Após a polêmica provocada por “Okja”, filme da Netflix selecionado em 2017, o diretor sul-coreano Bong Joon-ho volta a Cannes como sério candidato à Palma de Ouro com “Parasite”, um drama familiar magistral tingido de thriller, que retrata a violência das desigualdades sociais com grande domínio formal.

Apresentado na terça-feira à noite – e calorosamente aplaudido – “Parasite” conta a história de uma família de desempregados, a de Ki-taek (interpretado por Song Kang-ho), que vivem em um escuro e sórdido apartamento no subsolo, onde convivem com baratas.

A vida de Ki-taek, de sua esposa e dois filhos muda quando o seu filho Ki-Woo consegue um emprego como professor particular de inglês de uma jovem de família rica, os Park, que vivem numa casa suntuosa com jardim, grandes janelas e decoração de bom gosto.

A família de Ki-taek rapidamente se aproveita da situação: por meio de subterfúgios, Ki-Woo faz sua irmã ser contratada para dar aulas de desenho ao filho mais novo, depois seus pais como motorista e governanta.

Mas, se tudo parece correr bem para a família de golpistas, a chegada dos “parasitas” à família Park marcará o início de uma engrenagem incontrolável.

Com a história, Bong Joon-ho, de 49 anos, deixa para trás o universo fantástico e os grandes orçamentos internacionais de seus dois últimos filmes, “Expresso do Amanhã” e “Okja”, filme que gerou polêmica em Cannes sobre a possibilidade ou não de filmes da Netflix competirem na mostra oficial.

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O diretor opta por um enfoque muito mais íntimo, com uma alta dose de suspense. Por sinal, ele escreveu uma carta implorando aos críticos que não revelassem uma parte importante da história de seu filme.

Conhecido por suas sátiras da sociedade sul-coreana, de “Memórias de um Assassino” a “O Hospedeiro”, Bong Joon-ho aumenta sua propensão a retratar a violência das relações sociais em um mundo onde as desigualdades se amplificam, apoiando-se novamente no filme de gênero para melhor transmitir sua mensagem.

– “Filme escada” –

“Eu faço, efetivamente, filmes de gênero, mas não de uma maneira clássica. Tento transcrever mensagens sobre a sociedade quebrando códigos”, disse Bong Joon-ho em entrevista coletiva nesta quarta-feira.

“Desde os anos 2000, tem havido na Coreia do Sul uma grande evolução nos filmes de gênero, sem que tenhamos que seguir os códigos americanos. E temos imprimido nossa marca para contar histórias que são reflexões de temas sociais ou políticos. Hoje tenho dificuldade em imaginar que não existam tais mensagens nos filmes sul-coreanos. Esse aspecto tornou-se nossa especificidade”, acrescentou.

“Parasite”, qualificado como “filme escada” por seu autor, “descreve o que acontece quando duas classes se esbarram nessa sociedade cada vez mais polarizada”, também contém o que faz o tempero do cineasta sul-coreano, ou seja, sua capacidade desde “Memórias de um Assassino” de fazer da violência e do humor mais do que meros artifícios na tela.

“Minha experiência neste filme foi bastante semelhante a de ‘Memórias de um Assassino’, porque o filme mostra detalhes íntimos, com um evento misterioso”, disse à AFP Song Kan-ho, grande ator do cinema coreano.

Para aquele que é dirigido pela quarta vez pelo cineasta, Bong Joon-ho “sempre tem uma visão afiada o suficiente para radiografar a sociedade sul-coreana. Isso é sentido em todos os seus filmes há 20 anos e é também por isso que seu talento é reconhecido. Em ‘Parasite’, percebemos a sua evolução como cineasta, mas também, através dele, do cinema sul-coreano”.


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