O Parlamento Europeu se viu obrigado, nesta segunda-feira (12), a reagir com firmeza após a prisão da eurodeputada grega Eva Kaili, uma de suas vice-presidentes, acusada de corrupção no âmbito de um caso ligado ao Catar.

Kaili e outras três pessoas foram presas em Bruxelas no domingo (11), dois dias depois de serem detidas como parte de uma investigação sobre pagamentos em dinheiro supostamente feitos pelo país-sede da Copa do Mundo-2022 para influenciar a política europeia.

“Estas denúncias são extremamente preocupantes. É uma questão de confiança nas pessoas no seio das nossas instituições”, reagiu a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, lembrando ter proposto a criação de uma “autoridade independente” para tratar questões éticas.

A presidente do Parlamento Europeu, a maltesa Roberta Metsola, vai discursar às 13h00 (Brasília), na abertura da sessão plenária mensal que reúne todos os eurodeputados em Estrasburgo (França).

Uma reunião dos presidentes de grupos políticos foi convocada para discutir esta investigação judicial belga revelada na sexta-feira, segundo duas fontes do Parlamento Europeu.

Eva Kaili não beneficiou da sua imunidade parlamentar por ter sido pega “em flagrante delito”, explicou uma fonte judicial belga, especificando que foram descobertos “sacos de notas” no apartamento da socialista grega.

A Justiça deverá decidir sobre a continuidade de sua detenção, assim como das outras três pessoas, em até cinco dias.

– “Autoridade independente” –

Doha negou estar envolvido em tentativas de corrupção. “Qualquer alegação de má conduta por parte do Estado do Catar é uma desinformação grave”, comentou um funcionário do governo do Catar no sábado.

De qualquer modo, o Parlamento Europeu está abalado.

“Teremos de reforçar urgentemente a nossa instituição para lutar contra o veneno da corrupção”, reclamou a eurodeputada francesa Aurore Lalucq, membro da segunda maior bancada do Parlamento, Socialistas e Democratas (S&D, esquerda), da qual Eva Kaili foi suspensa.

A agenda desta última sessão plenária de 2022 corre o risco de ser ocupada pelo escândalo e o debate de quarta-feira sobre “a defesa das democracias contra a ingerência estrangeira” promete ser agitado.

Diante o “pior escândalo de corrupção da história” do Parlamento Europeu, a eurodeputada francesa Manon Aubry (França Insubmissa), da bancada da esquerda radical, “exigiu a destituição da vice-presidente, a organização de um debate com resolução e a abertura imediata de uma comissão de inquérito sobre as omissões do Parlamento neste caso”.

“Este é um incidente que deve ser elucidado de forma inequívoca e com todo o rigor da lei”, reagiu a ministra alemã das Relações Exteriores, Annalena Baerbock.

A chefe da diplomacia francesa, Catherine Colonna, também desejou que “toda a luz seja lançada” sobre este caso “que parece ser particularmente grave”.

Ex-apresentadora de televisão de 44 anos, Eva Kaili, eurodeputada desde 2014 e eleita em janeiro de 2022 para uma das vice-presidências do Parlamento Europeu, viajou ao Catar no início de novembro onde elogiou, na presença do ministro do Trabalho do emirado, as reformas realizadas neste âmbito.

A organização da Copa do Mundo pelo Catar testemunha a “transformação histórica de um país cujas reformas inspiraram o mundo árabe”, comentou Kaili no dia 21 de novembro na tribuna do Parlamento.

– Bens congelados –

Eva Kaili foi excluída na sexta-feira do partido socialista grego (Pasok-Kinal), do qual já era uma figura controversa, e teve seus bens congelados nesta segunda pela Autoridade Grega de Combate à Lavagem de Dinheiro.

O Parlamento Europeu tem catorze vice-presidentes de diferentes grupos políticos.

Kaili perdeu todas as suas funções como vice-presidente no sábado, inclusive a de representar o Parlamento na região do Oriente Médio.

Em caso de “falta grave”, os dirigentes dos grupos políticos podem, por maioria de três quintos, propor ao Parlamento Europeu o fim do cargo de vice-presidente. Os deputados devem então votar nesta proposta com uma maioria de dois terços dos votos expressos.

Em 2011, o Parlamento Europeu foi abalado por outro escândalo quando três eurodeputados e ex-ministros – romeno, austríaco e esloveno – foram gravados por jornalistas do Sunday Times se passando por lobistas. Eles concordaram então em apresentar emendas a projetos de lei, em particular no setor bancário, a troco de pagamentos de até 100 mil euros.

Todos os três foram condenados a penas que variaram de dois anos e meio a quatro anos de prisão.