A queda do Muro de Berlim em 9 de novembro de 1989, com milhares de alemães orientais celebrando a destruição da muralha de concreto, gerou previsões do “fim da história” e a chegada de um mundo sem fronteiras.

Mas 30 anos depois, os muros e grades estão cada vez mais presentes em todo o planeta com temores relacionados à globalização, prometendo soluções de segurança e retomada de identidade, consideram analistas.

“Se quem acompanhou o fim da Guerra Fria observa o que se passa hoje, verá que mudou por completo o paradigma”, diz Elisabeth Vallet, pesquisadora da Universidade Quebec de Montreal e especialista em muros de fronteiras.

– 40.000 km –

O traçado de 160 quilômetros do Muro de Berlim se transformou hoje em dia em um local de passeio bucólico muito apreciado por corredores e ciclistas.

Em outros lugares acontece o mesmo: atualmente “estamos seguros de que existe o equivalente à circunferência terrestre, ou seja, 40.000 quilômetros no sentido literal”, diz Vallet. Esse número teve um forte aumento em 20 anos, e corresponde a “71 muros”, definidos como estruturas presas ao solo que não se pode cruzar.

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A maioria está no continente asiático, ao redor da Índia, China e Coreia, mas também no Oriente Médio. Foram construídos também na Europa Central, Hungria e Bulgária, além dos Estados Unidos, para tentar conter a chegada de migrantes.

Paralelamente, também há um movimento de retomada dos sistemas democráticos no mundo.

Há 30 anos, na Europa, com o fim da Cortina de Ferro, “as pessoas estavam felizes em ver que era possível derrubar fronteiras que pareciam eternas. Hoje em dia voltou uma época de construção de muros para criar temores e divisões”, lamenta Nick Buxton, do Instituto Transnacional, um centro de pesquisas que publicou um relatório sobre o tema ano passado.

– Globalização –

Os especialistas tentam explicar o retorno dos muros. “No início dos anos 2000, a hipótese era que os atentados de 11 de setembro de 2001 nos Estados Unidos eram a explicação”, diante da ameaça jihadista, explica Vallet.

Atualmente, a ideia mais aceita é dos efeitos da globalização. Com uma necessidade para parte da opinião pública de recuperar a soberania nacional em um mundo que parece aberto para tudo.

As fronteiras “nunca teriam desaparecido, exceto em nossos mapas mentais de viajantes europeus”, diz o geógrafo francês e ex-embaixador Michel Foucher em seu livro “O retorno das fronteiras”.

“Abolir as fronteiras é fazer desaparecer os Estados, um mundo sem fronteiras é um mundo bárbaro”, estima. O pastor Joachim Gauck, que participou da revolução de 1989 na República Democrática Alemã antes de se tornar presidente da Alemanha unificada, considera hoje que os governos devem impor “formas de limitação” para “aliviar os temores da população”.

“A globalização gerou um movimento de abertura e um movimento de encerramento”, diz Vallet, severa diante dos partidários da livre circulação total.

– Erro –

“Um dos erros foi postular que as fronteiras, as soberanias, iam desaparecer, o que não é o caso”, afirma.


“Isto tem gerado uma forte reação que se apoia no populismo”: nos Estados Unidos com o “muro” do presidente Donald Trump entre EUA e México, e na Itália com a fronteira marítima defendida pelo líder da extrema-direita, Matteo Salvini, no Mediterrâneo, diz.

O Brexit também está dentro dessa tendência.

Porque, como resume o cientista político alemão Wolfgang Merkel, o verdadeiro “muro” mundial atualmente é o que separa os cidadãos “cosmopolitas”, beneficiários da globalização, dos “comunitaristas” que têm medo ou sofrem com ela.

Essa evolução também preocupa alguns alemães que viveram na RDA comunista, como Karsten Brensing.

Em 1989, antes da queda do Muro de Berlim, Brensing, com 21 anos, conseguiu cruzar a Cortina de Ferro, arriscando sua vida. “Somos a última geração (de alemães) que cresceu em uma ditadura, somos testemunhas da história e é realmente terrível ver que as pessoas pedem de novo para fechar as fronteiras”, diz.


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