O atraso no início do Grande Prêmio da Bélgica de Fórmula 1, marcado pela forte chuva, no último domingo, gerou debate acerca do excesso de cautela por parte da Federação Internacional de Automobilismo (FIA). O tetracampeão mundial Max Verstappen, da Red Bull, criticou a demora e afirmou que os fãs da categoria não veriam mais “corridas clássicas”, mas há um motivo para as pistas molhadas virarem sinônimo de preocupação atualmente.
Em um primeiro momento, é possível deduzir que o perigo está no risco de os carros derraparem por causa da falta de aderência, mas a questão está na baixa visibilidade causada pelo spray excessivo levantado pelos carros.
Em 2022, o regulamento da F-1 reintroduziu na categoria o princípio aerodinâmico efeito solo, utilizado pela primeira vez na década de 1970. Os carros são projetados para que a parte inferior, em conjunto com o solo da pista, crie um fluxo de ar que gera uma grande quantidade de força descendente. Assim, o monoposto “cola” no chão e permite curvas em alta velocidade.
O objetivo da F1 era melhorar as ultrapassagens. Os carros foram desenhados para canalizar o ar da turbulência gerada pelo carro da frente para cima e para fora da esteira, minimizando o impacto e permitindo aos competidores perseguirem o adversário mais de perto.
Em condições de pista molhada, o cenário muda completamente. O carro canaliza a água e a joga verticalmente para fora pela traseira com uma grande força. Isso cria uma espécie de cortina de água, impedindo a visibilidade dos pilotos que vêm atrás.
Embora os pneus de chuva atuais (com 18 polegadas) sejam capazes de deslocar uma quantidade impressionante de água – mais de 85 litros por segundo a 300 km/h com os pneus de chuva total – o aumento da largura (405mm, comparado aos 325mm antes de 2017) e do diâmetro também multiplica o problema do spray, reduzindo a visibilidade muito mais do que em eras anteriores.
O perigo da situação ficou claro no GP da Inglaterra, quando o jovem Isack Hadjar, da Racing Bulls, foi prejudicado pela cortina de água e bateu na traseira de Kimi Antonelli, da Mercedes.
Para além da questão visual, o risco de aquaplanagem também preocupa. Isso porque quando a água acumula mais rapidamente do que a banda de rodagem dos pneus consegue remover, o carro corre o risco de “flutuar” sobre uma camada de água. Cabe ressaltar que os monopostos de F1 não possuem auxílios como ABS ou controle de tração, comuns em veículos de passeio.
Apesar de figuras importantes, como Verstappen, criticar a cautela excessiva da FIA, a entidade não deve mudar a postura e seguirá priorizando a segurança dos pilotos. George Russell, da Mercedes, afirmou que seria “estupidez” dirigir a mais de 320 km/h com baixa visibilidade em Spa-Francourchamps. O circuito na Bélgica é conhecido notório pelo histórico de acidentes fatais.
Charles Leclerc, da Ferrari, saiu em defesa da segurança dos pilotos. “Em uma pista como esta, com o que aconteceu historicamente, você não pode esquecer. Por essa razão, prefiro estar seguro do que começar muito cedo”, comentou o monegasco, após a corrida do último domingo.
QUAL A SOLUÇÃO PARA A CHUVA DEIXAR DE SER PROBLEMA NA F1?
A Fia realizou teste em 2023 e 2024 com protetores nas rodas dos carros para tentar diminuir o volume de spray, mas os resultados foram “muito abaixo do esperado” e mostraram “pouca ou nenhuma diferença”. A FIA concluiu que a maior parte da cortina de água é formada a partir do assoalho e bombeada pelo difusor.
A entidade descartou cobrir o difusor para conter a água. Isso porque afetaria drasticamente o fluxo de ar e, consequentemente, a estabilidade do carro no solo.
A expectativa para 2026, quando a F1 prevê mudanças importantes no design dos carros, é de que a chuva deixe de ser um problema. Os difusores serão menores e o efeito solo deve ser reduzido, diminuindo drasticamente a cortina de água Além disso, a adoção de pneus mais estreitos também visa reduzir o volume de spray.
Mesmo com as mudanças, os carros vão continuar gerando força descendente e medidas cautelares devem ser mantidas em caso de chuva, como a condução pelo safety car ou atraso no início das provas.