PlatôBR: Bolsonaristas dão sobrevida a investigação das ‘milícias digitais’ no STF

No mandado de prisão domiciliar, Moraes alertou que a Polícia Federal está de olho na produção de noticias falsas e disparos em massa nas redes no julgamento do ex-presidente. Monitoramento pode prosseguir até as eleições de 2026

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Carlos, Eduardo e Flávio Bolsonaro Foto: Reprodução/Redes Sociais

O ministro do STF Alexandre de Moraes alertou em março publicamente sua preocupação com a ação de “milícias digitais” bolsonaristas, já combatida anteriormente, e as tentativas de tumultuar os processos e julgamentos dos cabeças da tentativa de golpe de Estado, entre eles, Jair Bolsonaro. Não era percepção de juiz nem chute.

A Polícia Federal apontou sinais de que o esquema de produção de falsas noticias e campanhas de ódio espalhadas em massa via redes sociais e canais de internet teria sido reativado – ou sequer deixado de existir-, inclusive por alvos já processados. Essa seria uma das fontes de uma escalada de ataques ao Supremo Tribunal Federal e seus membros nos últimos dias.

Naquele mesmo mês de março, Bolsonaro ganhou status de réu, com o aceite de Moraes para os argumentos da denúncia da PGR. O relator do processo no STF abriu a ação penal 2668, que será julgada em setembro e pode condenar o ex-presidente a 49 anos de prisão – pena máxima pedida pela Procuradoria-Geral da República.

Desde então, o monitoramento da PF identificou aliados próximos do clã e digitais do ex-presidente e dos filhos Flávio, Carlos e Eduardo. Usariam, segundo a investigação, o mesmo modus operandi investigado no inquérito das milícias digitais, que teve alvos indiciados em novembro de 2024.

Nesta semana de balbúrdia em Brasília, Moraes repetiu o que disse no início da ação penal sobre a velha “milícia digital”, destacando sua “continuidade delitiva”. Na decisão que ordenou Bolsonaro ser preso em sua casa, na segunda-feira, 4, essa máquina de comunicação criminosa teria sido usada para colocar o ex-presidente, com declarações e imagens, nos protestos de apoiadores do domingo, 3.

Nas manifestações, apoiadores de Bolsonaro atacaram e incitaram as pessoas a agir contra o STF e seus ministros. Além do mesmo modo de agir, investigadores identificaram nesses atos personagens já processados por ações anteriores. Esses protestos foram até agora a maior ofensiva contra os processos sobre a trama golpista. O objetivo é tentar livrar o ex-presidente de uma eventual condenação, tratada como certa nesses núcleos bolsonaristas.

A PF alertou o ministro sobre as ações clandestinas na internet por trás da escalada de ataques. Divulgação de notícias falsas, impulsionamento de postagens e memes com as medidas de retaliação do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump – munição de grosso calibre que a artilharia bolsonarista anti-Moraes ganhou. Relatório policial feito este ano indicou digitais do clã Bolsonaro, inclusive, na ofensiva.

Retroalimenta

Quem leu o decreto de prisão de Bolsonaro – que a defesa tenta anular – até ficou surpreso com o retorno dessa chamada “milícia digital bolsonarista”, que já não era tão falada assim, ultimamente. Iniciada em 2021, em um pacote de inquéritos correlatos sobre fake news, campanhas de ódio e ataques à democracia, essa investigação foi concluída pela PF em novembro de 2024, com indiciamento dos envolvidos. No mesmo período, Moraes fez o compartilhamento das provas e dos dados da tentativa de golpe de Estado – processo mais robusto em provas – com dois inquéritos remanescentes ainda ativos sobre o tema e mais longevos.

Alvo de críticas em 2023 e 2024 por prorrogar além do padrão o inquérito das “milícias digitais” – caso também apelidado de “inquérito sem-fim” –, Moraes tem mantido sob investigação a “maquina de produção de fake news”, alvo do STF desde 2019, quando Bolsonaro era presidente e os acusados despachavam do Planalto. São apurações motivadas, na maioria dos casos, por novos ataques, fatos e personagens que orbitam a família do ex-presidente.

A mais recente frente aberta de apuração foi motivada pela ação tresloucada de Eduardo Bolsonaro de incitar autoridades nos Estados Unidos a encampar a tentativa de anistia para o ex-presidente. Assim, as apurações da PF sob relatoria de Moraes são mantidas ativas, com prorrogações e novos procedimentos abertos. O inquérito 4955 contra Eduardo Bolsonaro é o mais recente. A investida do filho 03, que desde março está nos Estados Unidos, apesar de efetiva em relação às sanções inéditas aplicadas a Moraes e ministros da corte, teve o efeito almejado frustrado. Na prática, encurralou ainda mais Bolsonaro, em vez de salvá-lo. Às vésperas de ser sentenciado pelo STF, o ex-presidente acabou alvo de medidas ainda mais restritivas.

Culpa de Moraes? Um advogado com longa estrada nos tribunais e bom conhecimento dos processos que cercam Bolsonaro, ouvido pelo PlatôBr sob reserva, avaliou que os ataques coordenados pelos filhos, em especial os vindos de Eduardo, dos Estados Unidos, têm alimentado e dado ainda maior fôlego para investigações do relator. Segundo ele, o clã Bolsonaro deu munição para o avanço dos processos e sobrevida às investigação das “milícias digitais”. No julgamento em setembro do ex-presidente e de outros réus os radares da investigação da PF estarão ativos, para tentar frear as ofensivas e também para punir os responsáveis. Pela vontade do relator, serão ainda mais valiosos se permanecerem em funcionamento até as eleições 2026.