29/11/2024 - 9:45
Uma guerra interna tem movimentado a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Funcionários acusam o diretor-presidente da agência, o almirante da reserva da Marinha Antonio Barra Torres, de realizar uma “manobra” para continuar mandando mesmo depois de deixar o cargo – o mandato dele termina no final deste ano.
Barra Torres, que chegou ao comando da Anvisa em 2020 pelas mãos do então presidente Jair Bolsonaro, de quem era próximo. Na pandemia, período em que ele teve grande proeminência, com grande exposição na mídia, ele foi na contramão do discurso antivacina de Bolsonaro e os dois acabaram se distanciando.
Como nas agências reguladoras os dirigentes têm mandato, o almirante seguiu no cargo mesmo depois da mudança de governo. Agora, às vésperas de deixar a cadeira, ele estaria por trás de um movimento para manter seu poder, ao menos por mais alguns meses.
A “manobra” tem por objetivo, de acordo com a denúncia, evitar a nomeação de um servidor de carreira para uma das diretorias da agência, responsável por decisões que regem um mercado bilionário – cabe à Anvisa, por exemplo, autorizar a produção de medicamentos e fiscalizar serviços relacionados à saúde da população.
Os funcionários afirmam que o plano de Barra Torres passa por preencher uma vaga aberta na diretoria com colocando uma pessoa de sua confiança que, por sinal, já faz parte da diretoria e passaria, então, a acumular duas cadeiras. É um movimento que, se der certo, permitirá que o almirante continue influente nas decisões da Anvisa porque, assim, o grupo dele continuará a ser maioria, ao menos pelos próximos meses, no colegiado da agência, que tem a palavra final sobre todas as decisões.
A Anvisa é comandada pelo diretor-presidente e tem quatro diretores, dois indicados pelo presidente da República e dois representantes dos funcionários de carreira.
De acordo com o Sindicato dos Servidores e Agentes das Agências de Regulação (Sinagências), a lei que regulamenta a gestão das agências determina que, no período de vacância que antecede a nomeação de um novo titular, um servidor de uma lista tríplice de substituição deve ser convocado para ocupar o cargo interinamente até que o presidente da República nomeie um novo diretor. A nomeação interina pode durar 180 dias e deve seguir a ordem de classificação da lista tríplice. É uma dessas cadeiras, a ser preenchida de maneira temporária, que está em jogo agora.
A “manobra”
Barra Torres teria deixado de cumprir um decreto de 29 de novembro de 2023, assinado pelo então presidente em exercício Geraldo Alckmin, que designava o servidor de carreira Fabrício Carneiro de Oliveira para compor a lista de substituição da diretoria colegiada da agência.
Teoricamente, era Oliveira quem deveria ser chamado para integrar a diretoria. Barra Torres, porém, chamou Daniel Meirelles Fernandes Pereira, que já ocupa uma das quatro diretorias. O sindicato dos servidores da agência divulgou uma carta aberta protestando contra a decisão.
Fator Alcolumbre
Nos bastidores, o que se diz é que Pereira está cotado para assumir a presidência da Anvisa no lugar de Barra Torres — a decisão caberá ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Além de contar com o apoio do próprio almirante, Pereira seria uma indicação do senador Davi Alcolumbre (União Brasil), hoje um dos principais aliados do governo no Congresso Nacional. Ou seja, quando tiver que decidir quem será o próximo presidente da Anvisa, o presidente estará diante de um dilema: se escolher o aliado do ex-bolsonarista Barra Torres e apadrinhado de Alcolumbre, na prática estará dando de ombros para as queixas dos funcionários e do sindicato que os representa.
O PlatôBR procurou a direção da Anvisa e pediu uma manifestação sobre o assunto, mas não houve resposta.