Qual é a fórmula mais eficiente para exorcizar o fantasma de regimes políticos totalitários e impedi-lo de apavorar a humanidade, em geral, ou as nações, isoladamente? É enterrar para sempre os períodos históricos marcados por tais regimes ou será melhor relembrá-los, geração após geração, para que o mal não se repita? No campo da epistemologia não há resposta conclusiva. A pensadora Hannah Arendt, uma das mentes mais brilhantes do século 20, ensinou que refletir sobre o mal é uma forma de evitar o seu cometimento. O sociólogo Theodor Adorno considera que, após a espécie humana ter sido capaz de produzir as atrocidades de Auschwitz, tornou-se ela refém de sua própria maldade e faz-se impossível postegar ad eternum a repetição de tão sádica e terrível experiência.

Tem todo sentido, assim, a reação de boa parte de intelectuais franceses contra o recente lançamento do livro “Historicizer le mal”. A obra faz críticas contundentes ao nefasto e maldito regime nazista, condena o seu ideólogo Adolf Hitler, mas, para isso, baseia-se no medíocre e mentiroso livro “Mein Kampf”, escrito pelo próprio ditador. É esse o motivo da não aceitação: o fato de ela se remeter ao texto nazista. Também estão certos, no entanto, aqueles que defendem “Historicizer le mal” como meio de manter sempre vívida na lembrança a perversidade do nazismo. Por esse raciocínio, o mal tem de ser contado de geração para geração, narrado dos velhos para os jovens, para que nunca seja desligado o alarme da consciência contra os governos tirânicos. Os dois caminhos de profilaxia política foram seguidos por diversas nações após a Segunda Guerra Mundial, mas nenhum deles se mostra seguro para impedir novas aventuras populistas.

Para evitar que surjam novos genocidas como Bolsonaro, sigamos contando aos jovens a selvageria da extrema direita

No Brasil temos o genocida Jair Bolsonaro na Presidência da República. Eu trilho a metodologia que julgo acertada e mais eficaz contra a extrema direita: a de não deixar desbotar no tempo a lembrança da existência da ditadura militar — regime de exceção que sequestrou, torturou e matou brasileiros que a ele se opunham, regime de exceção para o qual Bolsonaro faz rasgados elogios, regime de exceção que perdurou por vinte e um anos, regime de exceção que extinguiu a liberdade de expressão e a carta de cidadania, fechou o Congresso Nacional e suspendeu o habeas corpus a presos políticos. Bolsonaro é o fantasma desse período. Ele vai cair, porque, feito todo psicopata, tropeça nos próprios pés. E, para evitar que brotem novos Bolsonaro, como brotam ervas daninhas, sigamos contando aos jovens o que significa o populismo enquanto forma de governo — e como opera a extrema direita.