O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), tem dito a aliados que não pretende ser candidato a presidente em 2026.
O recuo, revelado pelo jornal Folha de S. Paulo, sucede uma aparente consolidação de seu nome como favorito a representar o espólio de Jair Bolsonaro (PL) nas urnas e conflui com uma melhoria na avaliação popular do presidente Lula (PT), que deve concorrer à reeleição.
Neste texto, a IstoÉ detalha o peso de cada fator para esse movimento.
Bolsonarismo insuficiente
Em meados de agosto, Tarcísio foi celebrado em Brasília, no evento que formalizou a federação entre PP e União Brasil, como principal nome do grupo para enfrentar Lula nas urnas. Políticos passaram a aventar vices para a chapa, como Ciro Gomes (de saída do PDT) e outro Ciro, o Nogueira, senador pelo Piauí e ex-ministro de Bolsonaro.
A narrativa era de que, ali, o ex-ministro garantiu o apoio do chamado “centrão”, restando se cacifar no bolsonarismo para pavimentar a candidatura ao Palácio do Planalto.
Nos dias seguintes, o governador voltou à capital federal para articular um projeto de anistia que livrasse Jair Bolsonaro (PL) da cadeia após a condenação por golpe de Estado, mantendo sua inelegibilidade, e atacou pela primeira vez o ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), em gestos que garantiriam o apoio do ex-presidente.

Bolsonaro em prisão domiciliar: ex-presidente não definiu candidato a representá-lo nas urnas
Não bastou. Integrantes do núcleo mais radical do bolsonarismo, que já questionaram Tarcísio por seu trabalho em governos do PT (ele dirigiu o Dnit entre 2014 e 2015, sob a gestão de Dilma Rousseff) e baixa adesão à ofensiva contra o Judiciário, dobraram o incômodo com a articulação para alçá-lo a presidenciável.
“Para liderar a direita em 2026, o candidato terá de apresentar um verniz de moderação capaz de atrair a centro e, ao mesmo tempo, um componente radicalizado, para atrair o apoio de Bolsonaro“, disse à IstoÉ Monalisa Torres, professora de teoria política da UECE (Universidade Estadual do Ceará).
A resistência é pública. Após o site Metrópoles revelar que o ex-presidente teria avalizado o nome para substituí-lo em 2026, seus filhos correram para dizer o contrário. O vereador Carlos Bolsonaro (PL-RJ), o deputado licenciado Eduardo e Bolsonaro (PL-SP) e o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) negaram a informação em suas redes sociais.
– Eu estava com ele hoje não ouvi nada disso! Enfim…. pic.twitter.com/X8CU5ti5sN
— Carlos Bolsonaro (@CarlosBolsonaro) September 24, 2025
“O piso eleitoral do bolsonarismo ainda é alto, mesmo em um momento sensível, e uma candidatura de direita desvinculada desse grupo enfrenta grandes dificuldades para deslanchar. Existe a necessidade de fazer acenos ou, minimamente, não se indispor com a direita radical“, disse à IstoÉ Yuri Sanches, diretor de análise política da AtlasIntel. “As chances de um caminho alternativo ser construído até 2026 são baixas”, concluiu.
Em paralelo, a anistia articulada pelo governador não foi adiante. Com resistências a anular integralmente decisões do STF, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), escolheu o deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP) para relatar o projeto.
O relator, por sua vez, se reuniu com Aecio Neves (PSDB-MG) e o ex-presidente Michel Temer (MDB) para elaborar um texto de consenso, que até mudou de nome: agora é tratado como “PL da Dosimetria” e está mais distante de um perdão integral a Bolsonaro.
Já o “centrão”, mesmo que ungiu Tarcísio antes do bolsonarismo, sofreu uma derrota com a PEC da Blindagem. Aprovada na Câmara, a proposta que estabelecia necessidade de aprovação parlamentar para a abertura de qualquer processo penal contra deputados, senadores e presidentes de partidos foi alvo de protestos contrários nas capitais e enterrada pelo Senado.
A reação incumbente
O virtual oponente de Tarcísio estava em Nova Iorque para a Assembleia Geral da ONU (Organização das Nações Unidas). Depois de um discurso em que celebrou a condenação de Bolsonaro e defendeu a soberania nacional, Lula viu Donald Trump subir ao palanque para dizer que teve “excelente química” com o brasileiro e sugerir que os dois se encontrem em breve.
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Na pauta da reunião, devem estar as tarifas de 50% impostas pelo presidente dos Estados Unidos sobre produtos brasileiros em recado declarado contra a “caça às bruxas” que, segundo ele, o Judiciário promove contra Bolsonaro. O tarifaço, vale lembrar, foi inicialmente celebrado por Tarcísio, que comemorou a eleição de Trump e não tem o hábito de confrontar qualquer movimento que tem a bênção do ex-chefe — como é o caso.
Mas as taxas foram rapidamente rejeitadas pelo potencial danoso à economia brasileira e Lula, opondo-se a elas, antecipou o discurso eleitoral. “As tentativas anteriores de polarizar com a oposição não ganharam adesão além do campo da esquerda, mas a defesa da soberania furou esse bloqueio. O presidente ganhou para si uma narrativa tangível e soube, pela comunicação, capturá-la como bandeira política“, disse à IstoÉ Monalisa Torres, professora de teoria política da UECE (Universidade Estadual do Ceará).

Lula: recuperação da popularidade é sensível, mas virou obstáculo para a oposição
Antes um entrave para o projeto de reeleição do petista, a popularidade do governo melhorou. Uma pesquisa Ipespe divulgada na quinta-feira, 25, mostrou que 50% aprovam o governo federal. Em julho, eram 43%. “Quando Tarcísio conseguiu se equilibrar entre os apoios do bolsonarismo e da elite econômica e partidária, Lula enfrentava um momento de grande desgaste, mas isso mudou“, acrescentou a professora.
Para Yuri Sanches, o cenário de recuperação vem de “acertos recentes do governo, mas também de erros estratégicos do campo oposicionista. Na avaliação comparativa com a atuação do bolsonarismo ou do ‘centrão’, a gestão Lula tem se saído melhor”.
O caminho seguro
Além do obstáculo incumbente, Tarcísio também enfrenta problemas no que poderia usar como plataforma de campanha: seu próprio trabalho. Enquanto negociava a anistia, o governador viu um ex-delegado-geral da Polícia Civil “jurado de morte” pelo PCC (Primeiro Comando da Capital) ser executado a tiros na Praia Grande, expondo as dificuldades da gestão para enfrentar o crime organizado.
Mesmo com o desgaste, o governador tem boas perspectivas caso cumpra a antiga promessa de concorrer à reeleição. Em pesquisa AtlasIntel divulgada no início de setembro, ficou à frente dos ministros da Fazenda, Fernando Haddad (PT), do Empreendedorismo, Márcio França (PSB), e do vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB), que governou quatro vezes o estado.
Aliados consideram que, no cenário atual, Tarcísio teria um “caminho seguro” para garantir mais quatro anos no Palácio dos Bandeirantes e adiar a candidatura presidencial para 2030. “A política é dinâmica, e o tabuleiro mostrou que essa é uma pretensão muito menos arriscada”, disse Monalisa Torres.

Ratinho Júnior: alternativa à desistência de Tarcísio na direita
Em um momento de maior otimismo para a oposição, essa foi a sugestão dada por Gilberto Kassab, presidente do PSD, secretário de governo de Tarcísio e articulador onipresente da política brasileira. Em declaração mais recente, o dirigente disse que, caso o governador não concorra em 2026, o partido “tem seu rumo”, referindo-se às pré-candidaturas do governador do Paraná, Ratinho Júnior, e do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite.
Conforme revelou o jornal O Globo, o parananense é a opção favorita, inclusive, do próprio Tarcísio. “Ratinho é menos identificado com o bolsonarismo e tem a seu favor a boa avaliação à frente do Paraná, cuja popularidade é registrada também em estados como São Paulo, Santa Catarina e Mato Grosso do Sul. O principal obstáculo é o nível de conhecimento, inferior ao do próprio governador paulista”, afirmou Renato Dorgan, presidente do instituto de pesquisas Travessia, à IstoÉ.
Publicamente, Tarcísio nega ser candidato à Presidência e diz querer concorrer à reeleição.