Paris dá mais um passo para se tornar uma cidade sem carros

Após investir contra SUVs, capital francesa agora quer banir automóveis de 500 ruas, que serão transformadas em zonas para pedestres. Iniciativa busca tornar cidade menos poluída e mais segura.Os habitantes de Paris aprovaram mais uma iniciativa para desincentivar o uso de carros na cidade. Após proibir aplicativos de patinete elétrico e triplicar a cobrança de estacionamento para veículos do tipo SUV, a capital francesa pretende agora banir completamente automóveis de 500 ruas, que serão arborizadas e transformadas em zonas para pedestres.

A medida, que faz parte dos esforços da administração municipal para melhorar a qualidade do ar e tornar a cidade mais agradável e segura para pedestres, foi aprovada em referendo popular por praticamente dois em cada três cidadãos da capital francesa que compareceram à votação neste domingo (23/03).

Com o apoio popular, a prefeitura pretende fechar para carros cerca de 25 ruas em cada um dos 20 arrondissements (distritos). Atualmente, automóveis já não podem circular em cerca de 220 ruas. Com isso, uma em cada dez ruas de Paris deverá ser de uso exclusivo de pedestres. Os endereços ainda serão definidos posteriormente, em consultas com a população.

A decisão deve implicar ainda na perda de até 10 mil vagas de estacionamento na capital francesa ao longo dos próximos anos. Esse número se soma às outras 10 mil já eliminadas desde 2020.

Dados da prefeitura apontam que o trânsito na região caiu mais da metade desde 2001, quando os socialistas, atualmente liderados pela prefeita Anne Hidalgo, ascenderam ao poder. Na Paris central, apenas um em cada três domicílios dispõe de um carro. Nos subúrbios, onde vivem 10 milhões de pessoas e a rede de transporte público é menor, essa proporção é de dois para cada três.

Cidade Luz mais verde

Hidalgo, que comanda Paris desde 2014, foi reeleita em 2020 sob a promessa de mudar radicalmente a cidade, adaptando-a à era das mudanças climáticas, reduzindo o volume de carros nas ruas e incentivando uma outra forma de convivência entre seus moradores.

Entusiasta do conceito da "cidade de 15 minutos", Hidalgo teve como seu primeiro projeto a transformação das margens do rio Sena numa zona de pedestres. Apesar de ter enfrentado resistência, as pistas são hoje usadas por ciclistas, corredores e festeiros.

No centro histórico no entorno do Museu do Louvre, foi implantada uma zona de tráfego limitado, acessível a carros apenas de moradores, prestadores de serviço, táxis e ônibus.

Para tornar Paris "mais verde", Hidalgo também limitou a velocidade máxima a 30 quilômetros por hora, em toda a cidade; removeu vagas de estacionamentos; e criou 84 quilômetros de ciclovias desde 2020. Até 2026 ela quer uma cidade 100% adequada às bicicletas.

Um estudo do Institut Paris Région publicado em abril de 2024 constatou que o carro era usado dentro da capital em apenas 4,3% dos deslocamentos, ficando atrás da bicicleta (11,2%). Na maioria dos casos, o instituto público constatou que as jornadas eram feitas a pé (53,5%) ou por transporte público (30%).

Outra medida adotada por Hidalgo foi a redução para 50 quilômetros por hora do limite de velocidade no anel rodoviário Boulevard Périphérique, que circunda a cidade.

Apesar das mudanças recentes, a metrópole francesa ainda está atrás de outras capitais europeias em termos de infraestrutura verde – medição que inclui jardins privados, parques, ruas ladeadas por árvores, cursos e corpos d'água e pântanos. Enquanto essas áreas respondem por 26% do território de Paris, a média das capitais europeias é de 41%, segundo a Agência Ambiental Europeia.

Referendos com baixa taxa de participação popular

Apenas 4% dos quase 1,4 milhão de eleitores parisienses participaram do referendo deste domingo. Taxas de participação igualmente baixas foram registradas no referendo de 2023, que baniu os patinetes elétricos compartilhados (7,5%), e em 2024, quando foram triplicadas as taxas de estacionamento para veículos do tipo SUV (5,7%).

No último caso, o preço do estacionamento nas ruas da Paris central passou a 18 euros por hora para carros com motores de combustão ou híbridos que pesem mais de 1,6 toneladas (2 toneladas para os elétricos). Se o carro ficar parado por seis horas no núcleo da capital, contudo, a conta fica bem mais salgada: 225 euros.

A medida – que prevê exceções para moradores, comerciantes, profissionais de saúde e taxistas – visa desestimular o trânsito de SUVs na capital. Além de emitirem mais poluentes e ocuparem mais espaço nas ruas majoritariamente estreitas de Paris, esses veículos são considerados mais perigosos para pedestres do que carros normais.

No caso dos patinetes elétricos de aplicativo, pesou na decisão de bani-los a irritação de moradores e pedestres com a imprudência de alguns condutores e a obstrução de calçadas e ruas.

ra/cn (Reuters, dpa, ots)