Só daqui a seis meses realizaremos eleições, mas no Congresso o clima de campanha começou mais cedo e o ritmo do trabalho dos parlamentares está lento desde já. Pautas polêmicas vêm sendo deixadas de lado, assim como as discussões sobre reformas consideradas essenciais para o desenvolvimento do País, como é o caso da Tributária e a Administrativa. A preocupação da grande maioria dos deputados e senadores passou a ser a disputa eleitoral e como angariar votos para a reeleição. E essa leniência parte inclusive dos que dirigem as Casas Legislativas. Na Câmara, o presidente da entidade, Arthur Lira, prefere passar a maior parte do tempo em atividades em Alagoas, seu estado natal, e onde ele trabalha para se reeleger como deputado. Lá, participa de inaugurações e cuida de destinar grande parte dos recursos do orçamento secreto, que ele controla no Congresso, para destinar verbas milionárias a prefeitos amigos do interior alagoano. Só do FNDE, Lira conseguiu R$ 100 milhões de 2001 a abril deste ano.

CAÇA AOS VOTOS O deputado Arthur Lira prefere inaugurar obras em Alagoas, na busca por votos para a reeleição, do que colocar a Câmara para funcionar (Crédito:Divulgação)

Até o início da semana passada, a Câmara e o Senado permitiam o registro de presença por um aplicativo e o parlamentar podia votar de onde bem entendesse, sem precisar estar em Brasília. Mas essa facilidade vai acabar pelo menos na Câmara, onde, a partir desta semana, os deputados poderão continuar votando pelo aplicativo, desde que já tenham marcado presença física no plenário. Ou seja, dessa forma, o Parlamento vai funcionar pelo menos até meados de junho quando o esvaziamento atingirá o ponto máximo. No Senado, as sessões continuam semipresenciais e os senadores podem votar mesmo que não estejam em Brasília. Só não se sabe até quando. Por enquanto, os senadores podem continuar visitando seus currais eleitorais à vontade.

Sendo assim, em tese, pelo menos até o resultado das eleições deste ano, novos projetos e novas reformas estão fora de cogitação. E não apenas aqueles de interesse da oposição, mas os que interessam ao governo também, como o projeto que flexibiliza o porte e a posse de arma de fogo no Brasil, que foi derrubado numa sessão recente na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. A votação da Reforma Tributária também foi derrubada na mesma sessão. Já a oposição amargou derrota quando, há poucos dias, na Câmara, foi rejeitado o requerimento de urgência que acelerava a tramitação do projeto das fake news. A proposta não passou por oito votos. A oposição obteve 249 votos quando eram necessários 257.

O que se passa é que, desde o início de 2022, a Câmara realizou 171 horas de debates e votações. Foram votadas um total de 59 matérias e apenas duas foram rejeitadas, sendo 35 projetos de lei, nove projetos de decretos legislativos, sete propostas de emenda constitucional, cinco medidas provisórias e três indicações. No Senado, foram 36 sessões plenárias, 93 matérias apreciadas, 75 aprovadas, duas rejeitadas e 14 prejudicadas ou retiradas de pauta. Mas nada de votações de pautas polêmicas.

Para Graziella Testa, professora da Escola de Políticas Públicas e Governo da FGV, esse movimento é comum em ano de eleição, quando dificilmente pautas muito amplas e, sobretudo, temas que gerem grandes discordâncias são votadas. “Na forma como o nosso presidencialismo de coalisão se organiza, a maior parte dessas pautas que são muito amplas, como reformas que atingem diferentes grupos de variadas maneiras, de modo geral elas são capitaneadas pelo Executivo”. Ou seja, o Executivo toma à frente e o Legislativo faz modificações, responde ao Executivo, mas é o governo que costuma ter o protagonismo. Talvez a grande exceção tenha sido a Reforma da Previdência, onde o Executivo não teve esse protagonismo. Mas isso foi no início do governo.

O que se ouve nos corredores do Congresso esvaziado é que talvez não seja prejudicial deixar de votar questões importantes em anos de eleição. Fontes ouvidas pela reportagem consideram que pode ser mais benéfico que essas questões mais polêmicas sejam melhor avaliadas e votadas em outro momento mais adequado, sem a radicalização do período eleitoral. Pior do que não haver reformas é haver reformas mal feitas.