A semana do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), não começou como de costume. Sempre calmo e articulando pelas beiradas, Alcolumbre resolveu disparar sua metralhadora de recados para todos os lados. Na mira estavam o Palácio do Planalto e o Supremo Tribunal Federal (STF).
O chefe do Congresso Nacional abriu a semana atacando o governo federal. Incomodado com a indicação de Jorge Messias, ministro-chefe da Advocacia-Geral da União (AGU), para uma das cadeiras do STF, Alcolumbre enviou um duro recado ao Planalto após o atraso no envio da mensagem com o nome do escolhido. Em uma nota à imprensa, o presidente do Salão Azul disse haver uma tentativa de interferência indevida do Executivo no Senado, além de negar interesse na troca de cargos para bancar a aprovação do AGU.
A irritação ficou clara no documento. Davi percebeu a movimentação do Palácio para atrasar o envio da mensagem enquanto se articulava para adiar a sabatina, prevista para o dia 10 de dezembro. Alcolumbre tinha imposto um calendário apertado justamente para pressionar uma derrota ao Planalto, com a primeira indicação barrada para o STF desde 1894. Ao perceber o jogo do presidente do Senado – que defende o nome de Rodrigo Pacheco (PSD-MG) para o posto – o governo intensificou a atuação para conquistar os votos necessários para a aprovação.
Na terça-feira, 2, Alcolumbre voltou a mirar no Planalto. No plenário, ele anunciou o cancelamento da sabatina e retomou o argumento de interferência na prerrogativa legislativa. “Essa omissão, de responsabilidade exclusiva do Poder Executivo, é grave e sem precedentes. É uma interferência no cronograma da sabatina, prerrogativa do Poder Legislativo”, disse, ao citar a demora no envio da mensagem ao Congresso. A decisão teve um gosto de vitória para os governistas, que viram Messias atuando com maior tranquilidade no “beija-mão” para garantir o apoio dos senadores.

Lula indicou Jorge Messias, em detrimento de Rodrigo Pacheco (PSD-MG), favorito de Davi Alcolumbre
Ao mesmo tempo, o governo reagiu para tentar apaziguar a relação e passou a enviar sinalizações para Alcolumbre. Gleisi Hoffmann, ministra da articulação política, foi a primeira a ir em defesa do presidente do Senado ao negar interesses fisiológicos em troca da aprovação de Messias. Depois, foi a vez do próprio Lula mandar um sinal de paz para o chefe do Congresso por meio do senador Weverton Rocha (PDT-MA), relator da indicação ao STF e aliado tanto do governo quanto de Alcolumbre. Aos jornalistas, Rocha garantiu que Lula deve se reunir com o presidente do Senado nos próximos dias.
Outra sinalização dada partiu do próprio Jorge Messias. Ainda AGU, o indicado enviou um pedido para que o ministro Gilmar Mendes, do STF, reconsiderasse a decisão que limitou à Procuradoria-Geral da República (PGR) os pedidos de abertura de processo de impeachment contra ministros da Suprema Cortexx. No pedido, Messias afirmou que a regra atual não é uma ameaça ao Poder Judiciário e cita um projeto em tramitação no Senado, de autoria de Pacheco, que altera a Lei de Impeachment. Na liminar que derrubou trechos da lei, Gilmar Mendes entendeu que o artigo que liberava o pedido de processo para qualquer cidadão não estava em conformidade com a Constituição de 1988. A decisão deve passar pelo referendo do plenário do STF a partir do próximo dia 12.
A medida provocou a ira dos senadores. No plenário, Alcolumbre partiu para o ataque e disse que o tema é uma prerrogativa do Legislativo e ameaçou mudar a Constituição para defender os interesses do Congresso. “Se preciso for, inclusive, com a sua positivação na Constituição Federal, através de emendamento”, disse o presidente do Senado. Parlamentares da Direita citaram a tentativa de blindagem ao ministro Alexandre de Moraes, do STF, que sofre com ao menos 30 pedidos de impeachment no Salão Azul. Todos os requerimentos foram protocolados por bolsonaristas, em resposta ao processo que condenou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) a 27 anos e três meses de prisão.

Decano do STF, ministro Gilmar Mendes impôs derrota ao Senado ao determinar que apenas PGR pode entrar com processo de impeachment contra membros da Corte
Os governistas também adotaram um tom alto contra a decisão. Líder do governo no Congresso, o senador Randolfe Rodrigues (PT-AP) classificou a determinação como uma agressão. “Ao longo do tempo, tenho manifestado várias vezes solidariedade a vários membros do STF, sobretudo em decorrência de notórias e autoritárias agressões que eles têm sofrido. É lamentável que a agressão tenha vindo do outro lado da Praça dos Três Poderes”, disse o senador.
Em meio ao caos, os senadores passaram a articular respostas ao Judiciário. Uma delas é a negociação para o avanço da proposta de emenda constitucional (PEC) que proíbe decisões monocráticas. O texto já foi aprovado pelo Senado, mas está travado na Câmara dos Deputados. Alcolumbre disse que conversará com o presidente do Salão Verde, Hugo Motta (Republicanos-PB), sobre o tema.
Ainda na quinta, Gilmar jogou mais um balde de água fria, dessa vez em Messias. O ministro recusou o argumento do AGU e manteve a decisão sobre o impeachment de membros da Corte, invalidando a tentativa do indicado de Lula de reverter a resistência de Alcolumbre ao seu nome. Após a decisão, o presidente do Senado descartou a sabatina ainda neste ano, enquanto aliados mais próximos acreditam que ele deve usar a mesma estratégia que fez com André Mendonça e segurar a votação por meses. Do lado do governo, todavia, há a expectativa de que a aprovação de Messias saia logo no começo de 2026. “Esse debate ficará para o próximo ano. Pelo prazo que temos, torna inviável termos a sabatina ainda neste ano”, disse Randolfe.