6 de maio de 2016: estudantes secundaristas desocupam a Assembleia Legislativa de São Paulo, depois de três dias de protestos pela instalação da CPI da Merenda. Após a pressão dos jovens, os deputados estaduais iniciam os trabalhos da comissão parlamentar de inquérito.

Dia 1º de abril de 1964: em uma das consequências do golpe militar que começava a ser instituído naquele momento, o prédio da sede da União Nacional dos Estudantes (UNE), no Rio, é incendiado – um dos marcos deste outro momento histórico em que os estudantes tiveram sua parcela de protagonismo.

É justamente na madrugada de 31 de março para 1º de abril de 1964 que os atores Gero Camilo e Victor Mendes ambientam a peça Razão Social, que estreia nesta sexta-feira, 18, no teatro do Sesc Bom Retiro. Na confusão que tomou conta das ruas da cidade naquela fatídica data, o operário Sabino (Gero) e o estudante Jucelino (Victor) se encontram e para fugir da polícia procuram refúgio no Zicartola, o emblemático restaurante do casal Dona Zica (1913-2003) e Cartola (1908-1980), local famoso por reunir boa comida e boa música nas rodas de sambistas capitaneadas pelo compositor e sua mulher.

“O País deixou de ser o mesmo a partir daquele dia. Aquilo mudou o rumo de tudo, inclusive do samba, inclusive da vida de todos nós brasileiros”, comenta Gero.

Motivada pela dramaturgia da dupla, que escreveu e dirige o espetáculo, a cantora Fabiana Cozza aceitou o convite para interpretar Dona Zica. “Como tantas outras mulheres brasileiras, ela foi uma grande guerreira”, afirma Fabiana, que também personifica Clementina de Jesus e Nara leão.

O ator Adolfo Moura, com quem Gero trabalhou no filme Bicho de Sete Cabeças (2001), faz Cartola – com quem guarda incrível semelhança. “Nunca imaginava que eu ia fazer um sambista”, diz ele, que cresceu no interior gaúcho, embalado pela música da fronteira, e, coincidentemente, nasceu em 1964.

Completam o elenco os músicos Everson Pessoa, Gerson da Banda e Nino Miau, experientes sambistas que agora debutam na encenação.

Razão Social une duas paixões dos autores. Do lado de Victor, o samba, e da parte de Gero, a política. “É fácil achar no samba um recorte político, porque ele é resistência”, diz Gero, que, apartidário, desde a adolescência milita em movimentos sociais. “E para mim o Cartola é um Shakespeare. A poética do Shakespeare que me encanta, onde eu a encontro na literatura brasileira é no Cartola.”

A ideia da montagem surgiu no ano passado, quando, na turnê por Portugal do trabalho anterior da Cia. Tertúlia de Acontecimentos (Caminham Nus Empoeirados), Gero presenteou Victor com o livro Desde Que o Samba É Samba, de Paulo Lins, sem nem saberem que 2016 é o centenário do estilo musical.

Ao chegarem à trama que queriam contar, o receio era de que a história ficasse datada. Mas os episódios recentes do cenário nacional os levaram a mudar de opinião. E já no processo de escrita, souberam da ocupação da Alesp e foram se solidarizar com os estudantes. Lá, gravaram um jogral invocado por uma aluna de 16 anos – áudio que deve ser usado na peça. Assim, ao mesmo tempo em que fica a dúvida sobre em qual época o discurso é dito, é feita uma ligação entre passado e presente. “Hoje em dia, a grande força de ação está com os secundaristas”, afirma Victor.

Em tempo: O nome da peça faz referência ao registro oficial do Zicartola, Razão Social: Refeição Caseira Ltda.

RAZÃO SOCIAL

Sesc Bom Retiro. Alameda

Nothmann, 185, tel. 3332-3600.

Estreia 6ª (18), 21h. 6ª e sáb., 21h; dom., 18h. R$ 30. Até 18/12

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.