O governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, tem uma mentalidade violenta e selvagem — e, a seu modo e à revelia da lei, impõe a pena de morte no Estado. A sua política é liberar a polícia para matar bandidos de forma indiscriminada, ainda que pessoas inocentes sejam atingidas. “Vamos botar fim na bandidagem aqui em Angra dos Reis, acabou!”, declarou, ao seu estilo, ao encerrar um curto vídeo que postou em suas redes sociais na tarde de domingo 5, logo após, a bordo de um helicóptero da polícia, exibir armamentos e apresentar a equipe da Coordenadoria de Recursos Especiais que comandavam missão na Costa Verde. Nessa ação, um dos policiais alvejou uma cabana azul, que a polícia disse se tratar de um ponto de observação de traficantes. Moradores afirmam, porém, que era uma construção improvisada e usada como banheiro por um grupo evangélico que atua no local e sobe a montanha para rezar.

Leonardo Alves

A fúria assassina de Witzel não tem limites. No dia seguinte, outra ação com helicóptero, dessa vez sem o governador na aeronave mas com seu aval, foi conduzida no Complexo da Maré, na zona norte do Rio. Nela, oito pessoas foram mortas e mais três ficaram feridas por disparos a esmo. O medo da população é tão grande que os helicópteros estão sendo chamados de “caveirão voador”, em referência ao rastro de morte que deixam para trás. Relatos de moradores afirmam que muitos tiros foram dados. Há vídeos compartilhados pelas redes sociais que comprovam isso. E mostram crianças da Escola Medalhista Olímpico Lucas Saatkamp, localizada na Maré, correndo desesperadas pelas ruas para escapar das balas e salvar suas vidas.

Os homicídios em intervenções policiais estão se acumulando na gestão Witzel, que demonstra apreço pela violência desnecessária. Na campanha eleitoral, ele afirmou que ordenaria que “snipers” atirassem na cabeça de qualquer pessoa que portasse um fuzil e está cumprindo a promessa macabra. Seus detestáveis snipers estão atuando impunemente. De acordo com dados do Instituto de Segurança Pública do Rio de Janeiro, no primeiro trimestre foram registrados 434 homicídios em ações policiais no estado, recorde absoluto para o período entre janeiro e março. A marca anterior pertencia ao primeiro trimestre de 2018, quando foi ordenada a intervenção federal e aconteceram 368 homicídios.

Passou dos limites

Para Michel Misse, professor e coordenador na UFRJ do Núcleo de Estudos da Cidadania, Conflito e Violência Urbana, os disparos feitos a partir de helicópteros são absurdos. “Isso é coisa de filme, esse veículo é para fazer observação, levantamento de informações e reconhecimento”, diz. De acordo com o professor, a presença de Witzel entre os agentes legitima ainda mais as execuções de suspeitos em ações da polícia, mas isso não é exatamente novidade no País: “São coisas que policiais fazem há 50 anos, a diferença é que agora uma autoridade declara que isso é correto”. A pesquisadora de violência institucional da ONG Justiça Global, Monique Cruz, afirma que o “caveirão voador” amplia o círculo de medo das favelas para outras regiões da cidade. Para ela, as políticas de segurança de Witzel são comparáveis à pena de morte, excluindo-se o componente jurídico: “O discurso público e a presença do governador em ações como essa legitimam que pessoas possam ser mortas — é uma autorização tácita do governo para execuções sumárias”.

Na terça-feira 7, a deputada Renata Souza (PSOL), presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, protocolou na ONU uma denúncia contra o governador por causa do elevado número de homicídios policiais no estado. Ela já havia feito o mesmo para a Organização dos Estados Americanos (OEA) um dia antes. A ideia é que as organizações possam se pronunciar sobre o tema, pois, temos um governador que ordena a pena de morte no chão da favela sem que a Constituição Brasileira permita. A deputada Renata analisa que o governo deveria encarar a Segurança Pública de maneira mais racional e não com uma fúria assassina. Quanto aos tiros de helicóptero, a Secretaria de Segurança Pública prevê que os disparos podem ser feitos apenas em situações estritas de legítima defesa dos tripulantes e da população, algo que não pareceu ser o caso na descabida ação gravada por Wilson Witzel. Para o governador, pelo jeito, ter pessoas como alvo é divertimento de fim de semana.

“Faz parte de meu trabalho reconhecer essa situação e participar ativamente junto com a polícia daquilo que é a obrigação do governante” Wilson Witzel, governador do Rio de Janeiro