A insatisfação da cúpula do Ministério Público Federal com a atuação de Augusto Aras no comando da Procuradoria-Geral da República chegou ao seu nível máximo nos últimos dias. Irritados com a inércia do chefe da PGR para investigar Bolsonaro, seu fiador, subprocuradores-gerais da República chegaram a um consenso: a “paciência acabou”, como explicou um dos integrantes influentes do órgão ouvidos por ISTOÉ. O entendimento é que não é mais possível que o procurador-geral “continue de braços cruzados” diante da sequência dos graves ataques desferidos pelo mandatário às autoridades e ao sistema eleitoral.

COBRANÇA O presidente do STF, Luiz Fux, pede que o PGR exerça suas funções com mais afinco (Crédito:FELLIPE SAMPAIO)

A gota d’água foi a escalada de declarações autoritárias de Bolsonaro sobre as eleições do ano que vem. Frente a essas ameaças, alguns integrantes do MPF divulgaram um manifesto criticando as falas do ex-capitão e cobrando uma atitude mais dura de Aras quanto às atitudes do presidente. O texto conta com a adesão de 31 dos 74 subprocuradores, entre os quais Nicolao Dino, um dos cabeças do movimento. “Ameaçar que não vai ter eleição é o mais grave de tudo. Não há nada mais grave do que isso. É muito sério. E as providências tinham que ser tomadas pelo PGR, que não faz nada”, afirmou um dos signatários do manifesto, que preferiu não se identificar. “Essa omissão de Aras ofende a nossa convicção sobre o papel do Ministério Público.”

Outro subprocurador ouvido pela reportagem disse que aderiu ao manifesto em razão de Bolsonaro colocar a democracia em risco. Citou, inclusive, o desfile de tanques de guerra promovido pelo presidente às vésperas de a Câmara analisar a PEC do voto impresso.“O ponto central é que há sinais de desapreço e de riscos à democracia, como os manifestados na exibição bélica da Marinha. E isso, sem dúvida, é inegociável. Cabe ao PGR exercer seu protagonismo como defensor do regime democrático”, afirmou. “Ele precisa se posicionar, agindo em relação a esse conjunto de fatos que compõem um cenário preocupante.”

Ruptura institucional

No documento, o grupo menciona, entre outras coisas, a possibilidade de “ruptura institucional” estimulada pelo presidente, e pede para que Aras deixe de ser passivo diante dos fatos. “Na defesa do STF e do TSE, de seus integrantes e de suas decisões, deve o Procurador-Geral da República agir enfaticamente — já que, na condição de Procurador-Geral Eleitoral, ele tem papel fundamental como autor de ações de proteção da democracia —, não lhe sendo dado assistir passivamente aos estarrecedores ataques àquelas Cortes e a seus membros”, escreveram os subprocuradores.

O clima na PGR tem ficado cada vez mais tenso para Aras. Pelos corredores da instituição, a sensação é de que o número de membros do MPF descontentes com a postura inerte dele aumenta a olhos vistos e a cada dia. Muitos afirmam, inclusive, que o apoio ao manifesto vai crescer. O movimento acontece no momento em que Aras está sendo reconduzido por Bolsonaro ao comando do órgão, passando mais uma vez por cima das eleições internas realizadas entre os membros do próprio MPF. A avaliação é que a inoperância de Aras com o passar do tempo despertou uma mobilização entre procuradores que, até então, se mantinham alheios aos equívocos do PGR. “A insatisfação sempre existiu. O que não havia era a mobilização da categoria. E agora há”, afirmou um integrante da cúpula do MPF.

Os subprocuradores decidiram tornar público o manifesto por esperar que ele tenha o mesmo efeito de um posicionamento anterior que obrigou Aras a tomar providências contra o ex-ministro Eduardo Pazuello, em janeiro, pelo colapso sanitário em Manaus, quando centenas de pessoas morreram asfixiadas por falta de oxigênio. “Não podemos esquecer que foi uma manifestação como essa, feita por integrantes do conselho, que fez com que Aras pedisse abertura de inquérito contra o general”, disse um dos signatário do texto. Os procuradores, no entanto, não estão sozinhos. O próprio presidente do STF, Luiz Fux, reuniu-se com Aras na sexta-feira, 6, para cobrar maior empenho do PGR nas ações que envolvem o mandatário. Com o cerco, é de se esperar que agora Aras abandone a postura de novo engavetador-geral da República, título que no passado foi atribuído a Geraldo Brindeiro.