Breonna Taylor, Elijah Mcclain, Ahmaud Arbery e Trayvon Martin. Eles não são atletas ou celebridades, mas se tornaram famosos nos últimos dias por causa do US Open. Foram homens e mulheres negros que morreram vítimas de racismo nos Estados Unidos. E ganharam “voz” por meio da japonesa Naomi Osaka, que vem sendo a exceção no torneio em manifestações de apoio a protestos antirracistas, em meio aos recentes casos de violência contra negros no país.

Osaka estampou o nomes das quatro pessoas nas máscaras que está usando em cada partida do US Open. Ela diz ter sete destes itens de proteção com nomes diferentes, um para cada jogo que poderá fazer na competição se chegar à final, como fez em 2018, na conquista do seu primeiro título de Grand Slam da carreira.

“Antes de ser uma atleta profissional, sou também uma mulher negra. E, como mulher negra, eu sinto que tem coisas mais importantes e que merecem atenção mais imediata do que me ver jogar uma partida de tênis”, disse a tenista de 22 anos, que vem surpreendendo neste ano com suas declarações públicas contra o preconceito racial.

“Eu odeio quando as pessoas dizem que os atletas não devem se envolver com política e se ater ao entretenimento. Primeiramente, esta é uma questão de direitos humanos. Em segundo, por que você teria mais direito de falar do que eu?”, questionou a japonesa, que, apesar de ter nascido em solo japonês, tem mais vínculos com os EUA do que com o país asiático.

Neste US Open, Osaka tem sido uma voz quase solitária em apoio às manifestações contra o racismo, que voltaram a crescer no fim do mês passado depois que Jacob Blake, um homem negro, foi alvejado com sete tiros pelas costas por um policial, na cidade de Kenosha, no Wisconsin.

Além de se manifestar através das máscaras, Osaka fala sobre o tema nas entrevistas coletivas, algo incomum no caso dos outros tenistas, até mesmo no caso dos negros. Em comparação à NBA, por exemplo, as declarações no mundo do tênis têm sido raridade. A liga americana de basquete profissional chegou a paralisar os playoffs, momento mais decisivo da competição, por três dias, no fim de agosto.

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No US Open, as poucas manifestações em apoio aos protestos antirracistas acontecem com discrição ou restritas às redes sociais. A americana Sloane Stephens, campeã do US Open de 2017, foi além do mundo virtual e apareceu no complexo do torneio com a mensagem “No Justice, No Peace” (“Sem Justiça, sem Paz”) em sua máscara.

Frances Tiafoe, outro tenista negro, também usou a máscara para promover o movimento “Black Lives Matter”. “Não é apenas por mim, eu quero fazer isso para as crianças que estão me assistindo. Há um movimento muito sério acontecendo”, declarou o americano. Seu perfil no Twitter não traz sua foto, apenas um círculo totalmente preto. E Katrina Scott, outra americana negra, entrou em quadra com uma camiseta com referência ao “Black Lives Matter”.

De acordo com tenistas brasileiros presentes no US Open e ouvidos pelo Estadão, não há movimento entre os atletas para manifestações mais organizadas. Segundo os duplistas Luisa Stefani e Marcelo Demoliner, o apoio é discreto e não generalizado, como aconteceu em outras modalidades.

Osaka, desta forma, tem se sobressaído quanto ao tema. Curiosamente, a voz mais ativa em favor dos protestos antirracistas no tênis é uma das atletas mais tímidas e retraídas do circuito. Filha de mãe japonesa e de pai haitiano, a dona de dois títulos de Grand Slam vem representando a nova geração, principalmente por conta da miscigenação dos seus traços.

Neste ano, ela deixou sua casa em Los Angeles para participar de um protesto em Minneapolis contra a morte de George Floyd, asfixiado pelo joelho de um policial branco na mesma cidade. Também escreveu um artigo sobre o tema e sobre sua carreira para a prestigiada revista Esquire.

Na semana anterior ao US Open, ela surpreendeu novamente ao se retirar do Torneio de Cincinnati, em protesto aos casos de violência contra negros. A organização precisou se ajustar rapidamente e decidiu que o dia seguinte não teria jogos em apoio às manifestações. Osaka voltou atrás e decidiu se manter na competição após ter sua voz ouvida.

“O tênis é um esporte internacional e todos devemos nos envolver para melhorar algumas coisas na sociedade. Nós, tenistas, temos a responsabilidade de lutar contra as injustiças sociais e isso é o que estamos fazendo”, disse a tenista, que já foi número 1 do mundo. “Quando uso uma máscara com alguma mensagem, sinto que estou interagindo com as pessoas e assim também deixo os outros verem uma parte de minha personalidade.”

REFERÊNCIAS NO GRAND SLAM – Se os tenistas não demonstram maior engajamento na causa antirracista, a organização do US Open se antecipou e, desde a primeira rodada, exibe a mensagem “Black Lives Matter” num painel artístico na altura dos primeiros assentos, que podem ser vistos na transmissão de TV, na quadra central do complexo.

A quadra, por sinal, faz homenagem a um negro. Arthur Ashe batiza o local por ter sido um dos principais tenistas americanos das décadas de 60 e 70, com três títulos de Grand Slam. Foi ainda considerado número 1 do mundo antes do surgimento do ranking oficial, no qual depois atingiu a segunda posição.

O complexo do US Open também tem uma referência a Althea Gibson, que ganhou um busto com seu nome e parte de sua história. Ela brilhou na década de 50, com cinco Grand Slams no currículo e o topo do ranking. Após deixar as quadras, chegou a praticar golfe como profissional e atuou como treinadora das irmãs Venus e Serena Williams.


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