Esqueça a franquia James Bond. O filme mais visto do momento é um longa-metragem chinês, com quase três horas de duração. O épico de guerra “A Batalha do Lago Changjin” arrecadou mais de 4,8 bilhões de yuans (cerca de R$ 3 bilhões) e quebrou diversos recordes chineses e até alguns que antes pertenciam exclusivamente à Hollywood em apenas duas semanas desde sua estreia.
Mas o que há nesse blockbuster de tão atraente? Bem, propaganda estatal. A narrativa aborda com bastante carga emocional o sacrifício dos soldados chineses que participaram da Guerra da Coreia (1950-1953). “A Batalha do Lago Changjin” é baseada em uma história real e, além de atrair os chineses aos milhões ao cinema durante a pandemia, tem causado uma espécie de histeria coletiva na população.
O público, profundamente tocado com as imagens dos “Voluntários do Povo Chinês” (CPVs), começou a copiar as cenas “emocionantes” dos talvez nem tão voluntários assim, retratados na película. Afinal, a ditadura chinesa, na época comandada por Mao Tsé-Tung, não deve ter perguntado gentilmente aos seus habitantes quem gostaria de ir ou não ao front.
Um vídeo que circula na plataforma “Douyin”, a versão chinesa do “TikTok”, mostra estudantes do ensino fundamental , na província de Henan, “brincando” de vivenciar as adversidades do conflito: comem farinha frita e batatas congeladas no “campo de batalha”. Com a voz embargada pelas lágrimas, um dos alunos comenta como eles (os jovens) precisam valorizar suas vidas, duramente conquistadas, sem reclamar do que acontece no presente. Os vídeos de pessoas comendo batatas congeladas se tornaram virais sendo copiadas à exaustão. Em um vídeo, uma mulher mais velha começa a chorar ao tentar mordiscar um pedaço de batata.
O “Efeito Lago Changjin” parece ter atingido toda a sociedade, desde o forte sentimento patriótico das pessoas em todo o país até às ações do público em apresentar condolências aos CPVs. Será que em breve, nos cinemas do mundo, no lugar de vermos filmes de guerra onde os Estados Unidos sempre vencem, veremos filmes chineses ou coreanos no lugar? “Round 6”, produção sul-coreana, é a série mais assistida da história da Netflix, para dar um exemplo. E com a retirada desastrosa das tropas americanas no Afeganistão, o timing para tamanho sucesso não poderia ser melhor. Se a maioria da população chinesa – estimada em quase um bilhão e meio de habitantes – decidir ver as aventuras do Lago Changjin, é capaz até de o filme bater os gigantescos números dos heróis da Marvel.