A Polícia Federal investiga um possível superfaturamento na compra de respiradores no Estado do Amazonas durante a pandemia do novo coronavírus. Segundo a PF, um esquema de corrupção envolvendo integrantes da alta cúpula do governo e empresários comprou 28 respiradores da loja de vinhos FJAP, sem licitação, por R$ 3 milhões. As informações são do Jornal Nacional, que teve acesso a mensagens e gravações dos investigados.

De acordo com a PF, o esquema da compra superfaturada de respiradores foi feito por uma triangulação, na qual o governo do estado encomendou os respiradores da loja de vinhos, que por sua vez comprou os aparelhos da Sonoar, empresa que comercializa esse tipo de equipamento. A FJAP, então, revendeu os respiradores para o governo do Amazonas com um superfaturamento de 133%.

A Procuradoria Geral da República diz que o governador Wilson Lima (PSC) é suspeito de ser o chefe do esquema. Lima foi alvo de busca e apreensão em junho, na primeira fase da Operação Sangria, que investiga a compra desses equipamentos.

O vice-governador, Carlos Almeida (PTB), também é um dos suspeitos de envolvimento no esquema, segundo a PF. No último dia 8, ele foi alvo da segunda etapa da Operação Sangria, que expediu 11 mandados de busca e apreensão, que também tinha ordens de cumprir a prisão temporária de cinco pessoas, entre elas o ex-secretário de Saúde Rodrigo Tobias, que acabou solto no domingo (18), porque venceu o prazo da prisão temporária.

Nas mensagens apresentadas na reportagem do Jornal Nacional, Tobias conversa com o secretário adjunto de Saúde na época, Perseverando Garcia, e diz que o governador Wilson Lima conhecia um empresário que financiaria os respiradores para o governo.

“Eu estou recebendo muitas demandas, e uma delas que eu quero canalizar é do governador, parece que ele tem um canal de um empresário aqui do Amazonas, o cara é grande. Ele tem bala na agulha e se prontificou a fazer as compras pelo governo do estado”, diz Rodrigo Tobias.

Em outra mensagem, dois dias antes, o então secretário adjunto de Saúde Perseverando Garcia sugere que ele próprio faça uma licitação fantasma para viabilizar a compra dos aparelhos.

“Por que eu não corro com um processo fantasma, cara? E aí faço o empenho, entendeu? É muito melhor do que empenhar sem nada e mandar pagar, não tem garantia nenhuma. Não tem amparo nenhum”, diz Perseverando.

Os respiradores foram comprados pelo governo do Amazonas em abril e após a abertura das investigações, em junho, os suspeitos de participarem do esquema demonstram em nova troca de mensagens que estão apreensivos com ela.

Preso na primeira fase da Operação Sangria, o ex-secretário executivo de Saúde João Paulo Marques dos Santos diz que teme que o grupo sirva de bode expiatório pela compra dos equipamentos, enquanto Perseverando complementa dizendo que sabe que eles querem dar uma resposta à sociedade.

Marques dos Santos pede para que o então secretário de Saúde Rodrigo Tobias não apague as mensagens que trocaram, pois elas poderiam ajudar a salvar ele próprio (Marques dos Santos) e o secretário adjunto de Saúde na época, Perseverando Garcia.

Quanto ao vice-governador, Carlos Almeida, a PF investiga por que ele fazia reuniões com integrantes do governo, parlamentares e empresários em um escritório de advocacia em um prédio comercial, e não em seu gabinete. Segundo a PF, a suspeita é de que esses encontros serviram para pagamentos de propina.

Em filmagens exibidas durante a reportagem do JN e gravadas em maio, Carlos Almeida aparece chegando a esse prédio com assessores e, posteriormente, indo embora com uma bolsa.

A Polícia Federal apreendeu durante as investigações documentos com propostas de venda de mais respiradores da loja de vinhos para o governo do Amazonas, com valores superiores a R$ 35 milhões. Segundo a PF, o negócio só não foi concluído porque os envolvidos acabaram presos antes.

OUTRO LADO

A loja de vinhos FJAP declarou que importa equipamentos médicos e vinhos e que somou aos preços dos respiradores uma margem de 10% como lucro e outros 10% de impostos.

O ex-secretário de Saúde Rodrigo Tobias afirmou que não praticou ato ilícito e que as mensagens de celular provam sua inocência.

O vice Carlos Almeida também declarou que não cometeu nenhum crime, e que usou o escritório de um amigo para trabalhar por poucos dias, depois que se afastou da Casa Civil.

O governador Wilson Lima se colocou à disposição para esclarecimentos e disse que pauta sua gestão pela ética e transparência.

Perseverando Garcia disse que vai se manifestar quando tiver acesso aos autos, segundo a sua defesa. A Sonoar, empresa que forneceu os respiradores para a FJAP não quis se manifestar. Já o advogado de João Paulo Marques Santos não atendeu às ligações do JN.