O diretor de Fiscalização do Banco Central, Anthero Meirelles, salientou nesta quinta-feira, 7, que a percepção é a de que o risco da economia doméstica aumentou. “Isso começou a bater no crédito, como não podia ser diferente”, disse.

Ele acrescentou, no entanto, que os efeitos negativos sobre os sistemas bancário e financeiro seguiram “controlados”.

Esta foi a primeira avaliação do diretor sobre o Relatório de Estabilidade Financeira, que é referente ao segundo semestre do ano passado. Ele fez a avaliação de que, no período, os ambientes externo e doméstico seguiram complexos e citou alguns eventos internacionais, em especial dos Estados Unidos, Japão e União Europeia.

Solvência

Meirelles afirmou que o nível de solvência do Sistema Financeiro Nacional (SFN) permaneceu elevado no segundo semestre de 2015. Segundo ele, a liquidez das instituições se manteve em patamar satisfatório.

O diretor afirmou que a elevação da CSLL também proporcionou ganhos contábeis, com a ativação de créditos tributários, o que gerou resultado. “Esse resultado foi direcionado para o aumento de provisões, (com instituições) se preparando para um cenário adverso”, disse.

Recuperação judicial

Anthero Meirelles apontou que a segunda metade de 2015 mostrou um volume maior de empresas em recuperação judicial. “Os primeiros dados de 2016 já mostram também volumes elevados”, alertou.

Ele salientou que, entre as Pessoas Jurídicas, a inadimplência está maior entre as empresas de menor porte. “Neste caso, a situação é bem maior do que a das grandes. Por isso, maior aversão a risco dessas empresas”, considerou.

No geral, conforme o diretor, o crescimento da inadimplência não é elevada. “Não está acima dos valores históricos, mas há crescimento”, disse, acrescentando que há piora tanto em relação aos bancos públicos, quanto privados, em todo o agregado do sistema.

Ele também detectou aumento do indicador antecedente do calote, que registra atrasos de 15 a 90 dias. “Não é nada assustador, mas, de fato, a situação econômica começa a se refletir nos dados de crédito”, disse. Segundo Anthero, não há mudança substancial no comprometimento de renda da família.

Crédito e demanda

Apesar da declarada estratégia do governo de reativar a economia através da ampliação do crédito, o diretor de Fiscalização do Banco Central afirmou que não há apetite dos bancos públicos e privados para ampliar os financiamentos, bem como não há demanda.

Para o diretor, é preciso primeiro retomar a confiança das famílias e das empresas para que depois se possa observar um crescimento nessa área. “Aumento de crédito, estímulo ao crédito pode funcionar num momento de recuperação de confiança”, disse. “Acho que o crédito voltará a crescer quando esses níveis de confiança estiverem se recuperando”.

Para este ano, o diretor espera que a inadimplência continue crescendo. “Não esperamos nada explosivo, nenhuma ruptura”, ponderou. Segundo ele, o nível de provisão das instituições é confortável. “O sistema financeiro é um elo forte dessa corrente”, afirmou.

Reestruturação

O Banco Central estimou como as reestruturações de crédito – que compreendem casos em que as instituições financeiras aceitam oferecer condições de quitação que não ofereceriam normalmente – impactam no índice de inadimplência. Segundo Meirelles, sem reestruturação de crédito, a inadimplência de dezembro do ano passado, que ficou em 3,4%, poderia ser acrescida em 0,7 ponto porcentual, chegando a 4,1%.

O diretor afirmou que o ambiente econômico é um dos fatores que levaram a um aumento das renegociações e das reestruturações de dívidas com instituições financeiras. Segundo ele, as instituições estão aumentando a provisão para um aumento na inadimplência. “Elas continuam dando aumento nessa provisão para fazer frente a um eventual aumento (da inadimplência) em função das condições econômicas”, disse.

Funding externo

Meirelles salientou que houve redução da quantidade de captações externas no segundo semestre do ano passado. Apesar disso, segundo ele, há um aumento do volume, o que é explicado pela variação cambial. “Algum aumento que se viu foi em função de câmbio, porque as operações têm se reduzidas”, salientou. “O sistema continua com baixa dependência de funding externo”, continuou.

O diretor também salientou que houve aumento dos índices de liquidez (do IL e do ILE) na segunda metade do ano passado. Isso se deu, conforme Meirelles, nos dois casos, até por conta da menor concessão de crédito. Ele lembrou que o acordo de Basileia tem como patamar mínimo 0,6 e os indicadores domésticos estão em torno de 1.

Lava Jato

A forte redução do espaço reservado aos desdobramentos da Operação Lava Jato sobre os sistemas financeiro e bancário no Relatório de Estabilidade Financeira foi minimizada pelo diretor de Fiscalização do Banco Central. “Não tem mais nenhuma grande novidade (sobre Lava Jato), não houve grandes mudanças nessa questão”, avaliou.

No cenário elaborado pelo BC há seis meses, havia um estudo sobre o caso extremo em que todas as empresas citadas na Lava Jato quebrariam. “O estudo mostrava que o sistema aguenta até mesmo cenários piores. Vimos que o sistema financeiro aguentaria até cenários mais adversos. Esse cenário pior não se materializou e imaginamos que não vai se materializar”, disse Anthero.

De qualquer forma, ele disse que o BC tem acompanhado o aumento dos provisionamentos ocorridos nos bancos por causa de situações de risco envolvendo essas empresas. “A exposição permanece naqueles patamares passados”, disse. “Se for ver, os riscos estão até menores porque as provisões aumentaram”, continuou.

BTG

O diretor de Fiscalização do Banco Central disse que a situação pela qual passou o banco BTG Pactual, com problema de liquidez, despertou preocupação para a autoridade reguladora. “Mas é uma instituição muito ativa dentro da supervisão quanto da própria instituição para buscar soluções. O episódio exigiu de nós atuação bastante atenta e firme em reação ao caso”, disse.

Anthero salientou que, dado o conjunto de ações tomadas, com um momento de estresse de liquidez, o banco entrou no processo com o balanço sólido. “O que houve, foi pressão de liquidez”, afirmou.

O diretor disse que o BC tem tido contatos permanentes com outros supervisores. “Participamos e promovemos relações com outras instituições e outros supervisores buscaram o Banco Central do Brasil para obter informações sobre a evolução da situação, e nós também”, relatou.

Musculatura

Depois de registrar ganho de rentabilidade dos bancos em 2015, mesmo em meio à crise econômica, o Banco Central agora prevê uma diminuição dos lucros das instituições financeiras neste ano. “Esperamos que a rentabilidade do sistema financeiro seja menor, mas um degrau abaixo”, disse ele, indicando que não espera uma ruptura no sistema.

De acordo com Anthero, as instituições já reconheceram perdas potenciais que vão se materializar. “Os bancos têm musculatura para aguentar esse momento mais desafiador”, ressaltou.