A primeira capital do Brasil já conhece o herdeiro político do prefeito Antonio Carlos Magalhães Neto (DEM), que administra Salvador há oito anos e não pode mais ser candidato à reeleição. Trata-se do seu vice Bruno Reis (DEM), que aparece em primeiro lugar nos levantamentos feitos pelo Instituto Paraná Pesquisas com 34,9% das intenções de votos. Ele surfa na onda de ACM Neto, que alcança uma avaliação positiva de 83,3%. O prefeito divide o peso de maior cabo eleitoral da Bahia com o governador Rui Costa (PT). Ele também é bem avaliado pelos soteropolitanos e está com 80,1% de aprovação dos eleitores. Por isso, o apoio dessas lideranças incontestes na cidade será decisivo para o sufrágio popular na eleição de novembro. Como o candidato do prefeito já larga na frente com folga, agora há uma corrida desenfreada pelo apoio do governador. Pelo menos quatro dos cinco principais candidatos disputam tê-lo no palanque, que, desta vez, deverá ser basicamente eletrônico. De forma inédita, o governador já escolheu como candidata uma mulher e, copiando o modelo de sucesso bolsonarista, também é militar. Trata-se da Major Denice (PT), que está com apenas 4,1% das intenções de votos, mas que tem tudo para decolar quando a campanha começar para valer. No início, os petistas mais ligados a Lula e aos sindicalistas, torceram o nariz para a Major, mas o governador percebeu que ela tinha potencial de crescimento junto à população mais carente da periferia. Correndo por fora, outros candidatos disputam o apoio do governador petista, como é o caso do deputado federal Sargento Isidório (Avante), com 15,5%, da deputada federal Lídice da Mata (PSB), com 12,9%, e a deputada federal Olívia Santana (PCdoB), com 4,5%. Eles disputam pelo menos distribuir fotos ao lado de Rui Costa para alcançar uma vaga no segundo turno.

Os cientistas políticos acreditam que a campanha em Salvador promete a reedição da tradicional disputa que avança no Estado já há alguns anos, entre a direita do DEM versus a esquerda do PT ou algum dos aliados do governador, ligados ao PSB e ao PCdoB. Por isso mesmo, Rui Costa não pretende depositar todas as suas fichas apenas na Major da PM, embora ela seja sua maior aposta. Ele está sendo pressionado pelos aliados tradicionais da esquerda a abrir espaço na sua agenda também para tirar fotos ao lado do Sargento Isidório e das outras duas deputadas federais de sua base aliada (Lídice e Olívia).

O jogo pela prefeitura de Salvador é apenas uma preliminar para a disputa pelo governo da Bahia em 2022. O prefeito que vier a ser eleito este ano também terá grande importância na escolha do sucessor de Rui Costa em 2022, pois o petista completa oito anos no cargo e não poderá mais disputar a reeleição. O atual prefeito ACM Neto já lançou-se candidato a governador e conta com a eleição de Bruno Reis para aumentar sua musculatura eleitoral, enquanto o petista pode vir a ser candidato ao Senado. Ele sonha também em pleitear uma candidatura a presidente pelo PT em 2022, caso eleja o prefeito da capital, pregando a renovação do partido, hoje totalmente dependente do lulismo. O vice-prefeito reconhece a importância dessa articulação, mas prefere não colocar o carro na frente dos bois. “Tratamos a cada dia uma agonia. Porém, não tenho dúvida de que o prefeito possa levar o seu legado para o Estado e ser candidato a governador”, disse Bruno Reis à ISTOÉ.

Bem posicionado nas pesquisas, o Sargento Isidório tem grande esperança de contar com a ajuda de Rui Costa. Embora esteja em um partido de direita (Avante) e de ser pastor evangélico, o Sargento já esteve no PDT e tem bom trânsito com o PT soteropolitano. Em 2016, ele foi candidato a prefeito e ficou em terceiro lugar, com 8,61% dos votos. Agora, ele desponta no cenário eleitoral com chances de ir para o segundo turno com um discurso bem popular e apresentando resultados de um intenso trabalho social na periferia junto a dependentes químicos. Isidório é contundente ao criticar a política municipal de arrecadação de impostos. “O povo de Salvador aceitou a exploração fiscal que aumentou os impostos de R$ 3,7 bilhões em 2012 para R$ 8 bilhões neste ano”, disse o deputado. O militar comemora a composição de sua chapa com Eleusa Coronel (PSD), que desistiu da disputa e será sua candidata a vice-prefeita.

As mulheres

Três candidatas mulheres, todas da esquerda, chamam a atenção nesta disputa e desejam ter o apoio do governador. Na frente das demais aparece Lídice da Mata, que foi prefeita da capital entre 1993 e 1996 e, por isso mesmo, é muito lembrada nas pesquisas. Profunda conhecedora de Salvador, ela reconhece que o desafio é a grande desigualdade social. “Somos uma metrópole conhecida internacionalmente, com nossas paisagens virando cartão-postal do Brasil, mas é também uma cidade onde a maioria da população da periferia não tem acesso a água, esgoto e comida”, comentou a deputada. Outra candidata que tem menos chances na disputa é a deputada estadual Olívia Santana. Ela tem um discurso muito ligado às questões sociais e talvez seja a mais crítica à gestão do atual prefeito. “Depois de quase oito anos de gestão, Salvador ainda é a capital do desemprego, pobreza e brutal desigualdade”, disse Olívia.

A grande surpresa do processo eleitoral e que é uma das apostas do governador é a petista Major Denice.
Ela rompe com o paradigma de falta de diálogo por ser militar. A Major da PM baiana tem um discurso de aproximação entre forças policiais e a sociedade. Por fora na disputa corre o deputado federal Bacelar. Ele aponta que seria necessário fazer uma gestão a partir dos bairros e discorda da segurança: “Definitivamente Salvador está na contramão de experiências bem sucedidas”, disse Bacelar.

Bolsonarismo

Na esteira do bolsonarismo, os candidatos Cezar Leite (PRTB), que é vereador, e o administrador Celsinho Cotrim (PROS) não decolaram no agrado popular.

Apesar de todos os candidatos até aqui estarem mais preocupados com os padrinhos políticos, eles começam agora a pensar na formulação de projetos de desenvolvimento para a cidade. O Atlas da Violência 2020 do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) apresenta a triste realidade sobre a segurança, como um dos problemas a serem resolvidos, embora as soluções esteja mais na mão do governador e do governo federal. Foram 6.787 mortos em 2018. “Infelizmente, a Bahia é a campeã nacional no número de homicídios”, diz o vice-prefeito Bruno Reis. Talvez por isso é que entre os principais candidatos dois sejam militares, o Sargento Isidório e a Major Denice. O Sargento inclusive tem uma posicionamento peculiar: “Se necessário for, dialogarei até com os traficantes, com os desviados da lei de modo a parar com o derramamento de sangue na cidade”, disse Isidório. A Major Denice, por sua vez, entende que a prevenção ao crime seja melhor saída, embora a violência seja uma atribuição dos governos estadual e federal. “É no município que ocorre a violência”, justificou a petista PM.

Outro desafio para o próximo prefeito está na Educação, já que cerca de 450 mil pessoas de 25 anos ou mais não têm instrução ou não completaram o ensino fundamental. As creches atendem apenas 31% das crianças, enquanto a iniciativa privada controla a maioria das escolas. Na Saúde, há um consenso entre a maioria dos candidatos de que as ações coordenadas entre o prefeito e o governador foram positivas para o enfrentamento à Covid-19. Na Habitação, o déficit é de 100 mil moradias. A urbanização da periferia é urgente, pois falta desde asfalto até saneamento básico, que é precário nas favelas. Embora faça parte da administração de ACM Neto, o vice-prefeito Bruno Reis reconhece os problemas. “Rios e córregos se tornaram esgoto a céu aberto por falta de investimentos da Embasa, uma empresa do governo estadual”. O orçamento de R$ 8 bilhões não dá conta de atender todas essas demandas.