Elas se beneficiaram da roubalheira dos maridos, comprando joias milionárias, roupas de grife, viagens estonteantes ao exterior, freqüentando hotéis de luxo, tudo com o dinheiro desviado da Petrobras. Mas a Justiça entendeu que elas não participaram diretamente dos atos de corrupção dos maridos e, por falta de provas do seu envolvimento, foram absolvidas e permanecem livres, leves e soltas. Para elas, o crime compensou. As mulheres do ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral e do ex-deputado Eduardo Cunha, ambos do PMDB, se safaram das punições por lavagem de dinheiro, evasão de divisas e corrupção impostas aos maridos, que estão na cadeia. O alívio da advogada Adriana Ancelmo, esposa de Cabral, e da jornalista Cláudia Cruz, esposa de Cunha, deve durar pouco, contudo. Adriana está em prisão domiciliar no seu monumental apartamento no Leblon, no Rio, enquanto que Cláudia desfila tranquilamente pelas praias cariocas, curtindo a vida numa boa, mas o Ministério Público promete recorrer nos dois casos de suas absolvições por entender que elas participaram intencionalmente dos crimes cometidos pelos maridos bandidos.

De acordo com a Procuradoria da República, as duas granfinas atuaram em parceria com seus maridos em crimes contra a Petrobras em 2008 e 2011. No caso de Adriana, o então governador Sérgio Cabral capitaneou um rateio de propina derivada de contratos da Andrade Gutierrez na terraplanagem do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), uma obra de R$ 819 milhões, mas que recebeu cinco aditivos que inflaram as despesas para R$ 1,17 bilhão. O governador e seu grupo obtiveram R$ 2,7 milhões em subornos.

A CARA DA RIQUEZA Cláudia Cruz gastou mais de R$ 3 milhões só em cartão de crédito (Crédito:Divulgação)

Segundo uma testemunha no processo, Adriana recebia altos valores em dinheiro vivo em seu escritório. A denúncia afirma que, apenas entre dezembro de 2009 a março de 2016, ela fez 13 compras usando dinheiro em espécie – variando de R$ 5 mil a R$ 68 mil em cada transação. As mercadorias somaram R$ 588 mil. Só em joias ela comprou mais de R$ 6 milhões na H.Stern, em dinheiro vivo. O objetivo foi, segundo o Ministério Público, “evitar rastreamento, comunicação e identificação de transações financeiras”.

Já em relação à Cláudia Cruz, a força-tarefa da Lava Jato no Paraná acusou-a de, intencionalmente, se distanciar do dinheiro sujo obtido pelo marido, ocultando e dissimulando a “natureza, origem, localização, disposição, movimentação e propriedade ilícita” de US$ 165 mil, valores “provenientes de crime contra o sistema financeiro nacional consistente na manutenção de valores não declarados no exterior, crimes praticados pela organização criminosa que se instalou na Petrobras”. Ela usou o dinheiro do marido para fazer compras na Quinta Avenida em Nova York e gastar fortunas em restaurantes freqüentados por milionários em Dubai. Os valores gastos por ela foram obtidos depois que Eduardo Cunha recebeu US$ 1,5 milhão em propina distribuída por um operador do PMDB a partir do repasse de um negócio de exploração petrolífera na África com a Petrobrás por US$ 66 milhões.

Cônjuges inocentes?

No entanto, a Justiça não viu crime nas ações das duas. O juiz da Lava Jato, Sergio Moro, disse que o depoimento de uma testemunha, Michele Pinto, não poderia indicar consciência de Adriana Ancelmo em relação ao dinheiro sujo recebido pelo marido. “Embora ela revele a entrega de elevadas quantias em espécie no escritório de advocacia de Adriana Ancelmo, da afirmação não é possível concluir a participação dela na estruturação das transações financeiras ora reconhecidas como crimes de lavagem”, avaliou o juiz. “Por mais que seja reprovável o gasto, em bens, do produto do crime de corrupção, isso não torna o cônjuge de agente público corrompido (Adriana) como partícipe do crime de corrupção”.

Raciocínio semelhante foi usado em relação à Cláudia Cruz. “Cumpre observar que, de fato, não há prova de que ela (Cláudia) tenha participado dos acertos de corrupção de Eduardo Cunha”, afirmou Moro em sua sentença. O juiz destacou que a conta específica indicada pelo MPF não recebeu dinheiro sujo do esquema do poço petrolífero na África.

No entanto, o destino das duas ainda vai ser decidido por desembargadores do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em Porto Alegre. Afinal, o Ministério Público anunciou que já pediu reanálise do caso de Cláudia e vai recorrer da absolvição de Adriana. A força-tarefa da Lava Jato diz que o recurso será apresentado “por entender que as provas produzidas demonstram que Adriana e Mônica Macedo, outra ré que foi absolvida, participaram dos crimes cometidos de forma consciente”. Eles ainda vão pedir também aumento das penas impostas a Sérgio Cabral, condenado a 14 anos e dois meses de prisão.

Gastros extravagantes
Cláudia Cruz e Adriana Ancelmo gastam o dinheiro que os maridos roubaram em roupas e joias caríssimas

Claudia Cruz
R$ 37 mil em um dia de compras durante uma viagem a Paris
R$ 17 mil em roupas da grife Prada
R$ 13 mil em bolsas da marca Louis Vuitton
US$ 1 milhão(R$ 3,2 milhões)
Pagou contas de seu cartão de crédito no exterior com dinheiro de propina

Adriana Ancelmo
R$ 57 mil em seis vestidos de festa feitos sob medida
R$ 1.000 em um assento de privada de luxo com aquecimento
R$ 800 mil em um anel de ouro, presente do marido, Sergio Cabral, mas pago pelo empreiteiro Fernando Cavendish
R$ 6 milhões em joias na H.Stern