Os riscos que a AfD representa para a democracia

Os riscos que a AfD representa para a democracia

"Gauland,Depois da eleição, poder político do partido ultradireitista alemão aumenta, e constitucionalistas defendem sua proibição com base no desrespeito ao princípio da igualdade de liberdade.Donald Trump, Elon Musk, Javier Milei: a atual política mundial é barulhenta e radical e gera manchetes com provocações e hostilidades. E isso vale também para a Alemanha, onde o partido populista de direita, com alas consideradas extremistas, Alternativa para a Alemanha (AfD) influencia decisivamente o debate público.

A co-líder da AfD Alice Weidel pinta um quadro sombrio do país. "Este governo odeia a Alemanha", declarou em 2024. Ela já chamou imigrantes de "garotas de véu" e "homens de facas". Todo esse barulho produz manchetes, que prendem a atenção, a qual resulta em sucesso nas urnas, que produz mais barulho, realimentando o ciclo vicioso dos estrategistas da ultradireita.

Essa desvalorização e marginalização bate de frente com um dos valores fundamentais de uma sociedade tolerante e plural: o direito a um tratamento igualitário perante a lei. É um princípio central ancorado na Lei Fundamental alemã: "Ninguém pode ser prejudicado ou favorecido devido a seu gênero, ascendência, raça, idioma, pátria e origem, fé, posições religiosas ou políticas".

A questão do tratamento igualitário é o argumento mais usado por constitucionalistas que veem a AfD como uma ameaça à democracia alemã. "O ponto central é o ataque da AfD à igualdade de liberdade", diz o jurista Matthias Goldmann, da Universidade EBS de Direito e Economia, do estado de Hesse.

Goldmann considera a legenda ultradireitista uma ameaça à democracia alemã. "A inconstitucionalidade se baseia sobretudo em a AfD não compartilhar o princípio da igualdade de liberdade. Na Alemanha, a Lei Fundamental garante a mesma dignidade para todos e, consequentemente, a mesma liberdade."

"Remigração em larga escala"

No entanto muitos políticos da AfD atacam esse princípio. Um deles é o parlamentar Stefan Möller. Os eleitores da Turíngia, sua terra natal, elegeram-no seu representante no Bundestag (câmara baixa do parlamento) pela AfD, votação forte. Segundo a imprensa local, o chefe do Departamento de Proteção da Constituição da Turíngia é categórico ao julgá-lo como comprovadamente "hostil à Constituição".

Uma postagem de Möller na rede social X em 17 de julho de 2023 parece comprovar esse julgamento: "Se você é alemão, isso se decide entre as orelhas [pela aparência] e não no papel". Ou seja, Möller coloca fundamentalmente em questão a cidadania: para ele não vale a regra de que é alemão quem tem um passaporte alemão.

Trata-se de um ataque frontal a valores fundamentais da sociedade, e também o motivo por que tantos temem a ascensão da AfD: ela quer ver milhões de indivíduos fora da Alemanha, e propositalmente mantém vagos os critérios exatos para tal.

Ocasionalmente, contudo fica claro que os devaneios de deportações da AfD valem também para alemães. O presidente honorário do partido, Alexander Gauland, já declarou que a ex-vice-presidente do Bundestag Aydan Özoguz deveria ser "despejada na Anatólia".

E o líder da AfD na Turíngia, Björn Höcke, que um tribunal já permitiu ser tachado de "fascista" por manifestantes, sonha com um "projeto de remigração em larga escala" em seu livro Nie zwei Mal in denselben Fluss (Jamais duas vezes no mesmo rio). Isso não será possível sem "crueldades bem temperadas", escreve Höcke, e "nem sempre será possível evitar um tratamento duro e cenas desagradáveis".

Goldmann diz que os ataques à cidadania alemã representam ainda um outro tipo de perigo por parte do forte grupo parlamentar da AfD, recém-eleito para o Bundestag: "Há uma proposta de que a dupla cidadania poderia ser revogada no caso de os imigrantes cometerem certos crimes", explica Goldmann.

Areia nas engrenagens da democracia

A AfD conseguiu levar o debate desse tipo de proposta das margens para o centro da sociedade, diz Goldmann. Ele vê nisso uma estratégia do partido para enfraquecer o assim chamado "cordão sanitário", o acerto entre os partidos do campo democrático de não cooperar com o extremismo.

A bancada da AfD ainda não é forte o suficiente para implementar uma política de bloqueio no Bundestag. Mas também não está muito longe disso.Ela deterá quase um quarto de todos os assentos no próximo parlamento; se tivesse um terço, poderia, por exemplo, bloquear a nomeação de juízes importantes.

Os constantes alertas contra a sigla parecem estar perdendo a força, o que acaba beneficiando-a. Além disso, muitos já se acostumaram às frequentes provocações por parte de parlamentares da AfD, assim como muitos americanos se acostumaram com Donald Trump.

Os políticos da AfD minimizam os alertas de risco à democracia como alarmismo infundado. Weidel vai além e inverte o jogo, acusando os outros partidos de serem uma ameaça à democracia: "Eles estão fazendo política contra a população", afirmou ela durante um debate no Bundestag em fevereiro de 2025.

Porém a AfD já está usando seu poder para minar as instituições. Na Turíngia, já tem poder de veto no parlamento, pois ocupa mais de um terço das cadeiras. Assim vem impedindo a escolha de novos juízes e promotores públicos no estado. Ao fazer isso, joga areia nas engrenagens da democracia: "É fácil entender o que está acontecendo: a AfD quer ter influência no Judiciário", conclui Goldmann.

Um dos mais experientes marionetistas da AfD da Turíngia é o jurista Torben Braga, nascido no Brasil. Como secretário da bancada do parlamento da Turíngia, ele preparou inúmeras ações parlamentares contra os odiados "partidos cartelistas", como a AfD chama seus oponentes políticos. Ele passará agora a integrar o Bundestag.

Goldmann alerta para a nova força da AfD no parlamento alemão: "Ela tem agora mais oportunidades do que tinha antes da eleição para dividir o centro democrático." Ao lado de 16 outros constitucionalistas, ele apoia um processo de proibição da AfD no Tribunal Constitucional Federal, a suprema corte alemã.