Durante seu pontificado, Francisco trabalhou incansavelmente para promover a luta contra as mudanças climáticas, tema que incluiu em muitos de seus discursos e ao qual dedicou, inclusive, uma encíclica.
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Horas depois de seu falecimento, nesta segunda-feira, 21, aos 88 anos, o secretário-executivo da ONU Clima, Simon Stiell, lembrou dele como “um defensor inabalável da ação pelo clima”.
“Graças à sua defesa incansável, o papa Francisco nos lembrou que não pode haver prosperidade até que não façamos as pazes com a natureza e protejamos os mais vulneráveis”, declarou Stiell em um comunicado.
No mesmo sentido, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que será o anfitrião, em novembro, da cúpula da ONU para o clima em Belém do Pará, destacou que o pontífice argentino impulsionou a causa climática com “coragem e empatia”.
O Vaticano já tinha tratado da questão do meio ambiente e o antecessor de Francisco, o alemão Bento XVI, chegou a ser apelidado de “o papa verde”.
Mas foi o argentino quem publicou, em 2015, a primeira encíclica sobre a questão de como proteger o clima, nossa “casa comum”.
Segundo o especialista em catolicismo Charles Mercier, a encíclica ‘Laudato si’ “finalizou o projeto de seu predecessor” com “um enfoque diferente” porque inclui referências a crenças amazônicas e elementos não ocidentais relacionados com a natureza.
“Bússola moral”
Francisco “não só foi o papa do clima, mas da Amazônia, dos pobres, dos oceanos. Mas sobretudo da esperança”, disse à AFP Oscar Soria, um ativista argentino, veterano das negociações climáticas.
Mesmo antes de ser eleito papa, Jorge Bergoglio levou estes temas à Conferência Geral do Episcopado Latino-americano e do Caribe, celebrada em 2007 na cidade de Aparecida, no interior de São Paulo.
“Sempre esteve do lado dos mais pobres e das populações indígenas”, lembra o ativista.
Em 2015, poucos meses depois da “Laudato si”, conseguiu-se um avanço significativo durante a COP21 com o Acordo de Paris, cujo objetivo é manter a elevação da temperatura do planeta abaixo dos 2°C. O papa “foi uma bússola moral nas negociações climáticas desde 2015”, diz Oscar Soria, com a voz embargada.
Segundo Laurence Tubiana, uma das arquitetas do Acordo de Paris, a “‘Laudato si’ foi um texto fundacional do compromisso cristão com a ação climática, que inspirou e marcou uma nova geração”.
O texto, baseado na pesquisa científica sobre o clima, afirmava claramente que a humanidade é responsável pelo aquecimento global e advertia contra a rápida mudança e a degradação que levaram o mundo à beira do “ponto de ruptura”.
A encíclica desencadeou um debate em nível mundial, sem precedentes para um texto religioso, incluindo comentários em revistas científicas.
A mensagem de Francisco também tinha forte conotação moral, denunciando a responsabilidade do consumismo, do individualismo e da busca pelo crescimento econômico às custas do planeta.
Em 2023, oito anos depois da encíclica, Francisco voltou a tratar da questão na exortação apostólica “Laudate Deum”, uma recomendação dirigida aos fiéis, publicada antes da COP28 de Dubai.
O texto pedia uma transição energética “vinculante”, criticando respostas insuficientes.
Sua saúde o impediu de viajar a Dubai, mas, em setembro de 2024, na Indonésia, o papa continuava advertindo que “a crise ambiental se tornou um obstáculo para o crescimento e a convivência dos povos”.
Presidente Lula e organização COP30 prestam homenagens
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva lamentou, a morte do papa Francisco, de quem destacou a “coragem e empatia” por promover a questão climática no Vaticano, e decretou sete dias de luto.
“Com sua simplicidade, coragem e empatia, Francisco trouxe ao Vaticano o tema das mudanças climáticas”, afirmou Lula. O Brasil recebe este ano, em Belém do Pará, a reunião do clima COP30.
Lula também elogiou as críticas do pontífice argentino aos “modelos econômicos que levaram a humanidade a produzir tantas injustiças”. Disse que Francisco “sempre se colocou ao lado daqueles que mais precisam: os pobres, os refugiados, os jovens, os idosos e as vítimas das guerras e de todas as formas de preconceito”.
“A humanidade perde hoje uma voz de respeito e acolhimento ao próximo”, destacou em um comunicado Lula, que decretou sete dias de luto em memória do pontífice latino-americano que propagou “o amor, a tolerância e a solidariedade”.
O papa buscou “de forma incansável levar o amor onde existia o ódio. A união, onde havia a discórdia. E a compreensão de que somos todos iguais, vivendo em uma mesma casa, o nosso planeta, que precisa urgentemente dos nossos cuidados”, acrescentou o presidente do Brasil.
Por sua vez, a presidência da COP30, liderada pelo diplomata brasileiro André Corrêa do Lago, também saudou a “voz firme e inspiradora” de Francisco “em defesa da justiça climática e da dignidade humana”.
“Que os ensinamentos do papa Francisco e sua corajosa liderança sirvam de exemplo em um momento-chave para acelerarmos a implementação do Acordo de Paris e de soluções climáticas”, destacou em um comunicado.
“Seu legado nos inspirará na COP 30 e na mobilização de um mutirão global para combater a mudança do clima sem deixar ninguém para trás”, acrescentou.
Francisco publicou em 2015 a primeira encíclica (‘Laudato si’) sobre a questão ambiental, que desencadeou um debate mundial, sem precedentes para um texto religioso, incluindo comentários em revistas científicas.
Meses depois, os países participantes alcançaram o Acordo de Paris sobre o clima, cujo objetivo é manter o aumento da temperatura global abaixo de +2°C em comparação com o período pré-industrial.