08/09/2021 - 18:34
Por Lisandra Paraguassu e Ricardo Brito
BRASÍLIA (Reuters) – Os ataques e ameaças disparados pelo presidente Jair Bolsonaro nos atos do 7 de Setembro foram o empurrão que faltava para que partidos de diferentes linhas ideológicas decidissem agir unidos, em atos concretos, pelo impeachment, deixando de lado questões eleitorais, ao menos por enquanto.
Já na terça-feira, o conselho político da organização Direitos Já –que une representantes de siglas que vão do PSOL ao DEM– decidiu organizar uma série de atos a partir deste mês que devem culminar em uma grande manifestação contra Bolsonaro no início de outubro. A intenção é unir no mesmo palanques nomes de peso como os ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Fernando Henrique Cardoso em nome do afastamento do presidente.
“Se chegou a um consenso sobre a necessidade de se retirar a questão de candidaturas de dentro do grupo. Cada um pode ter suas preferências, mas devem ser retiradas da discussão nesse momento”, disse à Reuters o ex-ministro Tarso Genro, um dos representantes do PT no grupo. “A ideia é termos um bloco político e social amplo, sem demarcação ideológica, mas integrado a uma defesa da República e da democracia.”
Em dois discursos a seus apoiadores na terça-feira, Bolsonaro aumentou mais uma vez o tom, fez ameaças a ministros do Supremo Tribunal Federal e às eleições de 2022, disse que não cumprirá decisões do ministro do STF Alexandre de Moraes e que só sairá do cargo preso ou morto.
O radicalismo e as ameaças à democracia feitas pelo presidente fizeram com que diversos partidos aumentassem o tom e passassem a falar abertamente em impeachment, como o PSD e o PSDB.
“Essa discussão (sobre impeachment) está tomando corpo, tomando uma proporção que há uma semana a gente não imaginava. Os partidos ainda não tinham se envolvido, acho que essa é a próxima etapa. Acho que vai ser um efeito manada”, disse o deputado Bozzella Júnior (PSL-SP), que é da ala não bolsonarista do partido.
O senador José Aníbal (SP), ex-presidente do PSDB, disse que, embora as manifestações da véspera não tenham tido o tamanho esperado pelos organizadores, é preciso ter ação.
“As coisas mudaram e tem que sinalizar fortemente com essa questão do impeachment”, disse o tucano, que faria a cobrança na bancada do PSDB pelo apoio ao impedimento do presidente.
“Ele (Bolsonaro) deu um passo claro que está disposto a romper o equilíbrio das instituições ao confrontar, o que é gravíssimo”, reforçou.
Para o tucano, o país não vai aguentar ficar mais um ano e quatro meses nessa situação de confronto em meio a uma crise dramática com aumento da fome e da pobreza e é preciso agir.
A intenção agora é tirar o aspecto partidário das ações e atos contra o presidente para conseguir unir todos os partidos que hoje estão na organização. Até agora, apesar de coincidirem na defesa da democracia, os atos acabavam se dividindo entre aquelas chamados de centro-esquerda e de centro-direita.
Nos últimos dias, inclusive, enquanto PT, PSOL e PCdoB queriam manifestações também no dia 7 –dentro do tradicional Grito dos Excluídos–, o MBL chamou uma manifestação para o dia 12 que acabou alienando a esquerda por ter como mote “Nem Bolsonaro, nem Lula”.
“As conversas avançaram bastante, estamos dirimindo conflitos, o dia 12 já deve ter mais adesão”, disse Bozella.
As centrais sindicais, que tinham decidido ficar de fora, avisaram agora que irão participar do dia 12. Da mesma forma, PDT, PSOL e PCdoB devem se juntar à manifestação.
A intenção, no entanto, é preparar uma grande manifestação para o início de outubro. De acordo com o coordenador dos Direitos Já, Fernando Guimarães, há um consenso no conselho político de agir em conjunto e tirar do ar as questões eleitorais.
“Tivemos participação de amplos campos e o consenso unânime é que precisamos ter uma agenda política que unifique. Não é momento para disputa de protagonismo, de cada um colocar suas pautas. É o momento de termos agendas que se somam”, explicou Guimarães.
A intenção é agora que os representantes trabalhem dentro dos partidos a ideia de ações conjuntas a favor do impeachment de Bolsonaro para culminar com o ato em outubro. As ações começam com um ato presencial com lideranças de vários partidos no dia 15 de setembro e, a partir daí, outras ações ao longo do mês, até a manifestação em outubro.
Desde a terça-feira, diversos partidos já começaram conversas sobre adotar oficialmente a postura a favor do impeachment, caso do PSDB e do PSD.
“O presidente Gilberto Kassab já sinalizou nesse sentido e vários partidos estão muito uníssonos em relação a isso. Vamos trabalhar juntos em uma série de ações para responder aos crimes que o presidente está cometendo”, disse à Reuters Ricardo Patah, presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT) e filiado ao PSD.
CAMINHO LONGO
Reservadamente, uma fonte ligada a um partido do centrão disse que, apesar de um aumento da pressão para cobrar o impeachment de Bolsonaro, parte das bancadas do PSDB, MDB, PP e PL têm se beneficiado por apoiar a agenda do governo no Congresso, conseguindo, em troca, acesso a recursos por meio de emendas parlamentares e obras em seus redutos eleitorais.
Na avaliação dessa fonte, por ora não há condições para que esses parlamentares deixem de apoiar Bolsonaro e cobrem o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), a acatar um pedido de impeachment do chefe do Executivo.
Além disso, dirigentes e lideranças de partidos ainda não fecharam um roteiro do impeachment. Há quem sequer tenha debatido o assunto à luz do 7 de Setembro.
O presidente do PSL, deputado Luciano Bivar (PE), disse à Reuters ter conversado no feriado com o presidente do DEM, ACM Neto, sobre as manifestações e os discursos do presidente.
A avaliação deles, segundo o presidente do PSL, é que as falas foram preocupantes e, por isso, era preciso prestar solidariedade ao STF. Foi nesse contexto que decidiram divulgar uma nota conjunta de repúdio com “veemência” da fala de Bolsonaro de se insurgir contra as instituições e cobraram um basta nas tensões políticas.
Bivar afirmou que não conversou com ACM Neto sobre um eventual pedido de impeachment de Bolsonaro. “Não conversei com a bancada sobre isso e não considerei nada disso ontem (terça)”, disse ele, citando que a conversa girou em torno das insurgências contra instituições no país.
O presidente do PSL, partido pelo qual Bolsonaro foi eleito em 2018, está fora do país e deve retornar em breve para discutir esse assunto com aliados.