PlatôBR: Por que Moraes mandou a PF investigar crime organizado no Rio

Ministro determinou à Polícia Federal que informe dados de inquérito aberto por ordem do STF em abril na "ADPF das Favelas" e ampliou o escopo da apuração para averiguar legalidade e eventuais excessos das policias de Castro na operação mais letal da história, que deixou 121 mortes no complexo do Alemão, na semana passada, sem expulsar efetivamente os criminosos da área

Marcelo Camargo/Agência Brasil
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

O ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), assumiu as rédeas no processo que apura a política de enfrentamento das polícias do Rio de Janeiro às facções criminosas, em especial o Comando Vermelho, que controla a maioria das favelas da capital fluminense e se expandiu pelo Brasil, com presença em 25 estados. Nesta quarta-feira, 5, o ministro determinou a entrada da Polícia Federal nas investigações sobre a operação e seus resultados. É mais uma frente de grande repercussão em que ele deve ter especial protagonismo, como aconteceu com os casos da trama golpista.

Investigações das polícias e do Ministério Público do Rio resultaram na operação no complexo do Alemão, semana passada, que terminou com a morte de 121 pessoas – quatro eram policiais. Nomeado há uma semana relator temporário da chamada “ADPF das Favelas”, Moraes analisa se o governo fluminense descumpriu ordens do STF sobre a necessidade de retomada dos morros dominados pelo crime organização com uso de força policial, desde que seguindo critérios pré-estabelecidos para evitar mortes desnecessárias.

No despacho desta quarta, o ministro pediu informações sobre o andamento do inquérito que o Supremo mandou abrir em abril, no julgamento da ADPF. “A gravidade do problema da segurança pública no Rio de Janeiro demanda” medidas adicionais, estipulou a corte na ocasião. “A primeira é de instauração de inquérito pela Polícia Federal para apurar crimes até mesmo internacionais, com identificação de organizações criminosas que atuam no Rio de Janeiro e suas movimentações financeiras.”

O objetivo inicial era analisar o enfrentamento ao crime no estado em duas frentes específicas: os esquemas de lavagem de dinheiro e a infiltração de organizações criminosas no poder público. Na ordem desta quarta, o novo relator da ação requisita os dados do inquérito e acrescenta pedido para que a PF informe sobre medidas relativas a “demais investigações cabíveis”. O adendo de Moraes abre a possibilidade de a Polícia Federal analisar a ação das polícias na operação do dia 28. O ministro, porém, parece mais empenhado em mirar nas facções.

Xerife em campo

Desde que assumiu o processo, Moraes fez audiências no Rio e no STF com envolvidos no problema, acionou a PGR (Procuradoria Geral da República) e “diligenciou” no estilo “relator dos processos do golpe”. Ex-promotor de Justiça em São Paulo e ex-ministro da Justiça do governo Michel Temer, ele foi pessoalmente ao estado na segunda-feira, 3. Focou especialmente na operação e em seus resultados.

Assim que chegou para a audiência com o governador Cláudio Castro (PL) e com  as cúpulas da Segurança Pública estadual, do Ministério Público e da Defensoria Pública, o ministro perguntou se seria possível, naquele momento, visitar o local da megaoperação. Ele parecia disposto a ir até lá. A resposta foi negativa. Moraes ouviu das autoridades locais que, sem planejamento, análise de riscos e reforço policial, a diligência era impraticável. Um dos presentes afirmou, sob reserva, que a pergunta era também um teste que permitiu ao ministro saber sobre as consequências da megaoperação, que mobilizou 2,5 mil agentes: se, afinal, teria sido possível ou não retomar o domínio territorial da área. Pelo que ouviu, a resposta se aproxima mais do não do que do sim.

Audiências e decisão

A decisão de Alexandre de Moraes de colocar a PF no caso veio após as audiências realizadas por ele com 29 entidades representantes de moradores, de familiares de investigados e presos, grupos de direitos humanos, de defesa dos negros, de combate ao crime organizado e outros. Moraes encerrou nesta quarta as audiências que permitirão avaliar se a “ADPF das Favelas” foi desrespeitada pelas autoridades do Rio. Agora o ministro e sua equipe começam a avaliar as informações colhidas. Não há prazo previsto para encerramento da ação, mas a expectativa é que alguma nova decisão seja tomada ainda nas próximas semanas, antes do recesso judicial de fim de ano. Se virão resultados práticos ou não, ainda é cedo para dizer. Certo é que Moraes caminha para ser, de novo, protagonista do assunto mais rumoroso do momento no país.