17/09/2024 - 7:30
As listas de candidatos às prefeituras das capitais em 2024 configuram um quadro distinto de pleitos anteriores e, em alguma medida, do diagnóstico da falta de renovação política feito por analistas e pela sociedade civil em anos pares, quando a população vai às urnas.
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Em algumas dessas cidades, partidos mudaram as estratégias e apostaram em representantes de uma nova geração de seus filiados, preterindo assim caciques tradicionais e “figuras carimbadas” nas disputas municipais.
Os exemplos são encontrados em todos os espectros políticos:
Centro
Amom Mandel é um deputado federal do Cidadania. Na eleição para a prefeitura de Manaus, representa a federação — que também contempla o PSDB — que, nas eleições de 2022, teve Amazonino Mendes (Cidadania, morto em 2023) e Arthur Virgilio Neto (PSDB) disputando governado estadual e Senado. Ostentando um leque de cargos ocupados anteriormente no estado, Virgilio tinha 76 anos na ocasião, e Mendes, 82. Amom tem 23.
No Congresso, encampa bandeiras caras à atuação política contemporânea, como o combate ao desmatamento e a defesa de políticas de tratamento de distúrbios psicológicos e do autismo — ele mesmo é autista.
Deputado federal mais votado do estado em 2022, Mandel se cacifou para a disputa também pelo alto alcance digital — virtude habitualmente relacionada a políticos de direita –, com 324 mil seguidores no Instagram e mais de 1,8 milhão de curtidas no TikTok.
O candidato se coloca na linha dos políticos que não se identificam com nenhum dos espectros políticos na vitrine. “Eu apoio o que é certo, independentemente de ideologias políticas, lados ou torcidas organizadas“, disse em vídeo publicado nas redes sociais. Questionado pelos adversários pela falta de experiência, Amom ficou em segundo lugar em pesquisa Quaest divulgada no fim de agosto, com 17% das intenções de voto.
Direita
André Fernandes tem 26 anos e é uma das esperanças de um bolsonarismo nacionalmente embolado pela inelegibilidade de Jair Bolsonaro (PL) e a baixa disposição de lideranças mais robustas de seu campo político em pleitearem voos mais altos. A projeção passa pelo desempenho na disputa pela prefeitura de Fortaleza.
Deputado federal em primeiro mandato pelo PL, ganhou popularidade nas redes sociais anos antes de Bolsonaro chegar à presidência, publicando conteúdos em defesa do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), em linha similar à então seguida pelo MBL (Movimento Brasil Livre).
Eleito deputado estadual mais jovem do país em 2018, aos 20 anos, migrou para Brasília quatro anos depois com o compromisso de não arredar pé das pautas mais caras a seu campo político. Na pandemia de covid-19, por exemplo, compartilhou notícias falsas com o objetivo de minimizar os riscos da doença — uma das ideias que amplificou a rejeição ao então presidente.
Além disso, ostenta um discurso voraz contra condutas do STF (Supremo Tribunal Federal). Defensor do impeachment do ministro Alexandre de Moraes, é investigado pelo tribunal por suspeita de incitar os atos criminosos de 8 de janeiro de 2023 e tentar abolir o Estado Democrático de Direito.
Nada que o fizesse diminuir o tom nas críticas à atuação dos juízes. A fidelidade rendeu a participação maciça de Bolsonaro em seus atos de campanha e um repasse de R$ 10,7 milhões do PL — valor superior ao destinado a candidatos como JHC, incumbente na disputa pela reeleição em Maceió, por exemplo.
Na pesquisa Datafolha divulgada em 13 de setembro, Fernandes chegou à liderança da corrida para a prefeitura, com 25% da intenções de voto, em empate técnico com Capitão Wagner (União, 23%).
Bruno Engler é, aos 27 anos, um nome forte da direita na Alemg (Assembleia Legislativa de Minas Gerais). ‘Parceiro político’ de um dos principais representantes do bolsonarismo no Congresso, o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG), com quem dividiu materiais de campanha nas eleições de 2022, o candidato se projeta com discursos similares ao do colega de Brasília e também teve Jair Bolsonaro em Belo Horizonte para agendas de sua campanha pela prefeitura.
Embora tenha concorrido nas eleições de 2020 na capital mineira — somou 9,95% dos votos e foi derrotado ainda no primeiro turno por Alexandre Kalil (então no PSD), com 63.36% –, Engler se enquadra na seleção de apostas pela envergadura conquistada desde então. Ao ser reeleito deputado estadual com mais de 635 mil votos em 2022, tornou-se o mais votado da história do cargo em Minas Gerais.
Munido de R$ 14 milhões do PL para fazer campanha, Engler tem mais recursos partidários e tempo de televisão do que oponentes importantes, como o atual prefeito Fuad Noman (PSD), um “paraíso” em relação ao cenário vivido em 2020, quando concorreu pelo PRTB sem verba partidária — o bolsonarismo ainda não havia encontrado abrigo unitário em uma sigla. Em pesquisa Quaest divulgada em 11 de setembro, registrou 16% das intenções de voto e está em terceiro lugar na corrida.
Esquerda
Tabata Amaral tem 30 anos e pode se tornar a prefeita mais jovem eleita em São Paulo, quebrando a marca de Bruno Covas (PSDB, morto em 2021). Deputada federal pelo PSB, ela assegurou na candidatura o reforço da crença do partido em seu potencial político — embora faça parte da base do presidente Lula (PT), a sigla se opôs ao palanque do petista, que apoia Guilherme Boulos (PSOL) no pleito.
Principal nome da agremiação, o vice-presidente Geraldo Alckmin associou seu apoio a Tabata ao “futuro” e à necessidade de “trazer jovens para a vida política”. Na capital paulista, o PSB já preferiu apostar suas fichas no cacique Márcio França (2020), hoje ministro do Empreendedorismo, e na ex-prefeita Luiza Erundina (2004) antes de abraçar um novo quadro.
Eleita deputada em 2018, Tabata foi aluna do RenovaBR, um ‘think tank’ de renovação política que milita pela preparação técnica de candidatos, e é pouco afeita à fidelidade partidária — o voto a favor da reforma previdenciária, em 2019, custou sua expulsão do PDT. Quanto à identificação ideológica, disse em entrevista ao site IstoÉ ter uma “visão progressista” em pautas sociais, “de centro” nas econômicas e estar “acostumada a apanhar da esquerda” no Congresso.
Namorada do prefeito do Recife, João Campos (PSB), ela tem apostado na associação ao político nas redes sociais — dono de boa avaliação à frente da capital pernambucana, Campos se tornou um dos emblemas da ‘nova geração’ de políticos. Em pesquisa Datafolha divulgada em 12 de setembro, Tabata registrou 8% das intenções de voto e ficou na quarta posição, em empate técnico com José Luiz Datena (PSDB).
Natalia Bonavides traz algum frescor a um PT que encara publicamente a dificuldade de formar novas lideranças. Deputada federal mais votada do Rio Grande do Norte em 2022, com 157.549 votos, ela se cacifou para disputar a prefeitura de Natal aos 36 anos.
Em 2016, a parlamentar “cruzou fronteiras” ao ser a primeira mulher eleita vereadora pelo PT na capital potiguar, munida por uma campanha com destaque para o combate ao machismo e à LGBTfobia, pautas que encontram pouca adesão em quadros tradicionais da esquerda — como o próprio presidente Lula.
Na Câmara, integra comissões ligadas às redes sociais e à regulamentação do uso medicinal da cannabis. No petismo, encampa algumas posições contrárias à linha majoritária do partido e mantém proximidade com movimentos sociais.
Ao ter o nome lançado para o pleito, sucedeu as candidaturas de Fernando Mineiro e Jean-Paul Prates (ex-presidente da Petrobras). Poderosos no estado, ambos fracassaram ainda no primeiro turno de seus pleitos e viram o espólio político local se degradar — enquanto Bonavides ganhava projeção.
Mas é justamente em caciques políticos que, até aqui, ela esbarra em Natal: em pesquisa Futura divulgada em 9 de setembro, registrou 20,3% das intenções de voto, na terceira posição, atrás do ex-prefeito Carlos Eduardo (PSD, 31,6%), eleito três vezes para o cargo, e de Paulinho Freire (União, 29,1%), vereador e ex-vice-prefeito com longa trajetória na cidade.