PL Antifacção: veja as diferenças entre o texto do governo e o aprovado na Câmara

Após seis versões e críticas de governistas sobre ‘lambança legislativa’, projeto endurece regras prisionais

câmara dos deputados
Foram 370 votos favoráveis e 110 contrários Foto: Bruno Spada/Câmara dos Deputados

Aprovado na Câmara dos Deputados na noite de terça-feira, 18, o texto final do chamado Projeto de Lei Antifacção apresentou alterações em relação à proposta original do governo federal. A proposta que cria um novo marco legal para o enfrentamento de organizações criminosas foi relatada pelo deputado federal Guilherme Derrite (PP-SP), secretário licenciado de Segurança Pública de São Paulo.

Em 31 de outubro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) assinou o projeto, que tinha como objetivo tentar sufocar o crime organizado no Brasil. Então o texto foi enviado à Câmara com pedido de urgência na análise. O presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), atribuiu a relatoria da proposta a Guilherme Derrite, escolha que gerou incômodo no Planalto.

+ Após impasses, Câmara aprova PL Antifacção para asfixiar facções criminosas

A tramitação foi marcada por tensão entre governo e oposição. Lideranças governistas criticaram as mudanças apresentadas pelo relator, enquanto opositores cobravam um endurecimento maior do texto. Devido ao impasse, Derrite fez seis versões do texto.

O projeto final, aprovado na Câmara por 370 votos, agora será enviado ao Senado Federal e terá como relator Alessandro Vieira (MDB). Somente depois passará por sanção presidencial e então virará lei.

Confira os principais pontos do PL:

O texto trata de “organizações criminosas, paramilitares ou milícias privadas” que atuem com violência ou grave ameaça. Derrite também inseriu o conceito de “organização criminosa ultraviolenta”, que concentra as punições mais rígidas.

O governo federal, no entanto, criticou a ausência da expressão “facções criminosas” na proposta final.

Aumento de penas e novos tipos penais

  • A proposta prevê penas de 20 a 40 anos de prisão para integrantes de facções, milícias e grupos paramilitares, podendo chegar a 66 anos em algumas hipóteses;
  • Novos crimes, como novo cangaço, domínio territorial, uso de explosivos, armas pesadas, drones e ataques contra infraestrutura essencial;
  • Agravante para crimes ligados a garimpo ilegal;
  • Dificuldade de progressão de regime para membros dessas organizações.

Regras mais rígidas

  • Progressão poderá exigir 70%, 75%, 80% ou até 85% do cumprimento da pena, dependendo da gravidade e da reincidência;
  • Chefes de organizações criminosas devem cumprir as penas em presídios federais de segurança máxima.

Instrumentos de investigação

  • Monitoramento audiovisual de parlatórios, inclusive contato com advogados em hipóteses excepcionais e sob ordem judicial;
  • Ampliação de buscas, quebras de sigilo e operações encobertas;
  • Audiências e atos processuais por videoconferência;
  • Atribuições da Polícia Federal seguem intactas e não há alteração na Lei Antiterrorismo (ponto alvo de críticas do governo apresentado nas versões anteriores do texto).

Confisco e alienação de bens

  • Bloqueio imediato de contas, bens e criptoativos;
  • Alienação antecipada ainda na fase da investigação;
  • Possibilidade de intervenção judicial em empresas usadas por organizações criminosas.

Veja os principais pontos do texto inicial, proposto pelo governo federal:

  • Criação de “facção criminosa”: define-se a figura de “organização criminosa” e “facção criminosa” com penas de 8 a 15 anos de prisão para quem visa controle territorial ou econômico mediante violência, coação, ameaça ou outro meio intimidatório;
  • Homicídio qualificado: praticado em benefício de facção criminosa a pena varia de 12 a 30 anos de prisão;
  • Crimes hediondos: delitos de organização criminosa passam a ser considerado crime hediondo, inafiançável e impossível de ser perdoado por indulto ou anistia;
  • Agravantes de pena: aumento de penas quando houver evidências de que a facção criminosa manteve conexão com outras organizações, domínio territorial ou prisional e morte ou lesão corporal de agente de segurança pública;
  • Investigação: permite infiltração de policiais e colaboradores em facções;
  • Acesso de dados: possibilita que juízes determinem que provedores de internet, telefonia e empresas de tecnologia viabilizem acesso a dados de geolocalização em casos de ameaça à vida ou integridade de pessoas;
  • Criação do “Banco Nacional de Facções Criminosas” pelo Poder Executivo;
  • Afastamento de servidores públicos envolvidos com facção ou milícia;
  • Asfixia patrimonial e financeira: juízes poderão decretar intervenção judicial em pessoas jurídicas usadas por facções, nomeando gestores externos e bloqueando operações financeiras, além de permitir confisco de bens e intervenção judicial em empresas utilizadas para crimes.

Após aprovação do texto substitutivo, Derrite afirmou em coletiva que esteve “100% à disposição para o diálogo”, mas não foi procurado por membros do governo federal.

Para o relator, o Planalto não tinha intenção de debater o projeto. “Queria politizar, escolheu distorcer e atacar, preferiu criar mentiras e falsas narrativas, ao invés de discutir soluções para um problema tão sério para o Brasil”, disparou.

“O governo tentou impedir a evolução de um projeto porque mandou para essa casa um texto fraco e benevolente com crime organizado”, completou.

O parlamentar admitiu que decidiu não comparecer à reunião com ministros Ricardo Lewandowski (Justiça e Segurança Pública) e Gleisi Hoffmann (Relações Institucionais), na terça-feira, porque o Executivo teve mais de 15 dias para debater o texto, mas não teria o procurado.

Por fim, Derrite disse que ouviu membros do governo de forma não oficial e atendeu aos pedidos, “em especial da Secretaria da Fazenda, que não tinha sido atendida nem pelo Ministério da Justiça”.

Já a ministra Gleisi Hoffmann definiu como “lambança legislativa” as seis versões do relatório e o texto final não muda a estrutura dos outros documentos “apresentados desde o início” pelo relator.