PlatôBR: O que está em jogo no provável rompimento do União Brasil com o governo

Partido prepara ruptura com o Planalto, mas apoio à pauta econômica deve ser mantido e ministros resistem a deixar os cargos

Divulgação/União Brasil
Foto: Divulgação/União Brasil

Não se afobe não, que nada é para já. Esse verso de uma música de Chico Buarque se aplica ao rompimento da relação do União Brasil com o governo: pode durar meses e, ao que tudo indica, não deve ser total. O Palácio do Planalto já foi avisado sobre o futuro desenlace e tenta promover o máximo de defecções no movimento articulado pelo presidente da legenda, Antônio Rueda (foto em destaque), em conjunto com o comandante do PP, senador Ciro Nogueira (PI).

O União Brasil e o PP formam a UP (União Progressista), federação oficializada em abril deste ano. A própria aglutinação sinaliza a tomada de um caminho político divergente do governo nas eleições de 2026. Outro posicionamento político combinado entre Rueda e Nogueira foi o apoio aos movimentos de ocupação das mesas diretoras da Câmara e do Senado pelos bolsonaristas. Depois de se reunirem com o presidente do PL, Valdemar da Costa Neto, na manhã de terça, 5, eles passaram aos filiados orientações favoráveis as atos de obstrução nos trabalhos do Congresso. Não fecharam questão, só orientaram.

Fontes do União Brasil, porém, falam que o alinhamento com a oposição não reflete um sentimento uníssono nas duas legendas. O desembarque é provável, mas deputados do partido, reservadamente, dizem não enxergar esse ato em um horizonte próximo. Nem acreditam que ele será total. “Para que sair agora, se a gente pode sair depois?”, indaga um parlamentar da ala mais oposicionista do PP.

Pauta econômica protegida

Apesar do movimento de saída do governo, um deputado do União Brasil ouvido pelo PlatôBR opinou que não acredita que o aceno feito pelo partido aos bolsonaristas a pedido de Valdemar da Costa Neto indique uma ruptura com o compromisso de votarem propostas relacionadas à economia, prioridade do governo. “A pauta econômica está protegida”, disse o parlamentar. Esse raciocínio vale, por exemplo, para o projeto que isenta de Imposto de Renda quem ganha até R$ 5 mil, relatado pelo deputado Arthur Lira (PP-AL) e aprovado em julho por comissão especial da Câmara. Lira fez modificações no texto e defende sua aprovação final pelo Congresso.

Freios no desembarque

Ex-presidente da Câmara, Lira e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, atuam para frear a intenção de Nogueira e Rueda de romper com o governo e reforçar logo a construção de uma candidatura para enfrentar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, provável candidato à reeleição no ano que vem.

Lira, segundo interlocutores, não gostou de ter sido deixado de lado na disputa pelo comando da federação. O acordo que prevaleceu foi costurado por Nogueira e Rueda. Nos dois primeiros anos, os dois dividem a presidência. Nos dois últimos anos, a presidência ficará nas mãos de Rueda. Lira queria que Nogueira tivesse defendido seu nome para o cargo, o que não foi atendido.

O ex-presidente da Câmara evitou falar da ocupação das mesas, conforme orientação da federação. Pelas redes sociais, tratou apenas de defender um tratamento melhor para ex-presidentes da República. “O Brasil precisa tratar melhor seus ex-presidentes. Tenho dito e defendido isso há muito tempo. As medidas aplicadas a Jair Bolsonaro são exageradas e acirram os ânimos em um país já polarizado que, na verdade, precisa de paz e estabilidade para progredir”, disse. “Quando o ambiente é de insegurança jurídica e instabilidade política, a economia sofre. Quem paga essa conta é o povo. Quem perde é o Brasil”, postou.

Alcolumbre é o avalista dos três ministros: Celso Sabino (Turismo), Frederico Siqueira (Comunicações) e Waldez Góes (Integração Nacional). Os dois primeiros são filiados ao União Brasil, Góes integra o PDT. O presidente do Senado também indicou nomes para cargos importantes em estatais e tem pretensões de avançar sobre diretorias do Banco do Brasil. Neste sentido, Alcolumbre lidera a fração governista do União Brasil. De acordo com fontes do governo, em conversa com Lula na semana passada, os três ministros já informaram Lula sobre a intenção de continuarem nas pastas, mesmo com as ameaças da cúpula partidária de serem expulsos.

Relação aberta

O governo tenta agora dimensionar o impacto do rompimento no apoio a matérias de interesse do Planalto no Legislativo. Na avaliação preliminar de uma fonte palaciana, a ruptura não faria tanta diferença para a aprovação de propostas do governo, pois o casamento do União Brasil com o Planalto nunca seguiu o rito tradicional, ou seja, esteve mais para uma “relação aberta”.

O fato de se ter cargos no governo nunca representou votos a mais no Parlamento. “A avaliação é de que quem sempre votou com a gente, vai continuar votando. Quem não vota com a gente, não votará”, disse um interlocutor do Planalto, em conversa reservada com o PlatôBR.

Um levantamento da consultoria Arko Advice, indicou, por exemplo, que o União Brasil votou com o governo em 49,87% das propostas. Foi o quarto partido que menos se alinhou com o Planalto, ficando atrás dos oposicionistas Novo (29,37%), PL (31,98%) e PRD (40,28%). O levantamento considerou 114 votações ocorridas no primeiro semestre na Câmara. O PP teve um patamar de fidelidade maior que o União, votando com o governo em 53,59% das matérias. Menos que o Republicanos (59,64%) e o PSD (56,13%), e mais que o MDB (51,65%). As cinco legendas que mais votaram alinhadas ao Planalto foram PCdoB (89,83%); Rede (83,65%); PT (82,37%); PSB (79,09%); e PDT (75,94%)”.