Os presidentes nacionais do PSD, Gilberto Kassab (foto), e do MDB, Baleia Rossi, à frente da confederação de velhos e novos caciques do partido, se firmam como os dois maiores vitoriosos das eleições deste ano em âmbito nacional. Jogando ora com a esquerda, ora com a direita, eles mostraram uma capacidade de finalização de fazer inveja à maioria dos centroavantes que circulam pelos gramados brasileiros – e não foram poucas as vezes em que os dois chegaram na cara do gol fazendo tabelas.

No caso de São Paulo, por exemplo, o vencedor foi Ricardo Nunes (MDB), mas a articulação decisiva com o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) veio de Kassab. Ele derrotou Guilherme Boulos (PSOL) no segundo turno. O MDB, com uma cara mais à direita, também comemorou a reeleição de Sebastião Melo, em Porto Alegre, diante de Maria do Rosário (PT).

Dentre as tabelas com a ala do partido mais alinhada ao governo federal, a vitória emedebista mais importante foi em Belém, com Igor Normando, primo do governador Helder Barbalho e do ministro das Cidades, Jader Filho. Seu adversário no segundo turno foi o delegado bolsonarista Éder Mauro (PL). Igor Normando contou, ainda, com o apoio do ministro do Turismo, Celso Sabino (União Brasil). O MDB comandará, ao todo, 853 municípios, que somam 36,5 milhões de habitantes. O partido ficou em segundo lugar em número de cidades e total de habitantes.

O PSD de Kassab aparece no topo do ranking, com 887 municípios e população total de 37 milhões. Um aumento de 233 prefeituras em relação a 2020. A principal vitória deste domingo foi suada, em Belo Horizonte, com Fuad Noman. De vice-prefeito pouco conhecido que assumiu o cargo após a renúncia do titular, Alexandre Kalil, ele conseguiu bater o bolsonarista Bruno Engler (PL).

Além de ter sido abandonado por Kalil, Fuad Noman enfrentou muitas dificuldades para chegar ao segundo turno e teve que virar o jogo em relação a Engler, que havia ficado na primeira colocação no primeiro turno. Para conseguir avançar e, depois, vencer a eleição, Fuad contou com os votos úteis da esquerda, que temia um segundo turno entre Engler e Mauro Tramonte, um ex-apresentador de programas policialescos apoiado por Kalil e pelo governador Romeu Zema (Novo).

O atual prefeito, agora reeleito, teve ainda apoios importantes vindos de Brasília – do ministro das Minas e Energia, Alexandre Silveira, e do presidente do Senado Rodrigo Pacheco.

Até então, a principal vitória do PSD havia sido a de Eduardo Paes, no primeiro turno, que conseguiu articular uma chapa da qual, entre os partidos mais conhecidos, só o PL e o PSOL ficaram de fora.

Assim como o MDB, também variando à esquerda e à direita, com alianças ora mais lulistas, ora mais bolsonaristas, mas se firmando como uma força importante de centro, o PSD venceu em Curitiba com Eduardo Pimentel (PSD). Ele foi eleito com os apoios do prefeito Rafael Greca e do governador Ratinho Júnior. Apesar de ter um perfil diferente de Paes e Fuad Noman, seus correligionários, Pimentel também derrotou uma candidata do bolsonarismo, Cristina Graeml (PMB).

O PL de Jair Bolsonaro e Valdemar da Costa Neto perdeu em Manaus, onde o capitão Alberto Almeida foi superado pelo prefeito David Almeida (Avante), que buscava a reeleição, e em Goiânia, onde Fred Rodrigues terminou o segundo turno atrás de Sandro Mabel (União Brasil) – uma derrota pessoal de Bolsonaro para um antigo aliado, o governador Ronaldo Caiado. Em João Pessoa, o ex-ministro da Saúde Marcelo Queiroga foi derrotado por Cícero Lucena (PP), que conseguiu se reeleger. Em Palmas, ainda no rol de derrotas do PL, Janad Valcari perdeu para Eduardo Siqueira Campos (Podemos).

Já entre as vitórias, o partido contabilizou Aracaju, com Emília Corrêa, e Cuiabá, com Abílio Brunini, e com isso comandará quatro capitais em 2024 –João Henrique Caldas havia vencido no primeiro turno em Maceió, assim como Tião Bocalom em Rio Branco.

Na conta final das eleições municipais, MDB e PSD ganharam em cinco capitais, União Brasil e PL em quatro cada um, Podemos e PP em duas e PT, PSB, Avante e Republicanos, em uma capital cada.

Os confrontos diretos entre PT e PL no segundo turno terminaram empatados. O PT foi vitorioso em Fortaleza, onde Evandro Leitão terminou à frente de André Fernandes, e perdeu em Cuiabá, com Brunini batendo Lúdio Cabral. Fortaleza será a única capital administrada pelo PT. Em 2020, o partido havia sido derrotado em todas as capitais.

Para o cientista político Sérgio Ferraz, o bolsonarismo e o lulopetismo saíram das urnas perdedores neste domingo – uma tendência que já era apontada no primeiro turno. “Foi uma vitória da centro-direita, capitaneada pelo centrão, mas também mostrou um alto grau de reeleições e de vitórias de candidatos apoiados pelos governadores”, afirma. Para ele, as questões regionais se mostraram mais fortes e presentes do que a polarização nacional.

Professora da UFMG, a cientista política Helcimara Telles aponta que a direita saiu mais forte do que a esquerda ao mesmo tempo que o lulismo saiu mais forte do que o petismo. “A direita saiu da eleição com mais opções além do bolsonarismo, enquanto a esquerda saiu menor do que a força pessoal do presidente Lula”, diz.

Ela reforça que, em cidades importantes, o PT não teve candidatos próprios, preferindo apoiar nomes ligados a ministros do governo. Em outros, passou a demonstrar pouco empenho ou embarcou mais forte no segundo turno para garantir a vitória de aliados que não podem ser considerados de esquerda. “Em Belo Horizonte, Rogério Correia (PT) foi cristianizado logo no primeiro turno”, comenta. Ela cita Rio de Janeiro e Belém como outros exemplos.

Por outro lado, mesmo nomes derrotados da extrema-direita mostraram uma força importante. “O André Fernandes, em Fortaleza, o Bruno Engler, em Belo Horizonte, e mesmo o Pablo Marçal, em São Paulo, mostraram que existe um crescimento muito grande de candidatos radicalizados e com uso muito hábil das redes”, exemplifica a professora. Ela lembra que pesquisas qualitativas mostraram uma inserção bem forte desses candidatos entre os eleitores jovens.

Para o professor da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp) Milton Lahuerta, esta é possivelmente uma das maiores contradições no resultado das eleições. “Ao mesmo tempo que vimos uma ascensão dos candidatos antissistema, tivemos uma vitória de candidatos arraigados ao sistema político, com reeleições, apoio de governadores e a força do centrão”, afirma.

As próprias abstenções recordes em cidades como São Paulo e Porto Alegre, diz Lahuerta, reforçam um descontentamento com o quadro partidário. “É uma crise que não é apenas brasileira, de desconfiança do quadro político como um todo. Mostra um poder de ascensão de outsiders, mas ao mesmo tempo mostra um quadro bem pulverizado de escolhas políticas, em que os eleitores que votaram preferiram deixar as coisas como estão do que embarcar em novos projetos.”

O alto nível de abstenção foi mencionado em tom de preocupação pela ministra Carmen Lúcia Antunes Rocha, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), no balanço que fez na noite deste domingo; neste ano, o índice foi de 21,68% no primeiro turno e de 29,26% no segundo. Carmen Lúcia anunciou que o TSE fará uma pesquisa com os tribunais regionais eleitorais para identificar os principais entraves ao comparecimento de eleitores em cada localidade. Ela quer apresentar os resultados até dezembro, antes da diplomação dos vencedores.

Os candidatos que se sagraram vencedores nestas eleições tomam posse em janeiro.

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