Atenção senhor (a) editor (a): A nota foi atualizada com o posicionamento da Vale:

O Ministério Público Federal informou nesta segunda-feira, 4, que o Centro Internacional de Métodos Numéricos en Ingenieria da Universitat Politécnica de Catalunya (UPC) entregou o relatório final dos serviços de análise, modelagem e simulação computacional sobre as causas prováveis ou determinantes e/ou concorrentes do rompimento da Barragem I, da Vale, na Mina do Córrego do Feijão em janeiro de 2019. De acordo com a Procuradoria, o documento confirma que a ruptura da barragem B1, em Brumadinho, se deu em razão do fenômeno da liquefação.

“É incontroverso que o rompimento da Barragem I envolveu o fenômeno do fluxo por liquefação. A liquefação é um processo associado ao aumento da poropressão, pelo qual a resistência ao cisalhamento é reduzida à medida que a tensão efetiva no solo se aproxima de zero. Apenas materiais contráteis estão sujeitos à liquefação. A liquefação está intrinsecamente relacionada ao comportamento frágil não drenado do solo”, diz o relatório de mais de 500 páginas.

O trabalho foi acompanhado por peritos da Polícia Federal (PF) e desenvolvido sob a supervisão de consultores técnicos independentes. Nesta segunda, 4, esses profissionais entregaram à Procuradoria a análise do relatório e referendaram a qualidade técnica do trabalho feito pelo CIMNE/UPC. As informações foram divulgadas pelo Ministério Público Federal.

A contratação do Centro Internacional de Métodos Numéricos en Ingenieria é fruto do acordo celebrado entre o MPF e a Vale, que assumiu os custos para a realização das atividades da instituição espanhola, consideradas fundamentais para a conclusão das investigações sobre as causas do rompimento da barragem. A escolha da UPC para a realização do estudo ficou a cargo exclusivo da Procuradoria, com o auxílio da PF.

Para apontar que a ruptura da barragem B1, em Brumadinho, se deu em razão do fenômeno da liquefação, o CIMNE realizou diversas simulações: foi desenvolvido um modelo numérico o mais próximo possível da realidade e as informações disponíveis da barragem foram examinadas criticamente, incluindo a história da construção da barragem, registros pluviométricos (com extensão de mais de 40 anos) e movimentações de superfície da barragem nos anos imediatamente anteriores ao rompimento.

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O relatório aponta que ‘a maioria dos rejeitos da barragem eram fofos, contráteis, saturados e mal drenados e, portanto, altamente suscetíveis à liquefação’. De acordo com a Procuradoria, a caracterização geotécnica dos rejeitos foi considerada essencial para viabilizar um modelo computacional verossímil, razão pela qual foi realizada campanha de coleta de amostras e testes de laboratórios, cujos resultados foram considerados em conjunto com os dados obtidos anteriormente.

O relatório também deu atenção especial às operações realizadas no ano anterior ao rompimento, que envolveram perfuração horizontal para instalação de drenos e perfuração de furos verticais para instalação de piezômetros, diz o MPF.

“O documento também cita o grave incidente ocorrido durante a instalação de um dreno, em junho de 2018, que resultou em vazamentos visíveis de lama em vários pontos da barragem, mas que foram contidos. Esse incidente provocou um aumento local e temporário nas pressões piezométricas da água e algum abatimento na barragem. Registros sismográficos sugerem que uma liquefação contida pode ter ocorrido na época”, informou a Procuradoria.

Gatilhos

De acordo com o MPF, o relatório analisa os potenciais gatilhos da liquefação. Segundo o documento, foram examinados os registros sismográficos e excluída a hipótese de um carregamento dinâmico, seja por terremotos ou atividades de mineração, como gatilho provável do rompimento.

A Procuradoria indicou que o fenômeno do creep (deformações internas contínuas, que se desenvolvem com o tempo, sob determinada carga), apontado como um dos gatilhos para a liquefação em estudo anterior contratado pela Vale, foi analisado de forma mais aprofundada. Segundo o Ministério Público Federal, não foram encontradas evidências de qualquer situação significativa de cimentação nos rejeitos.

“Para avaliar o comportamento de creep, os efeitos da taxa de deformação dos rejeitos foram sistematicamente medidos em três diferentes materiais reconstituídos usando testes triaxiais de controle de taxas de deformação. A magnitude dos efeitos da taxa de deformação medidos nos rejeitos foi sempre pequena e não indicou um papel relevante do processo de creep no rompimento”

Após a calibragem do modelo computacional, cujos parâmetros foram determinados usando todas as fontes de informação relevantes obtidas a partir dos testes in situ e testes de laboratório, um conjunto de análises numéricas foi executado para auxiliar na interpretação do rompimento, indicou a Procuradoria.

“As simulações da história da barragem não mostram sinais de colapso iminente da barragem no momento da ruptura, mesmo quando fenômenos de creep e de aumento de precipitação são incorporados na análise. Na verdade, a estabilidade também é obtida mesmo que a análise seja continuada por um período de mais 100 anos. Este resultado sugere que algum fator ou evento adicional foi necessário para que a barragem rompesse.”

Nessa linha, o MPF informou que outros mecanismos potenciais de gatilho foram examinados, incluindo, a simulação da sobrepressão de água associada à perfuração do furo B1-SM-13, que, de fato, estava ocorrendo no momento da ruptura. “Sob condições de tensão e hidráulicas semelhantes às do fundo do furo B1-SM-13 durante a perfuração, as análises numéricas mostram que, usando o modelo constitutivo e os parâmetros adotados para os rejeitos, pode ocorrer a liquefação local devido à sobrepressão de água e sua propagação pela barragem.”

De acordo com a Procuradoria, nas simulações numéricas (em 2D e 3D) da perfuração do furo B1-SM-13, constatou-se que: “As características geométricas da ruptura e o padrão de deslocamentos resultantes são consistentes com as observações visuais. Em particular, o mecanismo de colapso obtido mostra uma ruptura dentro da barragem começando na crista e se estendendo até um local logo acima do dique de partida. O padrão de deslocamentos apresenta abatimentos na crista da barragem e protuberâncias para fora na base, conforme observado no início do rompimento.”


Foram feitas simulações de perfurações em outros pontos, mas em nenhum deles ocorre a ruptura geral da barragem; a zona de liquefação permanece contida, apresentando apenas um progresso limitado, diz o MPF. Segundo o relatório, “os exames de testes de CPTu perto da localização dos furos verticais mostram que o perfil do solo no local do furo B1-SM-13 era especialmente desfavorável em relação ao início e propagação da liquefação.”

“O conjunto de análises numéricas realizadas permite concluir que a perfuração do furo B1-SM-13 é um potencial gatilho da liquefação que ocasionou o rompimento da barragem. As análises realizadas não foram capazes de identificar outros gatilhos de liquefação. Em particular, os cálculos realizados incorporando apenas os efeitos de aumento da precipitação e do creep, isoladamente ou em combinação, não resultaram em um rompimento geral da barragem.”

com a palavra, a Vale

A Vale, desde o início das investigações, vem colaborando com as autoridades, tendo inclusive celebrado um termo de cooperação com o Ministério Público Federal e a Polícia Federal, para que fossem contratados peritos da Universidade Politécnica da Catalunha, na Espanha, uma das mais renomadas do mundo, a fim de analisarem o acidente ocorrido em 25 de janeiro de 2019 com a Barragem I em Brumadinho. Esse estudo, assim como outros já realizados, concluiu que não houve nenhum indicativo prévio à ruptura da estrutura, que se deu de forma abrupta. Esse estudo também atesta que teria havido uma conjugação particularmente desfavorável de circunstâncias no momento e no local em que se fazia a perfuração do 13º poço vertical por uma empresa especializada, operação essa que se destinava à instalação de equipamentos mais sofisticados para leitura do nível de água no interior da barragem e à coleta de amostras, sendo que sem essa perfuração, a barragem, nas condições específicas em que se encontrava (inclusive paralisada há mais de 2 anos), segundo as simulações matemáticas realizadas para um período de 100 anos, permaneceria estável.

A Vale reafirma seu profundo respeito para com as famílias impactadas direta e indiretamente pelo rompimento da barragem e continuará colaborando com as autoridades, aguardando a conclusão do inquérito para a devida manifestação nos autos por intermédio de seu advogado, David Rechulski.

Não obstante, embora compreenda que cada Autoridade que presida investigações é livre na formação de suas próprias convicções, a Vale reafirma que sempre norteou suas atividades por premissas de segurança e que nunca se evidenciou nenhum cenário de risco iminente da ruptura da estrutura, o que é confirmado em todos os laudos já expedidos.


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