Eles desfilavam pela cidade em carros de luxo com chofer, jogavam à frente de suas mansões pianos de cauda quando desafinavam e mandavam os filhos estudar na Europa. Tinham a maior renda per capita dos Estados Unidos. Eram índios osages, que se tornaram o assunto da imprensa americana no início da década de 1920, os “anos loucos” da euforia econômica no país. Eles mereciam reportagens onde eram retratados como “magnatas peles vermelhas”. Mas o glamour era menor que o noticiado. Isolados nos confins do estado de Oklahoma,último rastro do Velho Oeste, a tribo osage começava a colher dividendos de três décadas de exploração de poços de petróleo em sua reserva, iniciada no fim do século 19. Em 1867, ela foi removida de suas terras férteis no Texas e forçada a comprar um terreno pedregoso em Oklahoma. Ninguém imaginava que o local continha a maior reserva de petróleo do país — e ainda hoje continua em atividade.

Pela lei, indígenas eram considerados incapazes e recebiam tutela de curadores brancos, designados entre os cidadãos mais prósperos do condado. Os osages tinham direito a uma mesada de 30% sobre os royalties da venda do petróleo. Apesar da fortuna controlada, passaram a ganhar milhões por causa da alta produção dos poços.

“Em crimes contra a humanidade, a história costuma fazer justiça. Mas os assassinatos de osages foram tão bem dissimulados que o desfecho já não é possível” David Grann, escritor

Em menos de dez anos, porém, osages não só perderam tudo como centenas deles morreram em circunstâncias misteriosas. Em 2014, o caso, ainda aberto, intrigou o repórter David Grann, do jornal “The New York Times”. Em dois anos de investigação, ele produziu o livro “Assassinos da Lua das Flores — Petróleo, morte e a criação do FBI”, lançado pela Companhia das Letras. Grann revelou que os índios foram alvo de um complô da oligarquia branca local. Atraídos pelos petrodólares, homens e mulheres brancas se casaram com indígenas. Para receber as heranças, envenenavam os parceiros lentamente com a ajuda de médicos. Isso quando não os mandavam matar. Entre 1921 e 1923, o fazendeiro William Hale envolveu os sobrinhos e contratou uma quadrilha que atuava no contrabando de bebidas (era o tempo da “Lei Seca”) para explodir a casa de uma parente índia, e assim receber o seguro.

EM HOLLYWOOD

O xerife da reserva, Tom White, ex-astro de rodeios, denunciou os crimes acobertados a J. Edgar Hoover, jovem diretor da polícia de Washington. Alarmado, Hooover designou White para cuidar do caso. Ao mesmo tempo, dedicou-se a elaborar técnicas de investigação e a construir a reputação de eficiência que culminou, em 1935, na fundação do Federal Bureau of Investigation, FBI, órgão que unificou a polícia americana. O primeiro caso célebre do FBI foi ter resolvido a trama contra
os osages. Hoover e White foram glorificados por terem capturado Hale e seu bando.

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No entanto, como consata Grann, o complô não passou de um entre centenas que ocorreram entre 1907 e 1935 e seguem até hoje sem solução.“Em crimes contra a humanidade, a história costuma fazer alguma justiça”, diz. “Mas os assassinatos de osages foram tão bem dissimulados que o desfecho já não é possível.”

Em 2017, seu livro entrou nas listas de mais vendidos e foi eleito a melhor obra de não-ficção por revistas, jornais e sites. O episódio ganhou fama, mas ainda não é ensinado nas escolas americanas. A esperança de Grann é que ele entre para o currículo depois que o diretor Martin Scorsese e o ator Leonard DiCaprio (que irá interpretar Tom White) o levarem às telas. A dupla detêm os direitos de filmagem, sem data de início. Grann prepara o roteiro.

 


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