Como se não bastasse todos os males, já sabidos e comprovados, ocasionados pelo aquecimento global, agora se pode afirmar que a mudança climática está interferindo na preservação de pinturas rupestres no mundo. Foi o que apontou um estudo da Universidade de Griffith, na Austrália, que descobriu mais uma mazela, desta vez de impacto cultural e histórico. Em cavernas na ilha indonésia de Sulawesi, o aumento das temperaturas dos últimos 40 anos provocou um fenômeno conhecido como haloclastia, que causa a fragmentação das rochas de calcário devido à presença de cristais salinos. A deterioração acontece da seguinte forma: com a umidade, as paredes absorvem os sais minerais e depois da evaporação do líquido, as partículas de sal se transformam em cristais, que crescem ou diminuem de tamanho a depender da variação de temperatura. Esse fenômeno pode transformar a estrutura da rocha, elevando parte do painel e separando um desenho do outro. A haloclastia também pode causar a esfoliação da superfície do calcário, fazendo as pinturas de mais de 40 mil anos desaparecerem. A questão é que a parede em que se vê a história dos primeiros ancestrais da humanidade está se desfazendo, virando pó.

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A arte rupestre das cavernas de Sulawesi está localizada em um ambiente tropical, o que torna particularmente vulnerável ao impacto das condições climáticas, que se alteram com mais frequência do que em outras partes do mundo. Com o aquecimento global, porém, a destruição tem se acelerado.

PERIGO O professor André Strauss, da USP, afirma que perda é dramática (Crédito:Divulgação)

Dados valiosos

O monitoramento feito pela Universidade de Griffith apontou que as paredes podem sofrer elevação de temperatura até três vezes mais. A quantidade de cristais nas rochas também pode crescer exponencialmente. “O aquecimento global está interferindo no ciclo normal do planeta”, afirma Davi Martins, porta-voz de Clima e Justiça do Greenpeace. Em um dos casos, cinco meses foram suficientes para que um dos painéis rupestres perdesse uma parte expressiva de suas pinturas.

Segundo André Menezes Strauss, professor de arqueologia da USP, a destruição desse tipo de arte é algo irreversível. “Ficamos mais pobres culturalmente”, afirma. As pinturas rupestres de Sulawesi dão indicações da forma como os Homo sapiens se relacionavam com a natureza, como era a convivência em grupo e noções de suas crenças. Os desenhos representam a mais antiga evidência da representação humana nessa parte do mundo. “Consideramos as pinturas como o surgimento do pensamento humano moderno”, afirma Strauss. Por isso, o prejuízo dos danos ambientais é imenso. Em outras partes do mundo também foi percebido o efeito negativo do aquecimento global: as pinturas de Altamira, na Espanha; Lascaux, na França; Serra da Capivara e Lagoa Santa, no Brasil, correm risco. O estudo australiano é mais um documento a confirmar que a ação pode destruir esse patrimônio.

A partir do conhecimento científico de quão nocivas são as mudanças climáticas, é urgente que as nações diminuam as emissões de gases do efeito estufa. Isso significa que as medidas do Acordo de Paris devem ser priorizadas.