José Pascual achou que o fim do mundo havia chegado quando sua cidade foi arrasada por uma avalanche de lama com rejeitos químicos resultante da ruptura das barragens da Samarco há um ano. E, de certo modo, tinha razão.

Desde aquele desastre em uma exploração de minério de ferro em Mariana, Minas Gerais, a companhia Samarco e suas proprietárias – a brasileira Vale e a anglo-australiana BHP Billiton – prometem uma reconstrução, ao menos material, que demora a chegar.

Mas Paracatu de Baixo, subdistrito de Mariana que foi destruído com o rompimento da Barragem de Fundão, está irremediavelmente perdido, e a vida de Pascual, de 76 anos, nunca mais será a mesma.

A tragédia ocorreu na tarde de 5 de novembro de 2015, quando a barragem de rejeitos de minério de ferro rompeu sem aviso prévio a cerca de 27 quilômetros de um pequeno rio de Paracatu, afluente do São Francisco.

Cerca de 32 milhões de metros cúbicos de lama arrasaram o local, matando 19 pessoas e soterrando tudo que encontrava pelo caminho, começando pelo distrito vizinho de Bento Rodrigues.

Em Paracatu, um helicóptero chegou a tempo de alertar os habitantes.

“Eu estava no jardim e minha esposa estava pendurando as roupas para secar quando eles vieram”, recordou Pascual, um homem magro e forte. “Eles disseram: ‘Saiam daqui!'”

Correndo com o resto dos vizinhos para uma colina, Pascual ouviu o desastre antes de vê-lo.

“Era o barulho de um trem descontrolado. Depois olhamos para o que estava vindo”, disse. “Era da cor do barro, não havia nem água, apenas barro vindo, e esse vento forte”, conta o sobrevivente.

A avalanche de lama soterrou pomares, casas, estradas, carros, animais, árvores. “Era como o fim do mundo”, disse Pascual. “As luzes se apagaram”.

Com a lama até o pescoço

Pascual e sua esposa não apenas se salvaram. Sua casa e seu terreno, situados em uma pequena elevação, foram preservados. Seus 12 filhos já viviam em outras localidades.

Mas Paracatu foi destruído. Um ano depois, a lama ainda obstrui a rua principal, se acumula em casas sem teto e mancha as paredes da igreja arruinada.

Pascual não é um homem que se resigna facilmente. Ainda lembra que atravessou a lama para voltar para casa e recuperar os documentos de sua esposa. A lama “chegava até aqui”, conta, apontando para o próprio pescoço.

Até hoje consegue cultivar mandioca, cebolas, tomates e milho. Sem dinheiro e sempre inventivo, ele planta seu próprio tabaco, que enrola em folhas de milho secas.

Mas o fim é inexorável.

A Samarco prometeu construir um novo Paracatu em outro lugar, com casas similares às que os habitantes perderam. A maioria aceitou a proposta, embora isso signifique abandonar a terra onde suas famílias viveram durante gerações.

Pascual é um deles. Sua casa e seus cultivos se salvaram, mas as perdas são incontáveis.

O rio onde costumava pescar ficou vermelho pelos rejeitos de minério. Suas duas melhores vacas morreram e sua produção de queijo minas depende agora de duas esquálidas sobreviventes que pastam entre ruínas. Sua renda diminuiu 75%.

A Samarco diz que a nova Paracatu estará pronta em março de 2019.

Enquanto isso, Pascual se ocupa sozinho da sua horta, e nos finais de semana visita sua esposa, que se instalou a uma hora de viagem de lá.

Na cidade arruinada, leva uma vida solitária, às vezes assustada. “De vez em quando passo a noite acordado. Qualquer barulho me desperta”, conta.

Mesmo que decidisse ficar, sabe que o povoado nunca recuperará sua antiga vida comunitária.

“Nós terminamos sem nenhum bar onde você pode ir para tomar uma bebida que seja”, lamenta. “Sim, quero ir embora”.