O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) vai decidir na terça-feira (9), pela primeira vez, sobre a responsabilidade dos países face à mudança climática, uma “decisão histórica” que poderá forçá-los a implementar políticas mais ambiciosas.

O tribunal com sede em Estrasburgo, no nordeste de França, vai decidir sobre três casos diferentes, nos quais os denunciantes censuram a “inação” dos governos ou suas medidas “insuficientes” no combate ao aquecimento global.

Entre estas está a reivindicação de um grupo de seis portugueses, entre os 12 e os 24 anos, que se mobilizaram após os terríveis incêndios que devastaram o seu país em 2017 e custaram a vida a mais de 100 pessoas.

A peculiaridade da demanda desses jovens, que alegam sofrer de ansiedade devido à crise climática, é que ela é dirigida contra Portugal e outros 31 países da Europa (todos os da União Europeia, além da Noruega, Suíça, Turquia, Reino Unido e Rússia).

Demonstrando a complexidade dos casos e a importância atribuída a eles, as decisões serão tomadas pela Grande Sala do tribunal pan-europeu, composta por 17 juízes e que examina os casos que podem estabelecer jurisprudência em um tema com vários aspectos.

Embora diversos países europeus já tenham sido condenados a nível nacional por não cumprirem seus compromissos climáticos, por exemplo no que diz respeito às emissões poluentes, o TEDH poderia ir mais longe e estabelecer novos direitos fundamentais.

A chave da questão está no eventual “reconhecimento de um direito individual e coletivo a um clima tão estável quanto possível, o que constituiria uma importante inovação jurídica”, segundo a advogada Corinne Lepage, que defende um dos casos.

A posição do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos “poderia marcar um ponto de inflexão na luta global por um futuro habitável”, afirma o advogado Gerry Liston, da ONG Global Legal Action Network (GLAN).

“Uma vitória em qualquer um dos três casos poderia representar o avanço jurídico mais significativo em questão da mudança climática para a Europa desde a assinatura do Acordo de Paris em 2015”, acrescenta.

Este tribunal, encarregado de garantir o cumprimento da Convenção Europeia dos Direitos Humanos firmada em 1950 e não vinculado às instituições da União Europeia, nunca se pronunciou sobre esta questão.

A Convenção não fala explicitamente sobre o meio ambiente, mas a instância jurídica já deduziu a obrigação de manter um “ambiente saudável” nos casos de rejeitos ou de atividade industrial, em virtude do “direito ao respeito à vida privada e familiar” (artigo 8º).

– ‘Todo mundo ganha’ –

Os três casos se baseiam sobretudo no artigo 8º da Convenção e no artigo 2º, sobre o “direito à vida”.

Os países denunciados tentaram demonstrar durante as audiências organizadas em 2023 que nem todas as condições foram cumpridas, como o necessário esgotamento dos recursos judiciais a nível nacional.

Além da reivindicação portuguesa, o TEDH deve resolver a de Damien Carême, ex-presidente da Câmara de Grande-Synthe, para quem sua cidade no norte de França corre o risco de ficar submersa devido às “deficiências” do Estado.

Ele apresentou o caso em 2019, em seu próprio nome e como presidente da Câmara, ao Conselho de Estado francês por “inação climática”. O tribunal administrativo superior decidiu a favor da cidade em julho de 2021, mas rejeitou sua queixa individual.

O terceiro caso é defendido por uma associação suíça de 2.500 mulheres com média de idade de 73 anos – “Idosos pela Proteção do Clima” – e quatro de seus membros.

Estas mulheres denunciam que as “deficiências” das autoridades suíças em termos de proteção climática “prejudicam gravemente o seu estado de saúde”.

“Se vencermos, todos ganham. As leis e as políticas terão de ser revistas, para o benefício de todos”, declarou Anne Mahrer, porta-voz da associação, que lembra que a jurisprudência do TEDH se aplica aos 46 países signatários da Convenção.

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