A Santa Sé e a China comunista se preparam para renovar um acordo histórico assinado há dois anos, que dá ao papa a última palavra na nomeação de bispos chineses, despertando a ira do governo americano.

Nos Estados Unidos, o presidente Donald Trump usa a repressão religiosa na China como um argumento para a campanha presidencial.

Seu secretário de Estado, Mike Pompeo, partiu para o ataque frontal ao Vaticano ao publicar no final da semana um tuíte e uma coluna denunciando as “horríveis” perseguições de crentes de todas as religiões na China que “revoltam” muitos países.

“Mais do que nunca, o povo chinês precisa do testemunho moral e da autoridade do Vaticano”, disse ele na revista religiosa americana “First Things”. Acrescentando que “o acordo entre a China e o Vaticano não protegeu os católicos contra as ações do partido”.

O papa Francisco certamente acostumou os fiéis a denunciarem explicitamente muitas perseguições no planeta, mas adotou uma atitude diplomática de pequenos passos com Pequim, para unir uma Igreja chinesa dividida.

Os cerca de 12 milhões de católicos chineses – uma minoria muito pequena neste país de quase 1,4 bilhão de pessoas – estão divididos há décadas entre uma Igreja “patriótica” controlada pelo regime comunista e uma chamada Igreja “clandestina” que reconhece o autoridade do papa e muitas vezes é perseguida como tal.

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Em 22 de setembro de 2018, o Vaticano selou um acordo “provisório” histórico com o regime comunista de Pequim, resultado de negociações intermináveis, cujo conteúdo exato nunca foi publicado.

O único ponto tangível anunciado na época: o papa Francisco reconheceu imediatamente oito bispos chineses nomeados por Pequim sem sua aprovação.

Dois anos depois, os resultados não são brilhantes para a diplomacia do Vaticano, mas dois novos bispos foram nomeados na China com o endosso final do líder dos 1,3 bilhão de católicos no planeta.

Antes, eles tinham que se tornar membros da Igreja Patriótica oficial, o que muitos antigos prelados perseguidos no passado ainda se recusam veementemente a fazer.

Em todo o mundo, é o papa quem decide sobre a nomeação dos bispos, homens que ele mesmo conheceu ou que lhe são recomendados pelas conferências episcopais nacionais.

Momento histórico em fevereiro de 2020: “ministros” das Relações Exteriores da China e do Vaticano se encontraram publicamente em um evento internacional, fato inédito em sete décadas.

As relações diplomáticas entre Pequim e a Santa Sé foram rompidas em 1951, dois anos depois que os comunistas chegaram ao poder.

O Vaticano também continua a manter relações diplomáticas com Taiwan. Um impasse, pois esta ilha de 23 milhões de habitantes é considerada por Pequim como uma província chinesa à espera da reunificação.

– Autorização do papa para renovar acordo –

O papa Francisco acaba de autorizar a renovação do acordo, ainda em modo “experimental” por mais dois anos, disse à AFP uma fonte próxima ao assunto.


Uma discreta troca de notas com a China deve ainda ser selada “em outubro”.

Questões espinhosas, como a de padres católicos chineses que desaparecem repentinamente de suas paróquias por semanas “a convite” das autoridades, estão sendo levantadas por diplomatas do Vaticano, assegura este especialista.

São alvo de críticas recorrentes do cardeal Joseph Zen de Hong Kong, ou mesmo do padre italiano Bernardo Cervellera, ex-missionário na China, que publica em seu site AsiaNews depoimentos de católicos chineses muito insatisfeitos com o acordo.

“Nosso interesse atual com a China é normalizar ao máximo a vida da Igreja”, explicou em meados de setembro o cardeal Pietro Parolin, braço direito do papa Francisco e principal arquiteto do acordo, ao admitir que os primeiros resultados do acordo “não foram particularmente notáveis”.

Quatro dias antes, Zhao Lijian, porta-voz do chanceler chinês, falou positivamente do acordo bilateral, “implementado com sucesso”.

Um elogio para um Partido Comunista Chinês que questiona qualquer organização, especialmente religiosa, que possa ameaçar sua autoridade.

Pequim observa há vários anos uma política de “sinização” das religiões, com o objetivo de adequá-las aos objetivos do poder comunista.

A China do presidente Xi Jinping, que assumiu o poder em 2012, também aumentou sua vigilância sobre todos os cultos. Igrejas foram destruídas, cruzes retiradas de campanários e creches religiosas fechadas.


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