Não foi nada fácil a decisão da bancada do PT de apoiar o requerimento de urgência para se levar ao plenário da Câmara o projeto que proíbe o desconto automático de mensalidades de associações diretamente na folha de pagamento de aposentados e pensionistas do INSS. O partido tem ligações históricas com entidades que estão sob investigação da Polícia Federal e que, em momentos eleitorais, estão na linha de frente dos setores puxadores de votos para a legenda.
Embora a bancada, liderada por Lindbergh Farias (RJ) (foto), tenha decidido não se opor ao requerimento aprovado de forma simbólica na noite de terça-feira, 20, houve divergências de toda sorte na reunião. De acordo com interlocutores do partido, o deputado Carlos Veras (PE), da ala sindicalista da legenda, foi um que se levantou contra o fim do desconto. Ele lembrou que hoje há entidades que se sustentavam desses recursos e que já tinham levado um duro golpe com o fim do imposto sindical aprovado na reforma trabalhista de 2017.
Veras foi apoiado pelo deputado Carlos Zarattini (SP), que disse considerar preocupante a situação das entidades e a proibição de repasses. Para esses deputados, o remédio para resolver o problema é considerado “amargo demais”.
Por outro lado, houve quem considerasse o fator político e o calendário eleitoral. Esse preocupação esteve presente, por exemplo, nas defesas feitas pela deputada Maria do Rosário (RS) e pelo deputado Arlindo Chinaglia (SP), que admitiram inclusive que o desgaste da deflagração tardia da investigação fez com que o assunto recaísse na conta do governo. Por isso, é preciso prestar contas, fazer a devolução da forma mais ágil possível e tentar desarmar as bombas lançadas pela oposição referentes à esse assunto. “O único propósito que tínhamos quando entramos na reunião do PT era de que tiraríamos um consenso. E tiramos, apesar dos posicionamentos bastante diverso”, disse o deputado Patrus Ananias (PT-MG), ao PlatôBR.
Outro dilema de ordem política e eleitoral também colocado por vários deputados foi que, se as entidades acabarem estranguladas por falta de recursos, ficará também enforcada uma importante força de chegada da militância do partido. Um exemplo é a própria Contag, confederação que está sendo investigada e que representa um apoio importante do partido no campo. Para o PT, movimentos organizados como a Contag têm grande importância, mas houve deputados na reunião que relativizaram essa força, com a alegação de que mobilizações em redes sociais podem render mais resultados eleitorais do que o investimento nas entidades.
O governo e os petistas sabem que chegaram tardiamente para o tratamento para o desgaste. Alguns já avaliam que Lula demorou a demitir o ex-ministro da Previdência Social Carlos Luppi (PDT), não mandou uma medida provisória proibindo os repasses. Por essa avaliação, o potencial de desgaste foi subestimado pelo Planalto.
Na hora da votação, nenhum partido encaminhou voto. O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), cuidou para que os posicionamentos de cada legenda não fossem explicitados e encaminhou a aprovação do requerimento de forma simbólica.
O projeto de lei que teve a urgência aprovada foi sacado por Motta depois de esperar algumas semanas pela Medida Provisória, que não foi editada pelo governo. O texto é de autoria do deputado Sidney Leite (PSD-AM) e revoga o trecho da Lei nº 8.213/91, que permite atualmente os descontos associativos automáticos na folha. Com isso, as entidades não poderão mais descontar valores diretamente dos benefícios, mas ainda será permitido que os aposentados se filiem voluntariamente e paguem por outros meios.
A mudança está prevista para entrar em vigor 90 dias após eventual sanção presidencial, caso o Congresso aprove a proposta. “Pegamos o projeto mais antigo e juntamos apensados para que façamos um trabalho mais completo”, disse o presidente da Câmara ao abrir a ordem do dia e aprovar o requerimento menos de cinco minutos após a abertura da apreciação da matéria.