Por que a Ucrânia está mais distante de entrar para a Otan

Valentyn Ogirenko/Reuters
Zelensky exibe mapa com territórios estratégicos ucranianos Foto: Valentyn Ogirenko/Reuters

O presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, reconheceu na sexta-feira, 14, que seu país está mais distante de ingressar na Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), ainda que considere que a entrada seria fundamental para ter condições militares de enfrentar a Rússia em um conflito que perdura desde fevereiro de 2022.

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Em participação na Conferência de Segurança de Munique, Zelensky afirmou que a nação teria de dobrar o tamanho de seu Exército — para 1,5 milhão de agentes — se não for aceito no tratado. Segundo ele, os Estados Unidos “apenas falaram” na possibilidade, que nunca foi tratada de maneira concreta.

O que mudou

Nos meses finais de 2024, em meio a uma ofensiva de suas tropas, Zelensky renovou as esperanças de entrar na Otan depois de pedir ajuda ao então presidente dos EUA, Joe Biden. Em declarações, o líder ucraniano dizia que a “sobrevivência” do país dependia desse aval.

O democrata havia autorizado os ucranianos a atacar o território russo com mísseis americanos de longo alcance, em mais um sinal de forte apoio à Ucrânia — meses antes, a Casa Branca enviou um pacote de US$ 60 bilhões (cerca de R$ 366 bilhões, na cotação atual) para financiar Kiev no confronto.

Desde 20 de janeiro, com Donald Trump no cargo, a configuração mudou. O republicano, que já na campanha eleitoral prometeu encerrar “rapidamente” essa guerra, condicionou a manutenção do apoio financeiro a um acordo que envolveria a troca por terras raras ucranianas e ligou para Vladimir Putin, por quem nutre admiração.

Na quarta-feira, 12, o americano afirmou que a entrada da Ucrânia na Otan é “improvável ou impraticável”. “Muito antes do presidente Putin, eles [Rússua] disseram há muitos anos que não há como permitir que isso [entrada da Ucrânia] aconteça”, disse.

A ideia da Ucrânia entrar na Otan enquanto a guerra ainda esteja se desenrolando é inviável”, afirmou à IstoÉ Kai Enno Lehmann, professor associado do Instituto de Relações Internacionais da USP (Universidade de São Paulo).

A mudança geopolítica esvaziou o poder de barganha de Kiev. “O apoio americano [sob Biden] era militar, estratégico e de inteligência. Zelensky perdeu seu principal fiador para a guerra”, disse à IstoÉ Tomaz Paoliello, coordenador do mestrado em governança global e formulação de políticas internacionais da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica).

O que é a Otan

Descrita pelo Kremlin como um “bloco agressivo”, a Otan foi fundada em 1949 como um obstáculo à expansão da influência soviética na Europa após a Segunda Guerra Mundial. Os 12 membros originais fundadores são Bélgica, Canadá, Dinamarca, Estados Unidos, França, Islândia, Itália, Luxemburgo, Holanda, Noruega e Portugal e Reino Unido.

Após a queda do Muro de Berlim e o fim da União Soviética, a Otan passou a incorporar países do Leste Europeu na aliança militar, como Hungria, Polônia, República Tcheca, Bulgária, Estônia, Letônia, Lituânia, Romênia, Eslováquia, Eslovênia, Albânia, Croácia, Montenegro e Macedônia do Norte.

As entradas mais recentes na organização foram as da Finlândia e da Suécia, que foram convidadas pela aliança militar após a Rússia invadir a Ucrânia.

A Otan atua com o objetivo de proporcionar defesa mútua por meios militares e políticos, dispondo do Artigo 5º da carta da organização, que constitui uma cláusula defensiva. O mecanismo foi acionado apenas uma vez, quando os EUA sofreram os ataques do 11 de setembro, em 2001.

Confira o Artigo 5º da Otan:

“As partes concordam que um ataque armado contra uma ou mais delas na Europa ou na América do Norte será considerado um ataque contra todas elas e, consequentemente, concordam que, se ocorrer tal ataque armado, cada uma delas, no exercício do direito de legítima defesa individual ou coletiva reconhecida pelo Artigo 51 da Carta das Nações Unidas, ajudará a parte ou as partes atacadas, tomando imediatamente, individualmente e em conjunto com as outras partes, as medidas que julgar necessárias, inclusive o uso de força armada, para restaurar e manter a segurança da região do Atlântico Norte.”