Os erros e acertos de ‘Vale Tudo’: remake da Globo entra na reta final

O desafio de modernizar um clássico: o remake de 'Vale Tudo' equilibra homenagem ao original com alterações que geram controvérsia entre o público

Pesquisa aponta que 80% do público jovem aprova o remake da novela 'Vale Tudo'
Pesquisa aponta que 80% do público jovem aprova o remake da novela 'Vale Tudo' Foto: Reprodução/TV Globo/Fábio Rocha

Com o remake de ‘Vale Tudo’ entrando em sua reta final, a reportagem de IstoÉ Gente faz um balanço dos erros e acertos da novela, analisando como a produção de 2025 se sai ao revisitar um dos maiores clássicos da teledramaturgia brasileira. Desde a estreia em 31 de março de 2025, a versão assinada por Manuela Dias vem despertando amplo debate entre público, críticos e fãs do clássico de 1988. A intenção de revisitar uma das novelas mais icônicas encontrou, desde o início, o desafio de equilibrar nostalgia e inovação. Com expectativas históricas muito altas, o remake apresenta uma combinação de acertos notáveis, falhas técnicas e narrativas, além de escolhas criativas que dividem opiniões.

Entre os acertos, a atualização de temas e personagens se destaca. A trama conseguiu aproximar-se do Brasil contemporâneo sem perder a essência da história original. Maria de Fátima, por exemplo, deixa de ser apenas uma jovem ambiciosa e passa a simbolizar a geração digital, sonhando em se tornar influenciadora e buscando sucesso nas redes sociais. Ao mesmo tempo, cenas icônicas da primeira versão, como o rasgar do vestido de noiva, foram preservadas, agradando ao público nostálgico que acompanha a novela com expectativa e carinho. O cuidado em equilibrar o novo e o antigo é uma das principais razões pelas quais o remake mantém relevância cultural mesmo décadas após o original.

O elenco, por sua vez, é outro ponto forte do remake. Taís Araújo, no papel de Raquel, vem sendo amplamente elogiada por sua interpretação segura e emotiva, conseguindo transmitir a força e a integridade da personagem original. Debora Bloch, na pele de Odete Roitman, provoca inevitáveis comparações com Beatriz Segall, mas também consegue imprimir uma nova dimensão à vilã, adicionando nuances e complexidade à personagem sem perder seu caráter ameaçador. O cuidado com a seleção do elenco demonstra que a produção buscou respeitar a memória afetiva do público, ao mesmo tempo em que cria espaço para interpretações contemporâneas.

Outro acerto importante é a correção de falhas técnicas e de consistência presentes na versão original. Problemas de lógica jurídica, como inconsistências relacionadas a heranças e doações de bens, foram corrigidos, tornando a narrativa mais crível para o público moderno, que tem maior acesso a informações e debates sobre legislação e cidadania. Além disso, a produção se destacou pela estética e direção de arte, que imprimem sofisticação à novela. Cenários, figurinos e a abertura foram cuidadosamente planejados para homenagear o clássico sem recorrer à reprodução literal, equilibrando tradição e modernidade de forma visualmente atraente.

Apesar desses pontos positivos, o remake enfrenta desafios e críticas significativas. O desempenho de audiência, por exemplo, ficou abaixo das expectativas, com a estreia marcando uma das piores performances da faixa das nove da Globo em anos recentes. Em várias regiões do país, a novela perdeu para outras produções da própria emissora, indicando que a combinação de nostalgia e atualização não foi suficiente para captar o público de forma consistente.

Além disso, a resistência do público nostálgico é notável. Algumas alterações na personalidade e no comportamento de personagens clássicos geraram debate. Odete Roitman, por exemplo, recebeu uma abordagem mais humanizada, o que desagradou parte do público que esperava a vilã implacável da versão de 1988. Mudanças em relacionamentos centrais da trama e a suavização de certos conflitos também foram criticadas por aqueles que desejam ver a narrativa original respeitada em sua totalidade.

Falhas técnicas e de continuidade também chamaram atenção. O público percebeu detalhes como objetos trocados de mãos, flores que mudam de cena e pequenos deslizes de cenário, prejudicando a imersão da narrativa. Embora possam parecer detalhes menores, para o público acostumado à atenção rigorosa da teledramaturgia contemporânea, esses erros se tornam elementos que diminuem a experiência de assistir ao remake.

Outro ponto de pressão é o contexto em que a autora Manuela Dias se encontra. Produzir o remake de um clássico implica lidar com expectativas elevadas, críticas intensas e, muitas vezes, injustas, incluindo ataques de teor misógino. A autora tem se manifestado sobre o desafio de equilibrar fidelidade à obra original com a necessidade de atualizar e humanizar personagens para o público moderno, evidenciando a complexidade de revisitar uma obra tão consagrada.

O remake também provoca reflexões sobre a própria sociedade brasileira atual. A escolha de atualizar temas como ambição, corrupção e “jeitinho brasileiro” mostra que os dilemas centrais de ‘Vale Tudo’ permanecem relevantes, embora ganhem novos formatos. A versão 2025 reflete questões contemporâneas de maneira que o público jovem consegue se identificar, ao mesmo tempo em que mantém referências que agradam aos espectadores que acompanharam a novela original.

Em resumo, o remake de ‘Vale Tudo’ de 2025 é um experimento ambicioso e complexo, que busca equilibrar tradição e inovação. Seus acertos — como elenco competente, atualização de personagens e cuidado estético — mostram que é possível revisitar um clássico sem perder sua essência. Por outro lado, erros de audiência, resistência do público nostálgico e falhas de continuidade lembram que a tarefa de atualizar um ícone da televisão brasileira é delicada e repleta de riscos. Se o remake conseguir ajustar seu ritmo, aprofundar personagens e manter a coesão narrativa, tem potencial para se firmar como uma obra respeitável à parte, capaz de dialogar tanto com fãs antigos quanto com novas gerações, consolidando-se não apenas como homenagem ao original, mas como referência da teledramaturgia contemporânea.