24/01/2019 - 18:30
O papa Francisco pediu nesta quinta-feira (24) que sejam feitos esforços para evitar o sofrimento dos venezuelanos ante o recrudescimento da crise no país e ofereceu a ajuda da Igreja para superar os “medos e receios” contra os migrantes na América Latina.
Enquanto Francisco voava na quarta-feira para o Panamá para participar da Jornada Mundial da Juventude, a Venezuela entrou em uma nova fase de incerteza política, em meio a novos protestos contra o governo, que já deixaram 26 mortos.
Em declaração enviada pelo Vaticano, à margem de seu primeiro dia de atividades no Panamá, Francisco disse que apoia “todos os esforços que permitem evitar sofrimento posterior à população”.
A tensão na Venezuela se intensificou depois que o líder do Parlamento venezuelano, o opositor Juan Guaidó, se autoproclamou presidente interino, com o apoio dos Estados Unidos e dos governos de outros 12 países da região, como Brasil, Argentina e Colômbia.
Depois disso, o presidente Nicolás Maduro anunciou a ruptura de relações com Washington.
Embora o papa tenha evitado o confronto direto com Maduro, a cúpula da Igreja Católica venezuelana tem sido uma dura crítica ao chavismo, que governa o país há 20 anos.
No fim de 2016, Francisco enviou um emissário para acompanhar um diálogo fracassado entre governo e oposição.
– Clamor pelos migrantes –
Sem se referir publicamente à crise venezuelana e seu enorme impacto na região, o papa se ocupou de outros flagelos no continente que tem mais católicos no mundo: a migração em massa, os feminicídios e a corrupção.
Tema central de sua viagem, Francisco propôs a intervenção da Igreja na onda migratória que arrasta centro-americanos até as portas dos Estados Unidos, assim como centenas de milhares de venezuelanos, asfixiados pelo colapso econômico em seu país.
“A Igreja, graças à sua universalidade, pode oferecer esta hospitalidade fraterna e acolhedora para que as comunidades de origem e destino dialoguem e contribuam para superar medos e receios, e consolidem os laços que as migrações, no imaginário coletivo, ameaçam romper”, afirmou.
Em um discurso aos bispos centro-americanos, o líder do Vaticano afirmou que a Igreja deve “acolher, proteger, promover e integrar” os migrantes.
Suas palavras têm eco em muitos jovens que foram ao Panamá para o encontro de cinco dias com o Pontífice argentino, de 82 anos.
“Se há uma pessoa que pode provocar uma mudança” a favor dos migrantes “é ele”, disse o guatemalteco José Paz, de 20 anos, cuja família migrou para os Estados Unidos.
Mais ainda “neste momento em que todos estes temas estão no auge porque não temos tido direção, não temos tido como enfrentá-los”, acrescentou.
– Uma praga contra as mulheres –
O papa também alertou para a “praga” que se tornaram os feminicídios no continente, onde 2.800 mulheres são assassinadas a cada ano, segundo a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe.
Mais que uma praga, estes crimes são “parte da cultura altamente machista”, declarou à AFP Fátima Meléndez, uma salvadorenha de 18 anos.
Esta estudante de economia, que viajou exclusivamente para ouvir o papa, disse que em seu país as mulheres não têm paz para fazer algo tão simples como ir à rua.
Aos feminicídios se soma a ação de “grupos armados e criminosos”, o “tráfico de drogas” e a “exploração sexual de menores” e de outros não tão menores, que agravam o êxodo de jovens, denunciou o líder religioso.
Diante da reivindicação das “novas gerações”, Francisco pediu um maior compromisso contra a corrupção.
“É um convite a (…) levar uma vida que demonstre que o serviço público é sinônimo de honestidade e justiça, e antônimo de qualquer forma de corrupção”, afirmou o pontífice na presença do presidente anfitrião, Juan Carlos Varela, e de diplomatas.
A corrupção é uma das práticas que carcomem a América Latina e minam a confiança na democracia, afirmam especialistas.
Um dos escândalos que mais atingiram a região envolve a empreiteira brasileira Odebrecht com políticos e empresários.
A companhia admitiu ter pago propinas no valor de US$ 778 milhões entre 2011 e 2015 em Brasil, Angola, Argentina, Colômbia, República Dominicana, Equador, Guatemala, México, Moçambique, Panamá, Peru e Venezuela.
O país que recebe o papa também foi epicentro, em 2016, do caso conhecido como “Papéis do Panamá”, após a revelação de documentos que evidenciavam uma gigantesca rede de evasão de impostos e corrupção em todo o mundo através de sociedades nebulosas criadas por um escritório panamenho.
No fim do dia, Francisco terá seu primeiro ato multitudinário da Jornada Mundial da Juventude, no cinturão costeiro da capital do país. Estima-se que 200.000 pessoas participarão da JMJ, que termina no domingo.