Fazer aliados é um dos pré-requisitos para quem opta pela política. Bolsonaro, no entanto, tem mostrado pouca habilidade nessa área. Os motivos são os mais variados e colocam a palavra do capitão sob suspeita. O presidente do PTB, Roberto Jefferson, foi o último jogado na sarjeta. Na verdade, ele está abandonado na cadeia e “o presidente da República nada faz para ajudá-lo”, como disse sua filha, a ex-deputada Cristhiane Brasil. Ao que consta, os únicos políticos que o mandatário vai defender são os próprios filhos. A lista de abandonados é extensa. Além de Jefferson, há a ativista Sara Winter, o ex-governador Wilson Witzel, o ex-ministro Ernesto Araújo, o deputado Daniel Silveira e o caminhoneiro Zé Trovão, entre outros.

Da Penitenciária de Bangu, Jefferson disse que Bolsonaro e o seu filho, senador Flávio, se viciaram em dinheiro público. Lamentou que o presidente “não recolhe seus feridos” e sequer mandou uma mensagem desejando solidariedade. Ele tinha a esperança de que o mandatário e sua família migrassem para o PTB, mas na cadeia — e sem o apoio que considera devido — o petebista está muito perto de tornar-se inimigo do ex-capitão e delatá-lo.

“Tive que escolher entre a minha dignidade e o apoio irrestrito ao presidente: segui com a minha dignidade” Dayane Pimentel, deputada (Crédito:Divulgação)

No início do mandato, o ex-ministro Gustavo Bebianno, já falecido, dava pistas de como o Planalto iria tratar aqueles que fossem considerados descartáveis. Ele foi o homem forte do capitão durante toda a campanha eleitoral. Dirigentes do PSL afirmam que Bebianno cuidava pessoalmente dos interesses de Bolsonaro junto à sigla. A recompensa veio com a sua nomeação para o cargo de ministro da Secretaria-Geral da Presidência. No entanto, em menos de dois meses foi demitido. Os motivos principais foram as candidaturas laranjas do PSL e os confrontos com o filho 02, o vereador Carlos. Na época, por conta da sua demissão, Bebianno alegou “absoluta falta de gratidão” do presidente.

Problemas com a Justiça são costumeiros entre os amigos do presidente. Sara Winter pensou que poderia agir com a conivência do Planalto, mas foi desautorizada pela Justiça. Ela fez parte de uma estratégia que ameaçava o Supremo Tribunal Federal (STF). Chegou a dizer que iria até a casa do ministro Alexandre de Moraes para “trocar soco”. Acabou presa. O deputado Daniel Silveira (PTB-RJ) achava que o cargo de parlamentar iria garantir a sua imunidade para atacar ministros do STF, mas foi preso por se exceder. Ele defendeu um novo AI-5. Líder dos caminhoneiros, Zé Trovão está preso depois de ficar foragido no México. Ele também atacou o STF e contava com o amparo do presidente. Zé Trovão apelou por apoio do capitão “pelo amor de Deus” e conseguiu conter a greve dos caminhoneiros no Sete de Setembro. Desamparado pelo governo, o caminhoneiro está preso. Sara, Silveira e Trovão são investigados por crimes contra a democracia e o presidente os abandonou à própria sorte.

Na campanha eleitoral, o candidato a governador que apresentava maior alinhamento ideológico com Bolsonaro era o ex-juiz Wilson Witzel (RJ). Vitoriosos, eles se distanciaram e quando Witzel precisou de apoio para não ser afastado do cargo, o Planalto não ajudou. Ao contrário, atuou como se fossem inimigos. Witzel perdeu o mandato. O ex-advogado-geral da União André Mendonça estava feliz da vida com a indicação à vaga no STF em julho. O Senado ainda não marcou a sabatina e Mendonça pede esforços do Planalto, mas ele se considera esquecido pelo presidente. O ex-ministro das Relações Exteriores Ernesto Araújo deixou o governo, em março, e contava com a amizade do presidente para obter uma embaixada. Ernesto reclama que Bolsonaro nunca fez um telefonema sequer depois da demissão.

O PSL, partido que abrigou a campanha do capitão, tem outras histórias para contar. Ingrato, Bolsonaro deixou a legenda por não ter conseguido o comando irrestrito sobre ela. Esse é um dos motivos pelos quais ainda não tem um partido para concorrer em 2022. Os atritos mais evidentes surgiram com o deputado Alexandre Frota e a deputada Joice Hasselmann: ambos migraram para o PSDB. A deputada Dayane Pimentel (PSL-BA) afirma que, “diferentemente das figuras antidemocráticas”, foi ela que abandonou o presidente. “Eu tive que escolher entre a minha dignidade e o apoio irrestrito a ele: segui com a minha dignidade.” Quanto aos abandonados, Dayane afirma que Bolsonaro precisou sacrificar aliados para defender o governo e seus filhos. Curiosamente, o ex-policial Fabrício Queiroz e o blogueiro Allan dos Santos não foram abandonados pelo presidente. Queiroz esteve preso até recentemente e Santos tem mandado de prisão expedido pelo STF. Se abandonados, poderiam esclarecer muito sobre as práticas do clã, caso optassem por delações. Por ora, estão protegidos e devidamente calados.