Após uma semana de divergências e embates duríssimos entre os dois principais postulantes à vaga de candidato do partido à presidência da República, o PSDB esperava concluir, neste domingo, 28, as tumultuadas prévias para escolha do nome que vai compor com outros presidenciáveis do centro uma aliança que seja capaz de romper a polarização entre o presidente Bolsonaro e o ex-presidente Lula. Mas falhas técnicas no processo de votação, que se mantinham até a noite de quinta-feira, 25, poderão atrasar ainda mais a escolha do presidenciável tucano. Apesar das dificuldades tecnológicas, há um nítido favoritismo do governador de São Paulo, João Doria, contra o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite. Qualquer um dos dois que venha a ser o escolhido pelos 44.700 tucanos inscritos para a votação, no entanto, terá a árdua tarefa de reunificar o partido, que ficou dividido com as inéditas primárias tucanas. Antes de iniciar a campanha propriamente dita, o PSDB terá que curar as feridas abertas pela acirrada disputa interna, conciliar vencidos e vencedores e, sobretudo, expurgar os que desejam alinhar o partido ao Centrão.

Os aliados de Doria, que contam com a vitória nas prévias, acreditam que a principal missão do governador paulista será a de recompor a unidade partidária no pós-prévias. “A responsabilidade de Doria nessa pacificação do PSDB será muito grande, pois o partido chegou muito tensionado ao final do processo das prévias, com acusações de lado a lado. Entendo que o principal problema é que setores do partido não desejavam que tivéssemos candidato a presidente e trabalharam contra o esforço do governador de São Paulo nesse sentido. Mas acredito que as feridas da disputa serão cicatrizadas e, em breve, o partido terá uma candidatura fortalecida pela vontade da maioria dos filiados consultados nas primárias”, disse Marco Vinholi, presidente do diretório do PSDB do Estado de São Paulo.

NARRATIVAS Para o prefeito de São Bernardo, Orlando Morando, Leite se mostrou incoerente durante as prévias (Crédito:Eduardo Anizelli)

O coordenador da campanha de Doria, o tucano Wilson Pedroso, mostrou que o maior obstáculo para a realização de um processo de prévias menos radicalizado foi a atitude do governador gaúcho Eduardo Leite na reta final da campanha. “Ele combinava uma coisa e fazia outra. Parecia que queria a conclusão da votação, mas trabalhava para não se ter um consenso entre todos os candidatos. Dava a entender que sabia que seria derrotado por Doria no voto da militância e trabalhava contra o final da votação”, explicou. Na mesma linha foi o prefeito de São Bernardo do Campo, Orlando Morando (PSDB), que coordenou a campanha de Doria no Centro-Oeste. “Leite se mostrou extremamente incoerente nas prévias. A cada hora ele criava uma narrativa para não ver os resultados ou não queria que primárias fossem concluídas.” De fato, enquanto o Doria desejava que as eleições terminassem logo neste domingo, Leite chegou a propor que o processo fosse retomado em fevereiro.
As divergências transformaram, assim, a reta final das prévias em um verdadeiro clima de guerra. Desde o início, os adeptos da candidatura de Doria defendiam que os votos fossem captados em urnas eletrônicas cedidas pelo TSE e que seriam instaladas em todos os estados, possibilitando uma eleição segura e transparente. Mas os integrantes da campanha de Leite sugeriram que a votação fosse feita por meio de aplicativos nos celulares dos filiados. O sistema eletrônico foi desenvolvido pela Fundação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Fuargs), de Pelotas, cidade que já foi administrada pelo governador gaúcho. Mesmo suspeitando que o aplicativo poderia apresentar problemas técnicos, Doria concordou que a votação fosse feita como propunha Leite. E o que era possibilidade plausível acabou se tornando realidade. Marcado para ser realizado no domingo, 21, o processo das prévias se transformou em um festival de erros e de acusações mútuas entre apoiadores das duas chapas. O fato é que as prévias que deveriam ter sido realizadas há 15 dias acabaram não sendo concluídas. O sistema de aplicativos da Fuargs travou e apenas 10% dos eleitores inscritos conseguiram votar. Após a campanha de Doria denunciar que seus eleitores não conseguiam concluir os votos por causa do defeito no aplicativo, o presidente da legenda, Bruno Araújo, decidiu suspender o pleito até que fosse encontrada uma solução técnica para a retomada da votação.

Como a Fuargs não conseguia resolver os problemas, embora tivesse recebido R$ 1,3 milhão pelo serviço, a direção do PSDB anunciou, na terça-feira, 23, que havia contratado a empresa de tecnologia digital RelataSoft para concluir a votação até este domingo, 28. Quando tudo parecia estar resolvido, no entanto, na manhã de quarta-feira, 24, o PSDB nacional voltou a divulgar uma nota oficial informando que “os testes realizados durante toda a noite e madrugada não foram totalmente satisfatórios”. O partido passou a fazer contatos com outras empresas para programar novos testes em processos eletrônicos que pudessem concluir a votação neste domingo. O fato é que toda essa confusão acabou penalizando os filiados e expondo a legenda a um grande desgaste. Afinal, o partido acabou conseguindo perder para ele mesmo, ao não ter sido capaz de realizar uma eleição interna sem tantos atritos e falhas técnicas. Se os tucanos tivessem optado pelas urnas eletrônicas do TSE certamente essa confusão não teria tomado as proporções que tomou.

Terceira via

Doria, contudo, se prepara para entrar em campo já a partir desta semana, caso sua vitória nas prévias seja confirmada, para dar início ao jogo da sucessão presidencial em nome do PSDB. Ele espera poder sentar com os demais candidatos do centro para negociar uma chapa de consenso que enfrente os dois polos do radicalismo, representados por Lula e Bolsonaro. “Quem for o escolhido vai ter legitimidade para promover debate com outros partidos para que tenhamos um nome para representar a terceira via”, disse o paulista. Para ele, o partido tem que viabilizar com os demais candidatos do centro a formulação de propostas que solucionem os problemas do País. “O Brasil precisa de rumo, acabando com a irresponsabilidade fiscal, porque ela gera inflação, tira previsibilidade e reduz a confiança. E sem previsibilidade e confiança, o investimento não chega e o emprego não volta. O PSDB sabe resolver os problemas e tirar o Brasil das crises. Fez isso com o Plano Real e com as medidas sociais do governo Fernando Henrique. E está fazendo isso em São Paulo, com projetos inovadores, responsabilidade fiscal, confiança, investimentos e empregos”, explicou Doria à ISTOÉ. Agora, o partido deve resolver seus problemas domésticos para colocar seu peso eleitoral na mesa do jogo político.