PL pressiona, mas xadrez da Câmara pode jogar PL da Anistia para Comissão Especial

Partido do ex-presidente Jair Bolsonaro ameaça obstrução para emplacar urgência, tem os votos necessários, mas rota de colisão com STF e resistência de Motta pode melar andamento do projeto

Foto.: Beto Barata/ PL
Brasília/ DF 19/03/2025 - REUNIÕES INTERNAS - O Presidente Nacional do Partido Liberal, Valdemar Costa Neto, o Vice-Presidente Nacional do Partido Liberal, Deputado Márcio Alvino, o Presidente de Honra do Partido Liberal, Jair Bolsonaro, e o Secretário-Geral do Partido Liberal, Senador Rogério Marinho, durante o Encontro dos Presidentes Regionais do PL realizado na Sede Nacional do PL em Brasília/ DF. Foto: Foto.: Beto Barata/ PL

O acolhimento da denúncia contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no inquérito que investiga o plano de golpe de Estado aumentou a pressão dos bolsonaristas pela urgência no PL da Anistia na Câmara dos Deputados. Aliados do ex-presidente querem emplacar a análise do projeto já na próxima semana, mas o xadrez interno e a relação com o Supremo Tribunal Federal (STF) podem minar as expectativas.

Após o resultado do julgamento no STF, deputados passaram a armar estratégias para pressionar a tramitação do projeto em regime de urgência, uma manobra para votar o texto direto no plenário. A ideia dos parlamentares é votar a urgência na próxima semana e o mérito ainda no primeiro semestre.

Sem sinalizações rápidas, o PL, sob a liderança do deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), resolveu mandar recados à Câmara e ameaçou iniciar obstruções em votações. O primeiro recado foi na votação de quarta-feira, 26, após o julgamento na Suprema Corte, em que os deputados da maior bancada da Casa deixaram de participar, travando a pauta. Há ainda ameaças de romper acordos firmados com Motta, caso o projeto não avance.

De fato, o PL tem os votos necessários para emplacar a urgência. Nas bancas de apostas, são contabilizados de 250 a 300 votos favoráveis ao ex-presidente Jair Bolsonaro. O partido quer usar esse número na mesa de negociação com Hugo Motta.

Longe do solo brasileiro, Motta deve ponderar as cobranças do PL, da base do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e a pressão velada do STF, que também entra no jogo para melar a anistia.

Aliados do presidente da Câmara confidenciaram à IstoÉ ser difícil pautar a urgência do PL da Anistia na próxima semana. Seria uma afronta política após a viagem de Motta com Lula para o Japão e Vietnã em busca de acordos comerciais.

De quebra, Hugo Motta romperia com uma promessa de campanha. Durante a costura dos acordos, Hugo Motta prometeu dar maior protagonismo às comissões temáticas e que pautaria urgências excepcionais.

Caso abra um precedente aos bolsonaristas, Motta será cobrado para abrir para os petistas. A pauta, na véspera de ano eleitoral, pode custar caro ao paraibano.

Outro ponto colocado no cerco é o relacionamento com o Supremo Tribunal Federal. Desde que assumiu a presidência da Câmara, Hugo Motta tem mantido uma boa relação com o judiciário.

A aprovação da urgência do PL da Anistia entraria em rota de colisão com o STF, que tem formado maioria na condenação dos envolvidos do 8 de janeiro. A ação também mandará recados de interferência do Legislativo no Judiciário, retomando os embates entre os Poderes.

O meio termo

Na impossibilidade do avanço na tramitação da urgência, Motta pode potar pela criação de uma comissão especial para debater o projeto a fundo. O colegiado já foi formado ainda no ano passado, mas não foi oficialmente instalado.

As comissões especiais são usadas para debater projetos que precisam passar por mais de cinco comissões na Casa, mas tem se tornado uma manobra, junto aos grupos de trabalhos, para atrasar as tramitações de projetos pressionados.

Com a comissão especial, o projeto não seria analisado neste primeiro momento, já que seriam necessárias ao menos 10 sessões para a análise. Entre feriados e recessos, o projeto só seria colocado em pauta no segundo semestre, quase na mesma época do julgamento no STF.

Deputados do Centrão avaliam que essa seria a melhor escapatória para o projeto já que não faria sentido pautar a urgência para que o texto fosse travado no Senado. O presidente do Congresso Nacional, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), já afirmou que não pautará o tema.

Os parlamentares afirmam que já há votos necessários, com o apoio do Centrão, para apoiar a medida e que não precisam da pressa para analisar o texto. Partidos como PSD, União Brasil e Republicanos, que fazem parte do governo Lula, devem aderir ao PL da Anistia.

O projeto

O projeto está travado na Câmara pelo menos desde 2022 e foi uma das principais cobranças do PL, partido de Bolsonaro, para apoiar Hugo Motta (Republicanos-PB) na disputa pela presidência da Casa. Motta, para agradar os bolsonaristas, acatou o pedido, mas evitou se comprometer com a urgência do projeto.

A proposta original foi apresentado pelo deputado Major Vitor Hugo (PL-GO), mas há ao menos sete outros projetos apensados – quando unifica projetos que tratam do mesmo tema – à ele. O texto prevê anistia “a todos os que tenham participado de manifestações em qualquer lugar do território nacional do dia 30 de outubro de 2022” em diante, o que pode beneficiar todos os réus dos ataques de 8 de janeiro, além do próprio ex-presidente Jair Bolsonaro e seus aliados.

O relator do projeto, deputado Rodrigo Valadares (União Brasil-SE), chegou a apresentar um parecer favorável à anistia, mas viu seu texto engavetado pelo ex-presidente da Câmara Arthur Lira (Progressistas-AL). Lira, assim como Motta, deu todos os indícios de que não entraria na seara contra o STF e Palácio do Planalto.

Bolsonaro réu

Bolsonaro se tornou réu na última quarta-feira, 26, no inquérito que investiga o plano golpista após as eleições de 2022. Além dele, outros sete aliados também são alvos no STF:

1 – Walter Braga Netto;
2 – Anderson Torres;
3 – Augusto Heleno;
4 – Paulo Sérgio Nogueira;
5 – Almir Garner Santos;
6 – Alexandre Ramagem;
7 – Mauro Cid.

O STF deverá realizar uma nova coleta de provas e depoimentos das testemunhas de defesa e acusação. Em seguida, deve ouvir os oito réus na ação.

O julgamento definitivo deve acontecer no fim deste ano. A expectativa de interlocutores da Suprema Corte é que a Primeira Turma analise o caso entre setembro e outubro, para evitar contaminar as eleições de 2026.