Seis em cada dez brasileiros esquecem em quem votaram para a Câmara e o Senado. Mas não precisa ser assim: especialistas dão dicas para um voto consciente ao Legislativo, e plataformas ajudam a encontrar candidatos.Quando os eleitores forem às urnas em 2 de outubro, depositarão cinco votos na urna eletrônica, nesta ordem: deputado federal, deputado estadual, senador, governador e presidente.

Quando se trata da campanha à Presidência e aos governos estaduais, quem está indeciso tem à mão vários recursos para ajudar a decidir o voto: debates, entrevistas no horário nobre da televisão, pesquisas, propaganda eleitoral, farto noticiário, redes sociais – é impossível ficar alheio ao tema diante de tanta informação.

Mas quando o assunto é o Legislativo, a coisa muda de figura: dada a grande quantidade de postulantes aos cargos – mais de duas centenas ao Senado, outros 10,5 mil à Câmara e 16,6 mil ao Legislativo estadual –, os debates e as entrevistas aprofundadas tornam-se praticamente inviáveis; pesquisas, que têm custos altos, também ficam em segundo plano. Restam ao eleitor o horário eleitoral e a internet.

A disputa à Câmara tornou-se especialmente acirrada neste ano – são 2 mil candidaturas a mais do que em 2018, e o dobro das 5,2 mil registradas em 2006. A Casa vem se tornando mais visada nos últimos anos com o fim das coligações partidárias e as novas regras de distribuição do fundão eleitoral, cujos repasses aumentam conforme o tamanho das bancadas eleitas.

"As eleições proporcionais não têm a mesma atenção dos eleitores brasileiros que as eleições majoritárias. As pessoas costumam se posicionar e debater, por exemplo, sobre o desempenho dos candidatos ao cargo da Presidência da República, mas não sabem quem concorre à Câmara pelos seus estados", observa Irina Bullara, diretora executiva da escola de formação política RenovaBR.

Bullara frisa, contudo, que a culpa não é do eleitor, mas que deixar para decidir o voto em cima da hora é arriscado e pode implicar escolhas ruins. "O grande problema é que o sistema é complexo, difícil de entender e, infelizmente, é estruturado para que as pessoas não participem, não se envolvam."

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A esse cenário soma-se a amnésia eleitoral, quando o eleitor esquece em quem votou. O fenômeno é mais frequente nos votos ao Legislativo. Segundo pesquisa do Centro de Estudos e Opinião Pública (Cesop) da Unicamp, acometeu 44% dos brasileiros em 2018, que não conseguiram se lembrar em quem votaram para deputado federal menos de um mês após as eleições.

Outra pesquisa, do Datafolha, constatou uma amnésia ainda pior passados quase quatro anos desde as últimas eleições gerais: de cada dez eleitores, seis não se lembravam em quem votaram para a Câmara e o Senado.

O Legislativo é um poder tão importante quanto o Executivo – presidentes e governadores dependem de uma base de apoio parlamentar para governar e são fiscalizados por esses mesmos parlamentares. Sob o presidente Jair Bolsonaro, o Congresso barrou mais de uma centena de pedidos de impeachment do líder do Executivo e ampliou seu poder com o orçamento secreto.

O que levar em conta na hora de decidir o voto

"O importante é identificar primeiro as pautas que a gente considera importantes e quer fortalecer. Por exemplo: se você entende a importância de ampliar os direitos das mulheres, é escolher pessoas que tenham uma agenda voltada para isso", recomenda Beatriz Della Costa, do Instituto Update. "O que é mais importante para você agora? Acho que um voto consciente passa por essa reflexão."

Della Costa afirma que é preciso ainda ficar de olho no partido e alianças às quais a candidatura está ligada, bem como seu alinhamento político em relação aos governos estaduais e federal – apesar do fim das coligações, as siglas ainda podem unir forças numa federação partidária, que implica atuação programática conjunta pelo próximos quatro anos.

"Se você vota num candidato que tem uma projeção grande, com certeza ele vai ajudar a eleger mais alguns outros. Qual é o grupo de que esse candidato faz parte? Quem são essas outras pessoas?"

Ela aconselha ainda considerar as propostas e trajetória da candidata ou candidato e a esfera em que essa pessoa irá atuar. Se para as assembleias estaduais a lógica é regional, no Congresso "a visão é mais macro".

Como exemplo, Della Costa cita o estado de São Paulo, onde vive, distante centenas de quilômetros da Amazônia, mas impactado pelo que acontece na floresta.

"Se aquela pessoa tem uma pauta do meio ambiente, sendo deputada federal ela pode, sim, fazer legislações para a proteção da Amazônia ou de contenção de um desmatamento que não necessariamente está acontecendo no nosso estado", afirma a cientista social.

Já Bullara, do RenovaBR, recomenda ainda a eleitores que pesquisem sempre a respeito daqueles em quem pretendem depositar suas esperanças. "O seu candidato é ético e ficha limpa? Ele se preparou para exercer o cargo político, ele tem uma qualificação?"


Plataformas ajudam a encontrar e avaliar candidatos

Baseadas em uma agenda comum de compromissos e valores, algumas iniciativas oferecem ajuda a quem ainda está à procura de um representante nos parlamentos.

O Quilombo nos Parlamentos, por exemplo, lista uma série de candidaturas negras comprometidas com uma agenda de desenvolvimento antirracista. Também no campo progressista, o Meu Voto Será Feminista lista candidaturas de mulheres aliadas à causa e a Campanha Indígena, de pessoas ligadas ao movimento indígena.

Já o VoteLGBT reúne candidaturas de diversos espectros políticos e tem como elo comum o respeito à diversidade sexual e de gênero. Outra iniciativa suprapartidária, o RenovaBR, atua na formação de lideranças políticas e divulga sua própria lista de candidatos sob o mote da renovação dos ambientes institucionais de tomada de decisão.

O Farol Verde compila o posicionamento de candidatos ao Congresso sobre temas ambientais e, no caso dos que disputam a reeleição, avalia o comportamento de parlamentares em votações consideradas estratégicas pelo movimento ambientalista.

Ainda na seara ambiental e de movimentos sociais, o portal De Olho nos Ruralistas está mapeando e apresentando ao público candidaturas camponesas, indígenas, quilombolas e ambientalistas.

Há ainda os "tinders políticos", ferramentas que ajudam o eleitor a decidir o voto baseado em temas considerados prioritários – uma delas é a Quem Te Representa.

Outras iniciativas semelhantes ao Farol Verde oferecem uma espécie de avaliação do desempenho de parlamentares sob perspectivas específicas – algo útil considerando que ao menos 497 dos 513 membros da Câmara dos Deputados, segundo levantamento do jornal Folha de S.Paulo, concorrem a algum cargo no pleito deste ano.

É o caso do Ruralômetro, da ONG Repórter Brasil, que mede a atuação de deputados federais em temas ligados ao meio ambiente, às questões indígenas e aos trabalhadores; da Elas no Congresso, da Revista AzMina, que avalia o comprometimento de congressistas com os direitos das mulheres no Brasil; e da Quem foi Quem, plataforma desenvolvida pelo Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), órgão de assessoria parlamentar dos sindicatos brasileiros, que observa o comportamento de senadores e deputados em votações de interesse da classe trabalhadora.


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