presidente da República, Lula Foto: Ricardo Stuckert / PR

Em nova ofensiva contra o Brasil, o governo dos EUA avalia sancionar os presidentes da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP). A medida, porém, pode ter como principal beneficiado o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

O chefe-executivo americano, Donald Trump, já chegou a revogar os vistos de 11 ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e, insatisfeito com a condução de pautas no Parlamento brasileiro, tem considerado aplicar retaliações também contra os líderes do Legislativo.

No momento em que a gestão de Lula enfrenta dificuldades na relação com o Congresso, a atitude do estadunidense pode unir os Três Poderes em defesa da soberania nacional.

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O histórico do embate entre EUA e Brasil

A ameaça de impor sanções a Hugo Motta e Davi Alcolumbre deriva do confronto entre a Casa Branca e o governo brasileiro. Liderados por Trump, os EUA procuram desenhar parcerias internacionais com líderes ideologicamente alinhados, como Javier Milei, na Argentina, e Jair Bolsonaro, no Brasil. Essa postura fez com que, no dia 9 de julho de 2025, o americano anunciasse tarifas de 50% a produtos nacionais, citando uma “caça às bruxas” no Judiciário do País – onde Bolsonaro é réu por uma suposta tentativa de golpe de Estado.

Por que Motta e Alcolumbre estão no radar de Trump e como isso pode beneficiar Lula

Donald Trump e Jair Bolsonaro – Foto: REUTERS

Os ânimos voltaram a se acirrar no dia 18 de julho, quando a Polícia Federal executou mandados de busca e apreensão na casa de Bolsonaro e aplicou medidas restritivas, incluindo uso de tornozeleira eletrônica, recolhimento domiciliar noturno, proibição de acesso às redes sociais e comunicação com embaixadores, diplomatas estrangeiros e outros réus e investigados pelo STF.

O ministro Alexandre de Moraes entendeu que Bolsonaro e o filho, o deputado licenciado Eduardo Bolsonaro, atentaram contra a soberania do País quando instigaram “o governo estrangeiro a prática de atos hostis ao Brasil e à ostensiva tentativa submissão do funcionamento do Supremo Tribunal Federal aos Estados Unidos da América”. Isso porque, desde março de 2025, Eduardo está licenciado do cargo de deputado para permanecer nos EUA e tentar convencer o governo norte-americano a promover retaliações contra autoridades brasileiras, alegando que o pai sofre perseguição política.

Retaliações chegam ao Legislativo

Não satisfeito com as tarifas econômicas e anulação dos vistos de 11 ministros do STF – incluindo do próprio Alexandre de Moraes – o governo americano mirou as novas represálias no Poder Legislativo. Mesmo possuindo desgastes com a gestão Lula, o parlamento não faz esforços para acomodar as pautas mais caras aos bolsonaristas.

Também filho do ex-presidente, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) chegou a apresentar um pedido de impeachment contra Moraes em resposta às medidas cautelares contra seu pai. O empecilho é Alcolumbre que, como chefe da Casa, não demonstra qualquer intenção de levar a pauta ao Senado, frustrando planos da oposição.

No mesmo sentido, Washington também desaprova a atitude de Motta na Câmara. O presidente tem travado a votação do projeto de lei que busca anistiar os envolvidos na tentativa de golpe ocorrida pós-eleições de 2022 – atitude que beneficiaria a ala de Jair Bolsonaro.

Agora, bolsonaristas procurar articular, junto a Trump, eventuais sanções contra Alcolumbre e Motta. As punições incluiriam suspensão do passaporte americano de ambos os líderes.

Sanções poderiam fortalecer Lula

Enquanto o grupo bolsonarista aparece isolado na defesa aos EUA, a postura da gestão Lula frente à crise agradou boa parte dos brasileiros. O petista se mostrou firme e logo declarou que utilizaria da Lei de Reciprocidade para responder às tarifas, clamando pela soberania nacional. A bandeira passou a ser amplamente usada como retórica de discursos e declarações federais.

Pesquisas recentes da Quaest e Ipespe apontaram crescimento significativo na popularidade de Lula após o embate com Trump. O jornal americano The Washington Post também citou o assunto e indicou que o “bullying de Trump contra o Brasil está saindo pela culatra”. Segundo o artigo, o anúncio de tarifas de 50% a produtos brasileiros acabou favorecendo a aprovação do presidente petista, além de ter agravado a situação de Jair Bolsonaro perante a Justiça, em efeitos contrários aos pretendidos por Trump.

Por que Motta e Alcolumbre estão no radar de Trump e como isso pode beneficiar Lula

Lula exibe boné e fala em soberania nacional – Foto: Ricardo Stuckert

Mesmo aliados bolsonaristas como os governadores Tarcísio de Freitas (Republicanos), Romeu Zema (Novo) e Ronaldo Caiado (União Brasil) demonstraram insatisfação com o tarifaço americano e seguiram abordagens diferentes da adotada por Eduardo Bolsonaro – que chegou a alegar que não se arrependia da campanha a favor das retaliações, mesmo que isso tenha ajudado na popularidade de Lula e melhorado as perspectivas de reeleição para 2026.

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A nova onda de represálias contra os presidentes da Câmera e do Senado poderia ajudar na relação entre Poderes Executivo e Legislativo. Isso porque, apesar de possuir um relacionamento desgastado com o Congresso, a gestão Lula ganharia a oportunidade de unificar forças políticas do País ao redor da pauta da soberania nacional.

Em adição, tanto a agenda da anistia quando a proposta de impeachment contra Moraes seriam enterradas após as sanções. A análise é de que Motta e Alcolumbre não teriam interesse de abraçar as pautas, com risco de serem acusados de subserviência total aos Estados Unidos.

O próprio Flávio Bolsonaro afirmou que as possíveis retaliações poderiam atrapalhar o andamento das pautas da oposição no Congresso.

“Eu acho que pode atrapalhar dependendo de como vai ser a reação do presidente Davi (…) Eu sou sempre do diálogo de construir, de conversar. Mas quando há uma intransigência e nada mais pode ser feito, eu só enfatizo de novo”, declarou ao Metrópoles.