Na tarde de hoje, Eduardo Pazuello entregou sua defesa ao comando do Exército, por ter participado de um evento político com o presidente Jair Bolsonaro no último domingo, e a defesa é patética.

O ex-antiministro da Saúde mostra, para começar, que seu depoimento na CPI da Pandemia não foi um ponto fora da curva. Ele realmente se tornou um adepto da mentira, dos “fatos alternativos”. Sua defesa sugere que a manifestação política do fim de semana não era  uma manifestação política, mas somente um passeio de moto. E que ela não pode ser considerada uma agenda político-partidária, pelo simples fato de que o presidente não está filiado a nenhum partido.

Pois é, o mundo está vendo maldade onde ela não existe. Será que um general não pode se juntar a uma galera, por acaso toda ela apoiadora de do presidente da República, somente para  curtir a liberdade? Para balançar a cabeleira ao vento?

O mais grave, no entanto, vem depois. Pazuello invoca o artigo 6º do regulamento disciplinar do Exército, que diz o seguinte:

Para efeito deste Regulamento, deve-se, ainda, considerar:

I – honra pessoal: sentimento de dignidade própria, como o apreço e o respeito de que é objeto ou se torna merecedor o militar, perante seus superiores, pares e subordinados;

II – pundonor militar: dever de o militar pautar a sua conduta como a de um profissional correto. Exige dele, em qualquer ocasião, alto padrão de comportamento ético que refletirá no seu desempenho perante a Instituição a que serve e no grau de respeito que lhe é devido; e

III – decoro da classe: valor moral e social da Instituição. Ele representa o conceito social dos militares que a compõem e não subsiste sem esse.

Segundo o general, ele só subiu ao carro de som onde Bolsonaro discursava (mas atenção: era só um passeio de moto!) porque, devido aos laços que mantém com o presidente, não poderia recusar o seu chamado.

Haja pundonor.

Estou fazendo caçoada, mas tudo isso é muito grave. Se o Comando do Exército aceitar essa palhaçada, a regra que proíbe expressamente que militares da ativa se manifestem sobre temas políticos sem autorização prévia de seus superiores (trata-se do item 57 do Anexo I do mesmo regulamento disciplinar) poderá daqui em diante ser contestada a qualquer momento, com base em conceitos vagos como honra e decoro de classe.

Tudo será relativo. Quem vai dizer que o recruta zero não pode discursar em um palanque, preocupado com sua honra pessoal?  Não há força armada que resista a isso.

A única coisa “boa” do episódio é que Pazuello não recorreu ao argumento de que o presidente, como chefe supremo das Forças Armadas, o autorizou a falar no comício. Se usasse esse argumento, o general criaria as condições para uma crise grave: ou Bolsonaro ganharia o direito de chamar qualquer militar da ativa para o seu palanque, ou o comando do Exército teria de traçar limites para a autoridade do presidente. As duas alternativas seriam desastrosas.

O Exército precisa punir Pazuello. Qualquer outra solução vai desmoralizar o seu comando.

Está mais do que na hora, também, que Bolsonaro é desleal com as Forças Armadas. Em vez de preservá-las, faz tudo para pô-las no caminho de armadilhas e do constrangimento.