Coluna: Guilherme Amado, do PlatôBR

Carioca, Amado passou por várias publicações, como Correio Braziliense, O Globo, Veja, Época, Extra e Metrópoles. Em 2022, ele publicou o livro “Sem máscara — o governo Bolsonaro e a aposta pelo caos” (Companhia das Letras).

Os milhões da CBF ao cunhado cartola de Ednaldo Rodrigues

Ricardo Lima, cunhado de Ednaldo Rodrigues e presidente da Federação Bahiana de Futebol, é exemplo de como chefe da CBF turbinou salários de cartolas estaduais

Os milhões da CBF ao cunhado cartola de Ednaldo Rodrigues

Presidente da Federação Bahiana de Futebol (FBF) desde 2019, Ricardo Lima (à direita, na foto acima) tem em seus contracheques um exemplo cristalino de como o presidente da CBF, Ednaldo Rodrigues, turbinou os salários de dirigentes estatuais — os apoiadores mais valiosos que um cartola em sua posição pode querer, por serem eles, mais do que os clubes, quem define o chefe da entidade máxima do futebol brasileiro.

O repórter Allan de Abreu detalhou como Ednaldo costurou, contando com muito dinheiro em agrados e favores, a vasta rede de apoios na cartolagem que o levou a uma reeleição por unanimidade em março passado. Ele ficará no comando da CBF ao menos até 2030.

A coluna teve acesso a documentos internos da CBF que mostram como explodiram os ganhos de Ricardo Lima junto à entidade entre 2021, quando Ednaldo assumiu o cargo, e 2024: de R$ 860 mil para R$ 3,6 milhões, um salto de 318%.

No caso do cartola baiano, homem de confiança de Ednaldo, sucessor dele na federação da Bahia e um dos atuais vice-presidentes da CBF, as relações são também familiares. Os dois são cunhados.

Os documentos a que a coluna teve acesso indicam que, ao longo de 2021, Ricardo Lima recebeu da CBF, enquanto presidente da FBF, R$ 860 mil brutos. Compuseram o valor R$ 470 mil em “honorários” e R$ 390 mil em uma rubrica definida apenas como “PGTO AUTONOMO”, ou seja, pagamentos autônomos. A CBF não quis explicar à coluna o que são exatamente esses pagamentos.

Entre janeiro e junho de 2021, os honorários pagos pela CBF a Ricardo Lima haviam sido de R$ 20 mil mensais. Ednaldo Rodrigues, então um dos vice-presidentes da CBF, assumiu a presidência interinamente em agosto, no lugar de Rogério Caboclo. De julho a setembro, a remuneração de Lima passou a R$ 50 mil. Em outubro, R$ 70 mil em honorários mais R$ 90 mil em “pagamentos autônomos”, R$ 160 mil ao todo. Em novembro, um total de R$ 195 mil no total e, em dezembro, R$ 215 mil.

Em 2024, já com Ednaldo havia três anos no comando da CBF, os ganhos do presidente da federação baiana atingiram outro patamar: R$ 3,6 milhões brutos, dos quais recebeu R$ 2,3 milhões líquidos.

Naquele ano, o total em honorários do presidente da FBF foi de R$ 2,1 milhões, uma média de R$ 175 mil por mês, com valores variando de R$ 77 mil a R$ 194,7 mil. Em 2024, Lima também recebeu mais R$ 1,5 milhão por meio dos tais “pagamentos autônomos” — R$ 33 mil no menor valor, em janeiro, e R$ 286 mil no maior, em fevereiro.

Somando os honorários e os outros pagamentos destinados a Ricardo Lima, os proventos da CBF a ele, em valores brutos, chegaram a R$ 488 mil em fevereiro de 2024, R$ 408 mil em abril, R$ 402 mil em maio, R$ 325,6 mil em novembro e R$ 323,9 mil em dezembro.

A coluna procurou a CBF para ouvi-la sobre os pagamentos milionários a Ricardo Lima. Entre as indagações, perguntou o que seriam os “pagamentos autônomos” que constam nos documentos.

A CBF optou por não responder as questões e enviou uma nota. Disse a confederação:

“Todo e qualquer pagamento feito pela instituição na gestão do presidente Ednaldo Rodrigues é feito de acordo com o estatuto, apresentado à auditoria interna e externa e submetido ao controle do Conselho fiscal e da assembleia geral. Não se paga um centavo em desacordo com o estatuto. Nunca houve tanto controle e transparência na gestão”.

“Repudia-se categórica e veementemente qualquer tipo de alegação falaciosa, leviana e arranjada de pagamentos feitos em desacordo com o estatuto ou com qualquer finalidade que não seja lícita e estatutária. E lamenta-se, profundamente, que vozes de mau agouro pretendam, em vão, de forma tola e até pueril, desestabilizar uma gestão que, eleita de forma histórica, já tem alcançando os melhores números na gestão da entidade”.

A coluna tentou contato com Ricardo Lima e a FBF por meio de ligações, mensagens e e-mail, mas não teve retorno até a publicação desta reportagem. O espaço segue aberto a manifestações.

Família, confiança e espionagem

A reportagem da revista piauí, publicada em abril, mostrou o nível de confiança entre Ednaldo Rodrigues e Ricardo Lima, os cunhados. O atual presidente da FBF foi vice de Ednaldo na federação baiana e o sucedeu no cargo em janeiro de 2019. Em março de 2025, foi eleito para uma das vice-presidências da CBF, cargo que acumula com a chefia do futebol na Bahia.

No início de 2023, ao contratar uma vistoria no sistema anti-incêndio da CBF, a arquiteta Luísa Xavier da Silveira Rosa, então diretora de patrimônio da entidade, encontrou uma câmera com captação de áudio escondida sob um detector de fumaça no restaurante do prédio.

Investigando o caso, ela soube que as imagens e áudios eram guardados em uma central, que ficava em uma sala contígua ao gabinete de Ednaldo Rodrigues — e à qual só ele tinha acesso.

Rosa também descobriu uma conversa de WhatsApp entre Ricardo Lima e um funcionário do setor de tecnologia da informação da CBF. Na conversa, o funcionário perguntou a Lima: “Câmeras escondidas no restaurante. Envia para o setor de compras? Boa tarde!”. Ricardo Lima, então, respondeu: “Boa tarde! Perfeito. Envia, sim”.

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