Parisienses foram consultados sobre aumento radical das taxas de estacionamento para veículos utilitários – até 225 euros por seis horas. Motivação é ambiental e urbanística. Mas há quem tema banimento total dos carros.

A imagem estilizada do automóvel vermelho contra um fundo preto dá, de fato, uma impressão ameaçadora. E a pergunta que estampa os pôsteres ao longo das ruas da capital francesa, antecipando o referendo deste domingo (04/02), é retórica, porém direta: “Você quer mais SUVs nas ruas de Paris, ou menos?”

A prefeita Anne Hidalgo aposta que maioria dos 1,3 milhão de cidadãos com direito a voto marcará a segunda opção. “Quanto maior, mais dano ambiental”: assim a política de centro-esquerda resume sua opinião sobre carros. É em torno dessa premissa que, nos últimos anos, ela tem remodelado Paris radicalmente.

Sua intenção é tornar a metrópole mais acolhedora, do ponto de vista ambiental, e melhorar a qualidade de vida. E menciona estudos mostrando que mais da metade dos parisienses respira ar de má qualidade.

Para tornar Paris “mais verde”, Hidalgo já declarou as margens do rio Sena zona de pedestres, apesar de uma enorme resistência; fechou ao tráfego a principal artéria do centro histórico, a rue de Rivoli; e introduziu a velocidade máxima a 30 quilômetros por hora, em toda a cidade. Além disso, também removeu estacionamentos e criou novas ciclovias. Até 2026 ela quer uma Paris 100% adequada às bicicletas.

225 euros por seis horas de estacionamento

Um dos principais alvos da prefeita são os veículos utilitários esportivos (SUVs). Das cédulas do atual referendo não consta uma proibição explícita, mas sim preços altos de estacionamento como recurso dissuasório para os proprietários. Os cidadãos decidirão “contra ou a favor da introdução de uma tarifa para estacionar veículos pesados, volumosos e hostis ao meio ambiente”.

Se a proposta da política socialista passar, para os carros com motores de combustão ou híbridos plug-in (alimentados pela rede elétrica) pesando mais de 1,6 toneladas (2 toneladas para os elétricos), o preço do estacionamento na Paris central triplicará par 18 euros por hora. Seis horas no núcleo da capital custarão 225 euros aos donos de SUVs.

Nos bairros mais afastados, a primeira hora é um pouco mais barata, 12 euros. Está prevista também uma série de exceções à nova regra, a qual não afetaria os residentes da capital, taxistas estacionando nas faixas especiais, comerciantes em zonas permitidas, e profissionais de saúde.

Associações ambientalistas apoiam a campanha de Hidalgo, ressaltando as altas emissões carbônicas desses veículos pesados, assim como uso dos espaços públicos questões de segurança no trânsito: segundo as autoridades municipais, SUVs são duas vezes mais fatais para pedestres do que carros normais.

E elas argumentam: “O voto visa enviar uma mensagem aos fabricantes automobilísticos e sua ganância de lucros. O fato de intencionalmente venderem veículos cada vez maiores, com maior consumo de combustível e caros, sabota a transição verde.”

Tempos sombrios aguardam os automobilistas

A associação de proprietários de automóveis da França 40 Millions d’Automobilistes rechaça a iniciativa. Sua petição online “Parem com a luta contra os SUVs” visa mobilizar contra o projeto cujo impacto pode ir muito além da capital. Políticos de cidades como Lyon, Bordeaux e Grenoble já estão discutindo taxas de estacionamento mais altas para veículos de grande porte.

Assim como em outros países, os SUVs são especialmente populares na França. Segundo a 40 Millions, eles representaram a metade dos novos registros no primeiro semestre de 2023. Além disso, este seria apenas o começo de uma guerra de extermínio: “A ideia é erradicar inteiramente os carros”, afirma a associação.

Os temores da associação de automobilistas talvez não estejam tão longe da realidade. Caso Hidalgo tenha êxito em introduzir taxas de estacionamento mais altas, é possível que novas restrições aguardem os proprietários.

Paris planeja banir a partir do início de 2025 os veículos a diesel fabricados antes de 2011. Por outro lado – demonstrando a dificuldade de impor proibições que afetem a indústria automobilística – esse regulamento deveria entrar em vigor já neste janeiro, porém a prefeitura não conseguiu fazê-lo passar.

Desde que Hidalgo assumiu o cargo, em 2014, uma política ambiental ousada tem caracterizado sua gestão. “Atualmente nos encontramos em meio a um processo de mudança. E o mais difícil nesta fase é que precisamos mudar nossos hábitos”, explicou numa entrevista televisiva, alguns anos atrás.

Apesar de, em sua desafortunada candidatura presidencial, dois anos atrás, ela só ter obtido menos de 2% dos votos, a estratégia tem beneficiado a política do Partido Socialista (PS), de centro-esquerda no nível local. Nas eleições presidenciais de 2020 sua coalizão rubro-verde deixou a concorrência para trás com facilidade.

Depois dos Jogos Olímpicos 2024, marcados para julho, o limite de velocidade do movimentado Boulevard Périphérique, que circunda a capital francesa, será reduzido dos atuais 70 quilômetros para 50 quilômetros por hora. Mais um sinal de que, independente do resultado das urnas neste domingo, os motoristas parisienses podem ir se habituando a ter cada vez menos espaço de manobra.